Espacios. Vol. 28 (2) 2007. Pág. 30

Balanço do comércio externo brasileiro de produtos para saúde: 1997-2004

Balance of the Brazilian external commerce of medical products: 1997-2004

Balance del comercio externo brasileño de productos para la salud: 1997-2004

José Henrique Souza* y André Tosi Furtado**


Contenido


RESUMEN:
O presente artigo pretende indagar sobre o posicionamento do Brasil no comércio internacional de produtos médico-hospitalares. Para isso, foram analisados dados sobre o comércio exterior de instrumentos médicos, produtos farmacêuticos, medicamentos e equipamentos médicos de diagnóstico de mais de 170 países. O artigo procurou analisar a evolução do comércio externo brasileiro e as grandes tendências do mercado internacional de produtos médicos entre 1997 e 2004. Para posicionar o Brasil no contexto internacional optou-se por analisar os dados dos principais países exportadores e dos países que negociam volumes próximos aos transacionados pelo Brasil. Constatou-se um avanço importante do Brasil nos últimos anos, embora insuficiente, e uma acentuada concentração no comércio internacional de produtos médicos.

ABSTRACT:
The present article intends to inquire on the thread of Brazil in the international trade of health care products. For this, they had been analyzed given on the foreign commerce of medical instruments, pharmaceutical products, medicines and medical equipment of diagnosis of more than 170 countries. The article looked for to analyze the evolution of the Brazilian external commerce and the great trends of the international market of medical products between 1997 and 2004. To locate Brazil in the international context it was opted to analyzing the data of the main exporting countries and the countries that negotiate next volumes to the done business ones for Brazil. One evidenced an important of Brazil in the last years, even so insufficient advance, and one accented concentration in the international trade of medical products.

Introdução e Objetivo

Nos últimos cinco anos o comércio internacional cresceu com uma rapidez nunca antes presenciada. O Brasil, em particular, quebrou sucessivos recordes no volume exportado. Com a formação de blocos regionais, uniões aduaneiras e acordos bilaterais, muitas empresas ganharam mercado, escala e capacidade de competir no ambiente internacional. Assim, o comércio entre nações vem crescendo e se diversificando. Alguns países aproveitam a expansão no comércio mundial para ganhar posições e promover seus sistemas produtivos. Outros, como o Brasil, não demonstram grandes avanços em segmentos industriais sofisticados como produtos médico-hospitalares.

O objetivo desse trabalho é reunir e organizar dados para formar uma visão panorâmica do Brasil no mercado internacional de produtos médicos. O interesse por esse mercado, bens para a saúde, decorre de sua importância para o avanço econômico e social do país. O desenvolvimento de tecnologias de produção de bens que abastecem o sistema de saúde, além de gerar renda e emprego, aumenta a segurança na acessibilidade de produtos essenciais para o bem estar da população, sobretudo dos segmentos mais carentes.

A difusão rápida de doenças decorrentes de aglomerações urbanas, terrorismo, desequilíbrio ecológico e pobreza é uma ameaça real. O crescimento do movimento internacional de pessoas e mercadorias, sobretudo de alimentos, também é um fator de grande insegurança. Casos recentes como a "Sars" e a "gripe aviária" demonstram que essa possibilidade deixou de ser apenas um risco. Tal problema exige que os países, não somente, criem ou absorvam tecnologias em saúde, mas, também, formem uma capacitação interna na produção de bens médicos. Em outras palavras, a capacitação tecnológica no setor produtivo voltado para a saúde é essencial para a segurança e o bem estar social e para a sustentabilidade do desenvolvimento.

Delimitação do Tema, Referencial Teórico e Metodologia de Pesquisa

Para construir um panorama do comércio internacional de produtos destinados à saúde optou-se por trabalhar com os dados disponibilizados pelo “International Trade Centre” (ITC) da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento e da Organização Mundial do Comércio (UNCTAD/WTO). Os dados do ITC são apresentados segundo a “Standard International Trade Classification, Revision 3” (SITC Rev. 3) que agrega produtos segundo a hieraquia: seção, divisão, grupos, subgrupos e tópicos básicos. Os dados no sistema do ITC se encontram disponíveis apenas no nível de grupos.

Os produtos médicos podem ser encontrados no interior de três seções. São elas: seção 5: Produtos químicos e correlatos, seção 7: Máquinas e equipamentos de transportes e seção 8: Artigos manufaturados diversos (“Chemicals and related products”, “Machinery and transport equipment” e “Miscellaneous manufactured articles”, respectivamente).

