Espacios. Vol. 25 (3) 2004

C&T no nível local: uma proposta de esquerda

C&T a nivel local: Una propuesta de izquierda
S&T at local level: a left proposal

Renato Dagnino


9. Algumas propostas para os novos governos de esquerda

Os novos governos de esquerda a serem eleitos em outubro de 2004 deverão estar focados na exploração do potencial científico-tecnológico da cidades e do País para adicionar conteúdo tecnológico às atividades fim da Prefeitura e aos bens e serviços que adquire visando a estimular a capacitação tecnológica das micro, pequenas e médias empresas, das cooperativas, dos seus cidadãos enfim, de maneira a melhorar a qualidade do serviço que presta.

A mudança para melhor, do cenário existente no início do atual governo municipal, aumenta a viabilidade das ações em curso e permite a implementação de outras de maior vulto. Em função mesmo dos resultados obtidos até agora, fruto do esforço de funcionários da PMC, técnicos de empresas estatais e privadas, professores e alunos universitários, sindicalistas etc, alinhados com o pensamento político de esquerda.

Nesse sentido, há que ressaltar, além da maior governabilidade que o governo Lula enseja na área de C&T, dois movimentos em curso no âmbito da esquerda. O primeiro é o amadurecimento de programas estaduais e municipais de inclusão social e infra-estrutura e de iniciativas visando à agregação de valor a matérias-primas nacionais, que demonstram a urgente necessidade do desenvolvimento de soluções tecnológicas alternativas. O segundo, de maior prazo de maturação, mas fundamental, é a emergência de uma proposta para a área de C&T mais aderente às orientações estratégicas que a esquerda defende no campo econômico, social e ambiental.

Os novos governos da esquerda deverão ter como um de seus focos importantes a exploração do potencial científico-tecnológico das cidades para adicionar conteúdo tecnológico às atividades-fim da Prefeitura e aos bens e serviços que adquire. Neste último caso, utilizando seu poder de compra como estímulo à capacitação tecnológica das pequenas e médias empresas, das cooperativas e de seus cidadãos, de maneira a melhorar a qualidade do serviço que presta à população.

A priorização da dimensão C&T no governo da cidade irá beneficiar todos os seus demais setores devido ao seu intrínseco caráter de transversalidade. A materialização do potencial de C&T da cidade requer a participação democrática de todas as instâncias de governo e dos demais atores políticos e movimentos sociais. Mas, para que isso ocorra é necessário criar, de imediato, o espaço institucional adequado para a implementação das diretrizes que esse processo de participação irá definir.

O futuro governo de esquerda deverá ter então, como principais compromissos:

10. Uma palavra final para os pesquisadores de esquerda

A comunidade de pesquisa de esquerda é um ator central na mudança radical que este trabalho propõe para a PCT como forma de torná-la coerente com a proposta de transformação sócio-econômica e cultural que a população deseja.

Um processo de politização do tema e de desconstrução do pensamento hegemônico que acompanhe o movimento protagonizado pela esquerda contemporânea e que se oponha à ofensiva reacionária da direita para seguir implementando seu projeto político na área de C&T depende da mobilização da comunidade de pesquisa de esquerda.

A difusão dos mitos iluminista da neutralidade da ciência, e positivista do determinismo tecnológico, pela direita, coloca a comunidade científica brasileira numa difícil situação. Incapaz de perceber que a emulação da dinâmica de produção de conhecimento estabelecida no centro e a importação de um conceito de qualidade espúrio a afastam da legitimidade social ela se torna cada menos sensível aos sinais de relevância emitidos pela sociedade. E termina por não perceber que a visão “desinteressada” que tem da ciência interessa e muito à elite econômica e dificulta a construção de uma sociedade mais eqüitativa.

Edgar Morin conhecido estudioso da ciência e daqueles que a conduzem, afirma que a ciência está longe de ser apenas uma atividade de investigação da verdade e da realidade. Entretanto, os cientistas não percebem isso e caem num “idealismo vicioso”: “eles se apresentam como pesquisadores puros, iguais aos anjos e aos santos que contemplam o Senhor nas reproduções da Idade Média”. Essa “auto-idealização” dos acerca da ciência que produzem, os distancia da possibilidade de enxergar os efeitos de manipulação de práticas, de poder etc., exercidos pelos interesses de grupos que realmente controlam a ciência.

Neste sentido, diz ele, urge que haja por parte da comunidade de pesquisa um “autoconhecimento do conhecimento”, e que o “conhecimento do conhecimento científico” fecunde a ciência para torná-la realmente um instrumento de progresso social.

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