Espacios. Vol. 35 (Nº 2) Año 2014. Pág. 7


Ferramenta de captação de ideias em organização intensiva em conhecimento

An idea capture tool in a knowledge-intensive organization

Micheline KRAUSE 1. Douglas ÁLVARES 2. Maria Emília da SILVA 3. Neri dos SANTOS 4

Recibido: 15/11/13 • Aprobado: 12/12/13


Contenido

RESUMO:
Pessoas detêm o conhecimento e a criatividade necessária para criar soluções e ideias inovadoras que levem à excelência em produtos e serviços. A criação do conhecimento em organizações de base tecnológica requer práticas estrategicamente alinhadas com o escopo dos negócios, líderes descentralizadores, e ambiente cultural propício para que se obtenha o envolvimento dos colaboradores. Diante do desafio de aplicar a fundamentação teórica no contexto dinâmico das organizações, esta pesquisa se propõe a verificar, através de pesquisa qualitativa e de estudo de caso, como a ferramenta de captação de ideias foi utilizada pela organização pesquisada, sediada em um dos parques tecnológicos de Santa Catarina. Constatou-se que com planejamento, alinhamento com os objetivos de criação do conhecimento, campanha de marketing interno, incentivos e premiações, faz-se possível lançar a ferramenta, obter o engajamento dos colaboradores, e implementar novas ideias em organizações intensivas em conhecimento.
Palavras-Chave: Criação do conhecimento. Captação de ideias. Aprendizagem.

ABSTRACT:
People have the knowledge and creativity needed to create solutions and innovative ideas that lead to excellence in products and services. The knowledge creation in technology-based organizations requires practices strategically aligned with the scope of business, decentralizing leaders, and conducive cultural environment to get the involvement of employees. Facing the challenge of applying the theoretical framework in the context of dynamic organizations, this research aims to verify, through qualitative research and case study, how the learning and idea capture tool was used by the researched organization, headquartered on a technology park of Santa Catarina. It was found that with planning, alignment with the goals of knowledge creation, internal marketing campaign, incentives and awards, it is possible to launch the tool, get employee engagement, and implement new ideas in knowledge-intensive organizations.
Keywords: Knowledge creation. Idea capture. Learning



1. Introdução

Ideias inovadoras nascem em contextos apropriados na nova Sociedade do Conhecimento, que vem colocando o potencial das pessoas como a principal fonte geradora de excelência das organizações. Enquanto as economias anteriores buscaram desenvolver os recursos para melhor utilização do trabalho artesão, melhor utilização do solo, e para melhor gestão do capital financeiro, a atual economia do conhecimento tem concentrado esforços em desenvolver recursos para o melhor gerenciamento do conhecimento humano e organizacional.

Um amplo leque de técnicas, ferramentas, tecnologias, métodos, processos, e teorias, passaram a ser desenvolvidas para dar suporte, direcionamento, e embasamento para as práticas de Gestão do Conhecimento (GC), estreitando os vínculos entre teóricos e práticos. Afinal, gerenciar o conhecimento virou um desafio comum tanto à regência acadêmica quanto a de mercado.

Um dos pontos comuns entre os pesquisadores da gestão do conhecimento é a importância do papel das pessoas e do conhecimento tácito que elas portam consigo ou do conhecimento explícito que geram. Nestas modalidades de conhecimento anunciadas por Michael Polanyi (1996 apud NONAKA; TAKEUCHI, 1997), reside a chave para a inovação, para a geração de ideias, para a evolução de pessoas, organizações e sociedades.

Young (2010), reuniu trabalho colaborativo por intermédio da Asian Productivity Organization (APO), estabelecendo o que chamou de as “cinco etapas do processo de gestão do conhecimento da APO”, sendo elas a identificação, criação, armazenamento, compartilhamento e utilização do conhecimento. Para cada uma destas etapas o organizador reuniu as principais ferramentas e técnicas utilizadas em diferentes países.

