Espacios. Vol. 36 (Nº 04) Año 2015. Pág. 12

Nível de adesão ao tratamento ambulatorial de pacientes dependentes de substâncias psicoativas

Membership level for outpatient treatment of patients addicted to psychoactive substances

Juliana de Almeida Castro Marinho MEIRELLES 1; Maria Cecilia Fricke CHOHFI 2; Melina Machado BASILIO 3; Adriano GERALDINI 4; Gerardo Maria DE ARAÚJO FILHO 5; Ronaldo Ramos LARANJEIRA 6; Claudio Jeronimo DA SILVA 7

Recibido: 06/10/14 • Aprobado: 17/11/14


Contenido

1. Introdução

2. Metodologia

3. Resultados

4. Discussão

5. Conclusão

Referências bibliográficas


RESUMO:

O consumo de substâncias psicoativas no Brasil é preocupante, assim como ocorre em escala mundial. A dependência de álcool e drogas é considerada uma doença crônica, o seu alvo não é a "cura", mas a abstinência, o que requer um acompanhamento prolongado. A eficácia dos tratamentos em dependência química depende do tempo que os pacientes passam em tratamento até a sua alta e o abandono é um dos problemas mais graves. O objetivo deste trabalho foi analisar o perfil sócio-demográfico e o nível de adesão ao tratamento dos pacientes do programa de álcool e drogas do Ambulatório Médico de Especialidades - AME. A metodologia utilizada foi a descritiva, com métodos qualitativos e quantitativos, usando como ferramenta para coleta dos dados um questionário estruturado e dados de prontuário. A pesquisa apresentou o perfil clínico e sócio-demográfico, no período de agosto de 2010 a maio de 2011. As características dos pacientes seguiram o padrão dos pacientes de outros programas, mas a adesão ficou acima da média. Este resultado é decorrente de um conjunto de ações como o mapeamento detalhado do perfil dos pacientes, uma equipe especializada, combinação de atividades terapêuticas e discussão constante dos casos em reuniões periódicas.
Palavras-chave: adesão, dependência química, tratamento ambulatorial.

ABSTRACT:
The consumption of psychoactive substances in Brazil is worrying, as occurs worldwide. Dependence on alcohol and drugs is considered a chronic disease, your goal is not to "cure ", but abstinence, which requires prolonged monitoring. The efficacy of treatments for addiction depends on the time patients spend in treatment until discharge and abandonment is one of the most serious problems. The aim of this study was to analyze the socio- demographic profile and the level of adherence to treatment of patients in alcohol and drug Ambulatory Medical Specialties program - AME. The methodology used was descriptive, using qualitative and quantitative methods, using as a tool for data collection a structured questionnaire and medical record data. The research presented the clinical profile and socio -demographic, from August 2010 to May 2011 Patient characteristics of patients followed the pattern of other programs, but membership was above average. This result is due to a set of actions as the detailed mapping of the profile of patients, a specialized team, combining therapeutic activities and constant discussion of cases in regular meetings.
Keywords: adherence, chemical dependency, outpatient treatment.

1. Introdução

O consumo de substâncias psicoativas no Brasil é crescente, assim como ocorre em escala mundial. O uso de álcool na população brasileira tem uma prevalência de 62% nos homens, que beberam no último ano, 64% apresentaram uso de uma vez por semana ou mais, e o beber em Binge, mais de cinco doses em menos de duas horas, representou 66%, ou seja, 5 milhões bebem regularmente, uma vez por semana (VARGENS et. al., 2011; LARANJEIRA et. al. 2012). Em relação às drogas ilícitas, 4% da população brasileira adulta experimentou a cocaína, sendo que, 2% consumiu no último ano, alancando 2,6 milhões de pessoas. O Brasil é o segundo maior consumidor de cocaína do mundo, após os Estados Unidos (LARANJEIRA et. al., 2012).

A dependência de álcool e drogas é considerada uma doença crônica, o seu alvo não é a "cura", mas a abstinência, o que requer um acompanhamento prolongado (SADOCK, 2007). Entre os diversos tipos de tratamento em dependência química, o ambulatorial agrega vantagens como: custo inferior às internações hospitalares, atendimento a um número maior de pacientes e a sua permanência por mais tempo ao serviço, possibilitando uma participação maior no programa (ZANELATTO, 2011).