Da seção 5 foi escolhida a divisão 54: Produtos médicos e farmacêuticos (“Medicinal and pharmaceutical products”) da qual foram analisados os grupos de produtos 541: produtos farmacêuticos exceto medicamentos (“Medicinal and pharmaceutical products, other than medicaments of group 542”) e 542: medicamentos inclusive veterinários (“Medicaments (including veterinary medicaments)”).

No grupo 541: produtos farmacêuticos exceto medicamentos, estão incluídos produtos como: provitaminas, vitaminas, alcalóides, estreptomicina, antibióticos não classificados no grupo 542, cafeína, glicose, efedrina, aminofilina, teofilina, hormônios, glândulas, sangue humano, gaze, ataduras, emplastos e adesivos impregnados ou revestidos com as substâncias, preparações opacificantes para exames radiográficos, bem como os reagentes de diagnóstico concebidos para serem administrados ao paciente.

O grupo 542: medicamentos inclusive veterinários é formado por medicamentos contendo antibióticos e derivados (penicilina, estreptomicia, etc.), hormônios, insulina e alcalóides, separados por dose ou não e embalados ou não para venda a varejo. Desse modo, o grupo 542 está mais ligado ao conceito de “medicamento” utilizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) “produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico. É uma forma farmacêutica terminada que contém o fármaco, geralmente em associação com adjuvantes farmacotécnicos” (Anvisa, 2006a).

Da seção 7 foi escolhida a divisão 77: Instrumentos, máquinas e equipamentos elétricos (“Electrical machinery, apparatus and appliances and electrical parts thereof (including non-electrical counterparts of electrical household-type equipment”) da qual foram coletados os dados do grupo 774: equipamentos médicos de diagnóstico e radiação (“Electrodiagnostic apparatus for medical, surgical, dental or veterinary purposes, and radiological apparatus”).

Compõem o grupo 774 os dispositivos elétricos de diagnósticos para uso médico, cirúrgico, odontológico, veterinário e radiológico. São os casos, por exemplo, de eletrocardiógrafos; aparelhos que utilizam ultravioleta, infravermelho, raios x, raio beta, raio gama, tubos de raio-x, partes e acessórios. Nesse caso podem ser assemelhados ao que a Anvisa define como “equipamentos de diagnóstico e de terapia” (Anvisa, 2006b).

Por fim, na divisão 87 – Aparelhos e instrumentos profissionais, científicos e de controle (“Professional, scientific and controlling instruments and apparatus”) da seção 8 – Artigos manufaturados diversos (“Miscellaneous manufactured articles”) encontra-se o grupo e 872 - instrumentos médicos (“Instruments and appliances, n.e.s., for medical, surgical, dental or veterinary purposes”). Esse grupo se refere a produtos como motores para brocas e outros dispositivos e instrumentos odontológicos, seringas, agulhas, cateteres, cânulas, instrumentos e dispositivos médicos, cirúrgicos ou veterinárias (exceto de eletro-diagnóstico e radiológico), dispositivo para oftalmologia, massagem, teste de aptidão psicológico; terapia do ozônio, terapia do oxigênio, terapia do aerossol, respiração artificial; outros dispositivos e máscaras de gás; mobiliário médico, odontológico, cirúrgico e veterinário como mesas para cirúrgica, exames, camas de hospital com encaixes mecânicos, cadeiras de dentistas; cadeiras de barbeiros e cadeiras similares capazes de girar, reclinar e ascender e suas partes e componentes (UN/UNSD, 1999).

Quadro 1
Brasil: conceitos e definições pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária

Definições de Produtos para Saúde

Droga

Substância ou matéria-prima que tenha finalidade medicamentosa ou sanitária

Medicamento

produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico

Fármaco

Substância química que é o princípio ativo do medicamento

Insumo Farmacêutico

droga ou matéria-prima aditiva ou complementar de qualquer natureza, destinada a emprego em medicamentos, quando for o caso, e seus recipientes

Correlato

Substância, produto, aparelho ou acessório não enquadrado nos conceitos anteriores, cujo uso ou aplicação esteja ligado à defesa e proteção da saúde individual ou coletiva, à higiene pessoal ou de ambientes, ou a fins diagnósticos e analíticos, os cosméticos e perfumes, e, ainda, os produtos dietéticos, óticos, de acústica médica, odontológicos e veterinários

Equipamento de diagnóstico

Equipamento, aparelho ou instrumento de uso médico, odontológico ou laboratorial, destinado a detecção de informações do organismo humano para auxílio a procedimento clínico.

Equipamento de terapia

Equipamento, aparelho ou instrumento de uso médico ou odontológico, destinados a tratamento patologias, incluindo a substituição ou modificação da anotomia ou processo fisiológico do organismo humano.