Esta pesquisa se concentra na fase de criação do conhecimento, com foco na técnica de captação de ideias e aprendizagem – “learning and idea capture” - apresentada por Young (2010, tradução livre). Após revisão da literatura, de posse da necessária compreensão teórica sobre a técnica, a indagação que se apresentou foi: como lançar a ferramenta de captação de ideias em uma organização e obter o efetivo envolvimento dos colaboradores?

Por meio de estudo de caso, buscou-se analisar como uma ferramenta de criação do conhecimento pode ser lançada em uma organização para obter o envolvimento dos colaboradores, levando à inovação e aprendizagem. Propõe-se, ainda, a verificar o alinhamento da ferramenta com os objetivos estratégicos da organização, descrever a ferramenta e a forma como foi utilizada, contextualizando-a em uma organização intensiva em conhecimento situada em um dos parques tecnológicos de Florianópolis, Santa Catarina.

2. Referencial teórico

Passada a fase de expectativas em torno da inteligência artificial, o elemento humano vem conquistando crescente espaço na atenção de pesquisadores, que procuram desvendar as capacidades cognitivas do sujeito. Reconhece-se que as ideias estão nas pessoas, sendo necessário saber como estimular, motivar, liderar, promover o compartilhamento para que as ideias se manifestem e gerem inovações e melhorias em produtos e serviços a clientes cada vez mais exigentes.

Na concepção de Cooper et. al. (2002, p. 22, tradução livre), “Ideias estão por toda parte, dentro e fora da empresa. O problema é que muitas vezes elas permanecem em repouso; não geram tomada de decisão ou ação [...]”. Para aproveitar a criatividade de todos na organização, os autores defendem a estruturação de processos, ações sistemáticas, e eventos anuais onde se busque “aproveitar a energia criativa”.

Para Sternberg e Lubart (1996), o mercado das idéias precisa da combinação de seis recursos para produzir desempenho criativo, sendo eles: a inteligência, o conhecimento, os estilos de pensamento, a personalidade, a motivação e o ambiente propício. Como aspecto relacionado à inteligência, os autores enfatizam a capacidade das pessoas em redefinir problemas, pensar com vivacidade; o conhecimento contribui para as análises e para evitar a reinvenção da roda; os estilos de pensamento compreendem a maneira como as pessoas exploram a própria inteligência e conhecimento em suas interações diárias; a personalidade contribui com atributos como a tolerância da ansiedade na solução de problemas, perseverança, desapego às ideias já aprovadas, riscos assumidos, auto-confiança; como motivação, os autores evidenciam as de caráter intrínseco, que levam ao maior envolvimento; e como meio ambiente os autores consideram ambientes que promovam, aceitem e premiem as ideias criativas. Infelizmente, segundo os autores, escolas e outras instituições não cultivam o ambiente propício.

Neste sentido, fazendo associação com o tema inovação, encontramos em Reis (2008), a avaliação de que o Brasil tem se apropriado pouco de seu conhecimento científico para promover inovações tecnológicas. O autor considera que universidade e empresa precisam interagir de forma mais eficaz. Ghani (2009, p. 34, tradução livre), considera que as perspectivas apresentadas em gestão do conhecimento advêm de muitas áreas. “algumas de base intelectual, enquanto outras pragmáticas e fundamentadas na necessidade de inovar para assegurar performance”.

“Uma inovação é a implementação de um produto (bem ou serviço) novo ou significativamente melhorado, ou processo, um novo método de marketing, ou um novo método organizacional [...]” de acordo com definição apresentada no Manual de Oslo (OECD/Eurostat, 2005, p. 46, tradução livre).

Analisando-se os enfoques dados pelos autores referenciados, verifica-se que o mais importante fator de diferenciação nos dias atuais se encontra no interior de organizações e instituições. Pelo “uso da imaginação e dos símbolos” proporcionado pelas metáforas (TAKEUCHI; NONAKA, 2008), é possível afirmar: as ideias são as matérias-primas que constituem a substância essencial para a inovação, diferenciação, e vantagem competitiva; encontram-se internamente, no capital humano das organizações; precisam de ferramentas apropriadas para que possam ser extraídas e convertidas de sua forma tácita para explícita; podendo então ser usufruídas pela coletividade.