Na prática clínica, o Modelo Transteórico de Prochaska e DiClemente, é utilizado com o propósito de identificar o estágio de motivação dos pacientes, que desde os primeiros estágios de mudança até a fase da ação, leva-se de três a seis meses. Em todo o processo do tratamento, a equipe multiprofissional utiliza como ferramenta clinica a entrevista motivacional na abordagem com o paciente, auxiliando-o no processo de mudança (PROCHASKA e DICLEMENTE, 1982; DICLEMENTE 1999;  RESENDE, 2005; MILLER e ROLLNICK, 2001).

Estudos reforçam a hipótese que o tempo de adesão é um indicador para a avaliação do tratamento de fatores de melhora ou piora dos resultados. A eficácia dos tratamentos em dependência química depende do tempo que os pacientes passam em tratamento até a sua alta. Há um tempo mínimo em que os pacientes devem permanecer em acompanhamento para atingirem os benefícios de um padrão estável de abstinência das substâncias psicoativas (ATKINS e HAWDON, 2007; BELL et. al., 1996; FLYNN et. al., 2003; GOSSOP et. al., 1999; GOSSOP et. al., 2002; O'BRIEN, 1994; SIMPSON, 2002; SIMPSON et. al., 1995; SINDELAR e FIELLIN, 2001; WHITE e KURTZ, 2005; RIBEIRO e LARANJEIRA, 2012;  GOSSOP, 2002; SIMPSON, 2002). Permanecer em tratamento por um período de tempo adequado é fundamental, e a duração depende do tipo do grau de problemas do paciente e suas necessidades. A maioria dos indivíduos com dependência química necessita de pelo menos três meses de tratamento para reduzir significativamente ou parar o uso da droga (RIBEIRO, 2008; NIDA, 2014).

O conceito de adesão ou adherence, como é apresentado na literatura internacional, é o ato para referir o comportamento das pessoas diante de um tratamento ou recomendação proposta, e neste estudo foi adotado este termo (DE GEEST e SABATE, 2003). O abandono do tratamento ainda é o um problema a ser enfrentado nos casos de doenças crônicas, e atingem taxas acima de 50% no primeiro mês de tratamento. A mesma estimativa foi encontrada em pessoas com doenças crônicas, que não seguem seus tratamentos da maneira recomendada, pois envolve mudanças comportamentais, estilo de vida, uso de múltiplos medicamentos, entre outros fatores (STARK, 1992; DIMATTEO, 2004). Na dependência química, o abandono ao tratamento é um dos problemas mais graves, e a maioria dos estudos mostra que um número elevado de pacientes o interrompem. Até 50 % ou mais dos pacientes recém-admitidos podem desistir, e isso é preocupante, pois acabam recebendo apenas um nível mínimo de assistência especializada. Nestes casos, a terapia é provavelmente ineficaz porque os pacientes não persistem em um tempo de duração recomendado (SÁNCHEZ-HERVÁS et. al., 2010).

Diante da importância do tema, e em especial para desenvolver politicas públicas de saúde, este estudo tem como objetivo analisar os fatores que impactam no nível de adesão no tratamento dos pacientes do programa de álcool e drogas de um ambulatório especializado (Ambulatório Médico de Especialidades – AME).

2. Metodologia

De acordo com o objetivo do trabalho, a metodologia adotada foi um estudo descritivo. Considera-se descritivo a apresentação das características de uma população, um subgrupo, um fenômeno ou relação entre variáveis, podendo descrever até a natureza destas relações. Como procedimento para coleta dos dados, foi utilizada uma pesquisa mista, quantitativa e qualitativa, por analisar a relação entre variáveis testadas por meio de programas que usam dados numéricos, procedimentos estatísticos, e teorias bibliográficas (MARTINS, 2009).

Para a pesquisa, foram analisados dados primários e secundários a partir de entrevista com funcionários do Ambulatório Médico de Especialidades e análise dos protocolos de atendimento do programa de álcool e drogas, questionário de avaliação inicial e prontuário do paciente, no período de agosto de 2010 a maio de 2011. Assim, como as informações foram coletadas num dado momento do tempo, o estudo é considerado como um corte transversal (FLETCHER e FLETCHER, 2006 ).