Equipamento de apoio médico-hospitalar

Equipamento, aparelho ou instrumento de uso médico, odontológico ou laboratorial, destinado a fornecer suporte a procedimentos diagnósticos, terapêuticos ou cirúrgicos

Materiais e artigos descartáveis

São os materiais e artigos de uso médico, odontológico ou laboratorial, utilizáveis somente uma vez de forma transitória ou de curto prazo

Materiais e artigos implantáveis"Materiais e artigos implantáveis

São os materiais e artigos de uso médico ou odontológico , destinados a serem introduzidos total ou parcialmente no organismo humano ou em orifício do corpo, ou destinados a substituir uma superfície epitelial ou superfície do olho, através de intervenção médica, permanecendo no corpo após o procedimento por longo prazo, e podendo serem removidos unicamente por intervenção cirúrgica.

Materiais e artigos de apoio médico-hospitalar

São os materiais e artigos de uso médico, odontológico ou laboratorial, destinados a fornecer suporte a procedimentos diagnósticos, terapêuticos ou cirúrgicos.

Produtos para diagnóstico de uso "in-vitro"

São reagentes, instrumentos e sistemas que, em conjunto com as instruções para seu uso, contribuem para efetuar uma determinação qualitativa, quantitativa ou semi-quantitativa em uma amostra biológica e que não estejam destinados a cumprir função anatômica, física ou terapêutica alguma; que não sejam ingeridos, injetados ou inoculados em seres humanos e que são utilizados exclusivamente para prover informações sobre amostras coletadas do organismo humano

Fonte: Anvisa, 2006 a e b

O Grupo 872 pode ser comparado ao que a Anvisa define como “equipamento de terapia, equipamento de apoio médico-hospitalar, materiais e artigos descartáveis, materiais e artigos implantáveis, materiais e artigos de apoio médico-hospitalar” (Anvisa, 2006b).

O presente artigo não pretende calcular o comércio total de produtos médicos entre nações. Essa tarefa seria quase impossível já que os dados dos quatro grupos citados acima não apontam o volume exato de bens para a saúde comercializado entre nações. Todo ano novos países são incluídos nas listagens de países importadores e exportadores o que eleva artificialmente a taxa de crescimento do comércio total de produtos médicos. Porém, a maioria dos países que foram incluídos nas listagens do “International Trade Centre” em 2003 e 2004 respondem por menos de 0,5% do total do comércio mundial de produtos médicos. Assim, essa limitação da fonte de dado não altera significativamente o resultado final e as tendências verificadas entre 1997 e 2004.

Outro limitador dos dados do ITC se refere à agregação dos dados. Alguns produtos que podem ser aplicados à saúde humana estão incluídos em outros grupos como, por exemplo, equipamentos elétricos, produtos de plásticos e borracha, veículos e máscaras. Da mesma forma, os grupos 541, 542, 774 e 872 incorporam produtos que não são para uso médico em humanos, como é o caso de produtos veterinários. Dada as várias utilidades de alguns produtos eles podem ser classificados sob várias nomenclaturas o que torna praticamente impossível calcular exatamente qual o volume de produtos médicos comercializados internacionalmente. Parte das exportações também se refere à re-exportações de insumos, partes e peças, o que resulta em dupla contagem dos dados. Porém, os problemas apontados acima, é preciso reconhecer, ocorrem com qualquer que seja o sistema de informação de dados ou método de classificação e agregação de mercadorias manufaturadas

Apesar das limitações apresentadas acima, os dados coletados são úteis para fazer estimativas e vislumbrar tendências no comportamento das principais economias que participam do comércio internacional de produtos médicos. Os dados disponíveis no ITC servem como ponto de partida para a formação de uma visão “cross-country” do setor produtor de bens para a saúde. Como o objetivo desse trabalho não é quantificar o comércio, mas identificar os países nos quais a indústria de produtos médicos encontra um ambiente propício para a expansão e para a competitividade internacional, os problemas acima mencionados não interferem no principal da análise. Cabe, por fim, considerar que os dados apurados por essa pesquisa se referem a dados individuais de mais de 170 países. Somados esses dados individuais correspondem a 99,30% dos dados apresentados de forma agregada pela Unctad em seu “Handbook of Statistics”de 2005 (Unctad, 2005).

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* Economista, Mestre e Doutor pela Unicamp, Professor do Curso de Economia da PUC-Campinas - PUCCAMP e do Mestrado Profissional em Administração das Micro e Pequenas Empresas da Faculdades Campo Limpo Paulista - FACCAMP.
** Bacharel, Mestre e Doutor em Ciências Econômicas pela Universidade de Paris I. Professor do Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências da UNICAMP

Vol. 28 (2) 2007
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