Aprendizagem e Conversão do Conhecimento

Baseados na distinção entre conhecimento tácito e explícito feita por Polanyi (1996), Nonaka e Takeuchi (1997) desenvolveram a teoria da criação do conhecimento organizacional pela interação dinâmica entre os dois tipos de experiência, que geram quatro modos de conversão do conhecimento.

Com base nos autores acima citados, tem-se a espiral da criação do conhecimento como “núcleo” de uma conversão que se desenvolve de forma contínua por suas interações. Na socialização, parte-se do conhecimento tácito para tácito, caracterizando as trocas entre indivíduos; na externalização, parte-se do tácito para o explícito, ou seja, do indivíduo para o grupo; pela combinação se dá a conversão de explícito para explícito, podendo ser caracterizado também como partindo do grupo e chegando à organização; e pela internalização o conhecimento passa de explícito para tácito, ou seja, da organização para o indivíduo.

Trata-se da conversão do conhecimento, ciclo também denominado como modelo, espiral ou processo SECI, e que está no núcleo do processo de criação do conhecimento (NONAKA; TAKEUCHI, 1997; TAKEUCHI; NONAKA, 2008). Constata-se que as contribuições destes autores viraram referência internacional nos estudos sobre criação do conhecimento, pois oferecem a visualização do processo, e sua aplicação nas organizações. Analisando-se a espiral, constata-se que ela traz conceitos relacionados às interações sociais, à gestão do capital humano, ao compartilhamento do conhecimento, à aprendizagem.

Pesquisas sinalizam que aprendizagem e inovação são processos que caminham juntos, sendo recomendável estabelecer a cultura de aprendizagem contínua dentro das organizações, como elemento gerador de inovações. De acordo com Yeung (1999 apud DASGUPTA; GUPTA, 2009, p. 207), quanto maior a capacidade de aprendizagem de uma empresa, maior é o nível de competitividade, inovação e sucesso na introdução de novos produtos. Igual sentido é oferecido por Bukowitz e Williams (2002, p. 146), para quem a aprendizagem se faz importante para a organização pois “é o passo de transição entre a aplicação de ideias e a geração de ideias novas”.

Autores mais empíricos, como Peter Senge (1999, p 214), também consideram que “nunca foi tão necessário quanto agora implementar o aprendizado em grupo nas organizações”. Para o autor, o aprendizado individual é até certo ponto irrelevante, sendo mais importante o aprendizado em grupo.

Cabe ressaltar, porém, que “o conhecimento só é criado por indivíduos. Sem indivíduos, uma organização não pode criar conhecimento”. (NONAKA; TAKEUCHI, 1997, p. 280), sendo adequada ao presente estudo a seguinte ponderação:

[...] É muito importante, portanto, que a organização apoie e estimule as atividades criadoras de conhecimento dos indivíduos ou que proporcione os contextos apropriados para elas. A criação do conhecimento organizacional deve ser entendida como um processo que ‘organizacionalmente’ amplifica o conhecimento criado pelos indivíduos e o cristaliza no nível do grupo através do diálogo, discussão, compartilhar de experiência, fazer sentido ou comunidade de prática. (TAKEUCHI; NONAKA, 2008, p. 25, grifo dos autores)

Abordagens teóricas referentes à criação do conhecimento, inovação, aprendizagem, motivação, existem disponíveis na literatura. O desafio é o de saber aplicar sistematicamente o conhecimento científico no contexto prático e dinâmico das organizações, buscando-se o desenvolvimento institucional, individual e social.

A Ferramenta de Captação de Ideias e Aprendizagem

A ferramenta denominada pela APO (YOUNG, 2010) como learning and idea capture é listada como de base não tecnológica, não dependendo das tecnologias da informação para ser utilizada. Porém, vale a pena ressaltar que pode ser otimizada quando apoiada em tecnologias, como foi o caso da empresa pesquisada, que apoiou os procedimento dentro de ambiente virtual colaborativo tipo wiki.

Segundo Young (2010, p. 13-15), a utilização da ferramenta de captação de ideias e aprendizagem permite aquisições de forma contínua e sistemática, aproveitando as contribuições coletivas ou individuais. Ou seja, a participação é inclusiva, considerando que cada indivíduo trabalha e aprende de um modo e rítimo que lhe são peculiares. Especifica, ainda: permite a avaliação por pares, a apreciação entre os envolvidos, promove acertividade na tomada de decisões, maior velocidade e aplicabilidade das ideias, integração das ferramentas tecnológicas pessoais e corporativas, além de oferecer formato simples de documentação e registro das ideias. Evidencia que o processo de explicitação das ideias pela escrita auxilia na organização do conhecimento, promovendo ainda mais conhecimento.

Young (2010) recomenda a disponibilização de várias maneiras de captação das ideias, seja por intermédio de ferramentas pessoais, como bloco de notas, assistentes digitais, email, banco de dados, blogs, câmeras, vídeos, scanners; ou coletivas, como por intermédio das comunidades de prática, redes sociais, fóruns de discussão, intranet corporativa, wikis, chat, áudio e vídeo-conferência.

De acordo com o manual da APO (YOUNG, 2010, p. 13), “o problema não é a falta de novas aprendizagens e ideias, mas o fato de não capturarmos essas aprendizagens e ideias – e sistematicamente fazermos nada com elas”.

A fim de responder ao “como” lançar a técnica – grifos nossos - buscado por esta pesquisa, faz-se necessário considerar o referencial oferecido por Aspinwall e Wong (2004), que sinalizam a importância do alinhamento das iniciativas de gestão do conhecimento com as estratégias e objetivos da organização, tornando processos e métodos mais efetivos, integrados, e incorporados à cultura organizacional, com avaliações contínuas sobre implementações e resultados. Enfatizam ainda a importância de iniciativas de gestão do conhecimento estarem apoiadas em bases teóricas bem fundamentadas, que ofereçam estrutura, direcionamento e um modelo a ser seguido.

Organizações Intensivas em Conhecimento

O mercado globalizado, competitivo e exigente, conduz as empresas a uma busca constante por informações de valor que possam melhorar produtos e serviços existentes. As organizações intensivas em conhecimento passaram a depender do conhecimento tácito e explícito de seus colaboradores, clientes, e parceiros comerciais, como principais ativos para o seu desempenho de mercado.

De acordo com Makani e Marche (2012), o termo Organização Intensiva em Conhecimento (OIC) foi apresentado pela primeira vez por Starbuck, em 1992, que o atribuiu a um tipo distinto de organização, evidenciando, porém, a inexistência de um consenso universalmente aceito sobre o que diferenciaria uma OIC. Por meio de revisão da literatura, os autores apontam como uma das características comumente aceitas a concepção de que o conhecimento é fundamental naquelas organizações, sendo a chave para o sucesso e para o fator de diferenciação.

Por meio de pesquisa de levantamento feita com profissionais de gestão do conhecimento vinculados a quatro associações de classe em diferentes países, Makani e Marche (2012) verificaram que empresas de desenvolvimento de software foram comumente apontadas como OICs. Identificaram como principais associações caracterizadoras de OIC as organizações que produzem e vendem conhecimento, que são credenciadas por organismo auto-regulamentado; e que reúnem colaboradores com habilidades cognitivas, responsáveis por tomadas de decisões, e que se utilizam de novos conhecimentos para resolver problemas complexos. Os estudos ressaltaram que os trabalhadores de OICs são direcionados para inovações, sendo muito importante o gerenciamento das necessidades de cada unidade de negócios, de seus processos, práticas, e de suas efetivas atividades.

A comunicação eficiente se tornou um fator determinante na gestão do conhecimento em OICs, efetivando ações, aproximando as unidades de negócios, viabilizando os fluxos de informação, geração de ideias, inovação, e compartilhamento de boas práticas. A busca por meios sistêmicos e processuais, que sejam eficientes e ágeis para proporcionar vias de acesso à base de conhecimento é a maneira pela qual as empresas estão oportunamente investindo tempo e dinheiro para encurtar o tempo de resposta na obtenção de resultados.

Na Sociedade do conhecimento atual, uma das mudanças mais importantes é observada através da alteração do foco que antes era pela mão de obra - numa organização de produção Taylorista, e que hoje é centralizada no cérebro de obra (VYGOTSKY, 2007), considerando o conhecimento como o maior insumo da produção de um bem.

Informação, descentralização, colaboração, passaram a fazer parte da pauta da administração, na tentativa de reduzir o sentimento de poder e posse sobre o conhecimento, e valorizar o crescimento conjunto como parte integrante do sucesso das organizações. A filosofia do ganha-ganha passou a ser estratégia obrigatória para equipes intensivas em conhecimento e focadas em resultado.

A velocidade das mudanças, a globalização, interatividade e conectividade virtual levaram as empresas a descentralizarem suas operações, fomentando células de negócios autônomos e permitindo que filiais em diferentes localidades pudessem prosperar como unidades independentes.

Essa realidade trouxe um novo modelo de administração, com valores diferentes dos anteriormente considerados, focados não unicamente no processo produtivo e fabril, mas, sobretudo no conhecimento e no valor gerado pela informação, independente de onde ela esteja.

Fatos passados como a formação de blocos econômicos (Comunidade Econômica Europeia, Mercosul), a consolidação de potências tecnológicas, a globalização dos diferentes mercados financeiros, conduzem a uma nova orientação econômica, com fortes influências sobre o mercado local. Toda essa realidade trouxe consigo uma preocupação forte com a tecnologia e consequente redução das distâncias proporcionada por ela.

Segundo Tofler (1990) “Economistas redescobrem a obra de Joseph Schumpeter, que falava da destruição criadora como necessária ao progresso [...]”. Apesar de ter afirmado isto há mais de duas décadas, percebe-se a contemporaneidade do enunciado.

Em organizações focadas no conhecimento, o real valor dos produtos está no conhecimento incorporado. Diante deste cenário, os desafios residem em um conjunto de necessidades novas, e em um novo modelo de gestão baseado na conectividade, integração, simultaneidade, compartilhamento, reuso, cooperação e horizontalidade, incentivando a captação de ideias inovadoras.

Cientes dos novos paradigmas da sociedade do conhecimento, o “como” – grifos nossos – passou a fazer parte dos principais desafios das organizações: como tratar bases de conhecimento em locais diferentes? como proporcionar ambiente criativo e que facilite a troca de experiências entre pessoas separadas geograficamente? como implementar metodologias de gestão do conhecimento em cenários onde as pessoas se encontram distantes umas das outras? como conquistar o efetivo envolvimento dos colaboradores?

3. Procedimentos metodológicos

Esta pesquisa tem como procedimento metodológico a abordagem qualitativa, interpretativa, com estudo de caso em empresa de grande porte, identificada como intensiva em conhecimento, localizada em um dos parques tecnológicos do Estado de Santa Catarina.

Como técnicas de coleta de dados, além de revisão da literatura, foram utilizadas fontes documentais e entrevista semiestruturada com um dos gerentes da organização, sendo ele um dos responsáveis pela implantação da ferramenta de captação de ideias e aprendizagem, foco desta pesquisa.

As análises são de cunho interpretativo, considerando-se as informações coletadas em campo e verificadas à luz do referencial teórico sobre criação do conhecimento. As investigações foram conduzidas no sentido de responder à indagação sobre como a empresa lançou a técnica de captação de ideias e aprendizagem para que conseguisse o efetivo envolvimento dos colaboradores. Em adição, buscou-se verificar como a técnica foi utilizada, seu alinhamento com as estratégias gerais da organização, além de seus principais resultados.

4. Contexto do estudo de caso

A empresa Alfa Tecnologia é uma organização de grande porte situada em um dos parques tecnológicos de Santa Catarina, sendo identificada como de base tecnológica e intensiva em conhecimento, de acordo com a literatura já referenciada neste estudo. Reúne colaboradores com significativo nível de instrução acadêmica, oferecendo-lhes política de capacitação constante em função dos projetos, produtos e serviços inovativos que criam e mantêm no segmento de mercado.

Entrevista semiestruturada foi realizada no terceiro trimestre de 2012 com um dos gerentes da organização, aqui identificado como gestor Alfa, que retratou o crescimento acelerado da empresa, e a necessidade de contratação de consultoria especializada há alguns anos, passando a planejar estrategicamente suas ações. Missão e visão foram revistos, análises de forças, fraquezas, ameaças e oportunidades geraram os mapeamentos estratégicos, dando novos direcionamentos à gestão e novas iniciativas.

Um dos pontos críticos identificados foi a falha na comunicação interna. Muitas vezes um grupo de pessoas começava a encaminhar determinadas ações num ponto, enquanto um outro grupo já estava fazendo a mesma coisa, apenas de maneira diferente. Ainda um terceiro estava fazendo algo que ia de encontro com o que já vinha sendo feito, como apontado pelo entrevistado.

Uma das providencias tomadas para reverter o quadro acima foi a implementação da ferramenta de colaboração virtual tipo Wiki, que serviria tanto para informar, quanto integrar colaboradores e promover o compartilhamento do conhecimento. A ferramenta foi muito bem estruturada na empresa, armazenando praticamente todos os processos e documentos corporativos das unidades de negócios nos repositórios correspondentes, sendo estes facilmente acessáveis.

Segundo o gestor Alfa, passou-se a enxergar objetivamente a ‘espiral do conhecimento’ ocorrendo em processos de explicitação, compartilhamento e internalização de conhecimentos. Ele considera que, em termos de gestão do conhecimento, a ferramenta tipo wiki foi uma das melhores já implantadas na empresa, tendo em vista que oferece o ambiente necessário para incorporar outras ferramentas e iniciativas.

Apresentação e Análise dos Resultados

Por intermédio das informações apresentadas pelo gestor Alfa, constatou-se que a empresa soube utilizar o feedback de seu capital de clientes que sinalizava para a necessidade de constante retrabalho por parte de suas equipes de desenvolvedores, fazendo com que perdessem agilidade, proatividade e tivessem que lidar com a insatisfação dos clientes.

Para resolver o problema, optaram por lançar um programa de captação de ideias junto aos seus colaboradores, por entender que eram eles que estavam vivenciando as dificuldades, podendo ser capazes de entrever soluções. O gestor Alfa enfatiza que a empresa buscou criar o ambiente favorável para que as pessoas pudessem trazer as sugestões relacionadas à inovação, declarando que ‘a empresa vive disso’. O passo-a-passo do programa foi cuidadosamente formalizado, elegendo-se as lideranças que dariam o suporte, acompanhamento, incentivo e avaliações necessárias, constituindo-se um comitê multidisciplinar.

Contrataram nova consultoria que os auxiliou no desenvolvimento e implantação do programa, que foi incorporado e apoiado pelos recursos de compartilhamento da ferramenta wiki já implementada na organização. Perceberam que a criação do ambiente motivador era um de seus principais desafios, visto que não adiantaria todo o planejamento, todas as ações e tecnologias sem o envolvimento das pessoas. Os passos seguintes, segundo o entrevistado, foram lançar o programa em grande estilo, em evento organizado fora da organização, e ‘vestir a empresa’ com a identidade visual relacionada, a fim de fomentar identificação, comprometimento, incentivo à participação dos colaboradores.

Segundo o gestor Alfa, a participação foi maciça entre os colaboradores, com centenas de ideias selecionadas, entre as quais cerca de oito já haviam sido implementadas até aquele momento da entrevista, quatro meses após o encerramento da iniciativa.

Os benefícios que surgem da maior proximidade entre o conhecimento acadêmico e as práticas de mercado foram verificados durante a entrevista com o referido gestor, que declarou: ‘a gente enxerga a espiral do conhecimento rodando aqui’. Procurou-se, então, aplicar a teoria dos quatro modos de conversão do conhecimento de Nonaka e Takeuchi ao presente estudo de caso, representando a forma como esta espiral do conhecimento se desenvolveu no programa de captação de ideias adotado pela empresa pesquisada, conforme figura 1:

Figura 1- Processo SECI aplicado ao programa de Captacao de Ideias da empresa Alfa

Fonte: Adaptado pelos autores, com base em adaptação de
Nonaka e Takeuchi (1995, apud TAKEUCHI; NONAKA, 2008)

Pela análise da figura acima é possível deduzir que o uso da ferramenta de captura de ideias utilizada com os colaboradores leva à criação do conhecimento pela conversão do conhecimento. Quando solicitado a identificar a fase de gestão do conhecimento que a ferramenta atende na empresa, o entrevistado apontou a alternativa: ‘identificação e criação do conhecimento’, confirmando ter compreensão sobre o alinhamento da técnica à fase de gestão do conhecimento correspondente.

Quando questionado sobre o grau de maturidade da empresa em gestão do conhecimento, o entrevistado declarou considerar que a empresa possui boas práticas em uma série de questões relacionadas a GC. Considera que falta, efetivamente, formalizar os processos e possuir consciência de que se está desenvolvendo práticas de Gestão do Conhecimento.

Diante da alta complexidade dos produtos, serviços, processos e práticas existentes na organização, contar com a criatividade, capacidade, motivação, envolvimento e compartilhamento dos colaboradores se mostrou uma questão crucial na criação do conhecimento. A gestão dos recursos intangíveis deve ser compreendida em sua complexidade, com ações contínuas e sistemáticas, ferramental adequado, liderança motivacional, criação de ambiente propício, e atenção às demais particularidades de cada grupo e contexto.

5. Conclusão

O estudo de caso realizado em empresa de grande porte de um dos parques tecnológicos de Santa Catarina, caracterizada como intensiva em conhecimento, levou à conclusão de que a ferramenta de captação de ideias foi bem implementada, de forma estruturada, e obedecendo a um planejamento traçado pelos gestores.

Conforme recomendado na literatura por Aspinwall e Wong (2004), verificou-se que a ferramenta estava alinhada aos objetivos estratégicos da organização, estando diretamente relacionada à criação do conhecimento e inovação. Por meio de entrevista com um de seus gestores, constatou-se que os implementadores da ferramenta possuíam clara compreensão sobre este alinhamento, e sobre o processo de conversão do conhecimento. O entrevistado demonstrou conhecimento de processos de gestão do conhecimento, evidenciando o valor da fundamentação teórica em iniciativas de GC.

Apurou-se que a empresa havia passado por processo de reformulação estratégica em anos recentes, possuindo maior compreensão de sua missão, visão e valores. Soube identificar seus problemas de comunicação interna e utilizar o feedback de seu capital de clientes na identificação de problemas, transformando-os em oportunidades de crescimento e inovação. Neste sentido, verificou-se a manifestação do que Cooper et. al. (2002) denominaram “aproveitar a energia criativa” por meio de efetivas ações e processos.

Conforme caracterizado por Young (2010), a ferramenta de captação de ideias permitiu: obter aquisições de forma sistemática; contar com contribuições individuais e coletivas; avaliação por pares; apreciação de todos os envolvidos; velocidade e aplicabilidade das ideias; integração de ferramentas tecnológicas pessoais e corporativas; formato simples de documentação e registro das ideias; e aprendizagem pela explicitação, organização e criação de novos conhecimentos.

Durante a entrevista, o gerente manifestou o mesmo tipo de questionamento levantado nesta pesquisa, sobre como lançar a ferramenta, e como obter o envolvimento dos colaboradores. Esta preocupação levou os gestores da iniciativa a “vestir a empresa”, a lançar o programa utilizando-se de estratégias de Marketing interno e de Marketing de Incentivos, buscando o envolvimento dos colaboradores. A empresa buscou apoio profissional para o desenvolvimento, implementação e lançamento da ferramenta. As lideranças que fariam o acompanhamento, avaliações e incentivos ao programa foram formalmente identificadas, o que sugere a importância do papel dos líderes. Entende-se, portanto, que houve o planejamento adequado, o alinhamento, compreensão clara de objetivos, sendo nomeadas as lideranças de apoio, e oferecido o ambiente motivacional e tecnológico necessários.

Relacionando os dados com o que preconizam Sternberg e Lubart (1996), constata-se que o desempenho criativo foi gerado pela combinação de recursos como inteligência (capacidades dos colaboradores), conhecimento (que foi compartilhado pela organização), estilos de pensamento e personalidade (perfil orientado para inovações em OICs, e colaboradores familiarizados com ferramentas apoiadas em tecnologia), bem como motivação e criação de ambiente propício (esforços integrados da organização).

Foi possível entrever, ainda, pela espiral do conhecimento com base em Nonaka e Takeuchi (1997), que a empresa ofereceu o contexto apropriado para a aprendizagem, pelos processos de conversão baseados em externalização e internalização de conhecimentos.

Dominar a tecnologia, possuir os recursos tangíveis, reunir colaboradores super capacitados, possuir os processos explicitados, preparar lideranças e ações motivacionais, fazem parte de um contexto tipicamente encontrado em organizações do conhecimento. O cerne da questão, porém, reside na gestão complexa e integradora de todo este conhecimento, de forma alinhada com os objetivos e direcionadores organizacionais, em ambientes em contínua transformação.

Avalia-se que a pesquisa respondeu ao questionamento inicial, alcançou os objetivos traçados, além de contribuir para a melhor compreensão sobre como ocorre a utilização de uma ferramenta de criação do conhecimento no contexto de uma grande organização intensiva em conhecimento.

6. Referências bibliográficas

ASPINWALL, E.; WONG, K.Y. (2004); “Knowledge management implementation frameworks: a review”, Knowledge and Process Management, 11(2), 93–104.

BUKOWITZ, W. R; WILLIAMS, R. L. (2002); Manual de gestão do conhecimento: ferramentas e técnicas que criam valor para a empresa; Tradução de Carlos Alberto Silveira Netto Soares; Porto Alegre, Bookman.

COOPER, R. G.; EDGETT, S. J.; KLEINSCHMIDT, E. J. (2002); “Optimizing the stage-gate process: what best-practice companies do – part 1”, Research-Technology Management, 45(5), 21 – 27.

DASGUPTA, M.; GUPTA, R. K. (2009); “Innovation in organizations: a review of the role of organizational learning and knowledge management”, Global Business Review, 10(2), 203–224

GHANI, S. R. (2009); “Knowledge management: tools and techniques”, DESIDOC Journal of Library & Information Technology, 29(6), 33-38.

MAKANI, J.; MARCHE, S. (2012); “Classifying organizations by knowledge intensity: necessary next-steps”, Journal of Knowledge Management, 16(2), 243-266.

NONAKA, I.; TAKEUCHI, H. (1997); Criação de Conhecimento na Empresa: como as empresas japonesas geram a dinâmica da inovação; Tradução de Ana Beatriz Rodrigues Priscilla Martins Celeste, 5.ed; Rio de Janeiro, Campus.

OECD/Eurostat (2005). Oslo Manual: guidelines for collecting and interpreting innovation data, 3rd. edition; Paris, OECD and Eurostat.

REIS, D. R. (2008); Gestão da inovação tecnológica, 2.ed; Barueri-SP, Manole.

SENGE, P. M. (1990); A Quinta Disciplina: arte, teoria e prática da organização de aprendizagem; Tradução de Regina Amarante, 9. ed.; São Paulo, Best Seller.

STERNBERG, R. J.; LUBART, T. I. (1996); “Investing in creativity”, American Psychologist, 51(7), 677-688.

TAKEUCHI, H; NONAKA, I. (2008); Gestão do Conhecimento; Tradução de Ana Thorell; Porto Alegre, Bookman.

TOFLER, A. (1990); Powershift: as mudanças do poder; Rio de Janeiro, Record.

VYGOTSKY, L. S. (2007); A formação social da mente, 7 ed.; São Paulo, Martins Fontes.

YOUNG, R. [Org]. (2010); Knowledge management tools and techniques manual; United Kingdom, APO.


1 Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) – Brasil –michelinekrause@gmail.com
2 Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) – Brasil –douglas.alvares@gmail.com
3 Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) – Brasil –masilva142@gmail.com
4 Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) – Brasil –neri@egc.ufsc.br


Vol. 35 (Nº 2) Año 2014
[Índice]

[En caso de encontrar algún error en este website favor enviar email a webmaster]