O estudo foi conduzido no Ambulatório Médico de Especialidades - AME, localizado na cidade de São Paulo, na microrregião Vila Maria/Vila Guilherme, e a amostra totalizou 306 participantes, que responderam a avaliação no início do tratamento. Em razão da natureza da fonte dos dados, a pesquisa foi isenta da necessidade do termo de consentimento livre e esclarecido como preconiza os Documentos Institucionais e a Resolução 196/96 do Ministério da Saúde.

Os dados foram compilados em um banco de dados e inicialmente analisados descritivamente. Para variáveis categóricas foram apresentadas frequências absolutas e relativas. Para as variáveis numéricas foram apresentadas medidas-resumo (média, mínimo, máximo, quartis e desvio padrão. A existência de associações entre variáveis categóricas foi verificada por meio do teste Qui-quadrado ou exato de Fisher (em caso de amostras pequenas). A comparação de médias entre dois grupos e mais de dois grupos foram realizadas pelo teste t de Student e Análise de Variância, respectivamente. Ambos os testes têm como pressuposto a normalidade dos dados, o qual foi verificado utilizando-se o teste de Kolmogorov-Smirnov. Para todos os testes estatísticos foram utilizados um nível de significância de 5%.

3. Resultados

Na distribuição dos pacientes por características sócio-demográficas, apresentados na tabela 1, os principais achados foram: 81% dos pacientes eram do sexo masculino; 46% eram solteiros; a média de idade foi 37 anos; a renda média familiar foi de R$ 2.008,00 sendo que a maioria pertencia a classe social C ou D (52,4%); 44,3% estavam desempregados e 83% não tinham qualquer benefício.

Tabela 1 - Distribuição dos pacientes segundo características sociodemográficas

Características

N

%

Gênero

306

100

Feminino

58

19

Masculino

248

81

 

 

 

Faixa Etária

304

100

até 20 anos

20

6,6

20 ----| 30

77

25,3

30 ----| 40

89

29,3

40 ----| 50

62

20,4

Acima de 50 anos

56

18,4

Sem informação

2

 

 

 

 

Estado conjugal

239

100

Solteiro

111

46,4

Casado

57

23,8

união estável

34

14,2

Separado

33

13,8

Viúvo

4

1,7

Sem informação

67

 

 

 

 

Escolaridade

234

100

Analfabeto

4

1,7

Alfabetizado

6

2,6

fundamental incompleto

65

27,8

fundamental completo

27

11,5

médio incompleto

35

15

médio completo

77

32,9

superior incompleto

13

5,6

superior completo

6

2,6

pós-graduado

1

0,4

Sem informação

72

 

 

 

 

Renda familiar (faixa)

119

100

até R$ 1.100,00

40

33,6

R$ 1.100,00 ----| R$ 2.000,00

43

36,1

acima de R$ 2.000,00

36

30,3

Sem informação

187

 

 

 

 

Ocupação arual

212

100

Desempregado

94

44,3

empregado com registro

43

20,3

empregado sem registro

45

21,2

atividade não remunerada

1

0,5

Estudante

5

2,4

Outros

24

11,3

Sem informação

94

 

 

 

 

Situação previdenciária

159

100

sem benefício

133

83,6

auxílio desemprego

2

1,3

auxílio doença

4

2,5

aposentadoria por invalidez

6

3,8

aposentadoria por tempo de serviço

3

1,9

Pensionista

3

1,9

outras fontes

8

5

Sem informação

147

 

 

 

 

Classe social

145

100

A2

1

0,7

B1

11

7,6

B2

25

17,2

C

76

52,4

D

32

22,1

Sem informação

161

 

Fonte: Autor

Quanto ao diagnóstico por uso de substância, o resultado mais relevante foi a dependência do álcool com 56,6% e o uso nocivo com 12,9%. Apenas 19,3 % não tinham nenhum problema com álcool, e 8% tinham registro de múltiplas substâncias, com exceção do álcool. O segundo diagnóstico que mais prevalente foi de dependência de cocaína com 44,4%, seguido por dependência de nicotina com 42,7%, conforme tabela 2.

Tabela 2–Distribuição dos pacientes segundo diagnóstico do uso de substância psicoativa

Diagnóstico

N

%

F10 (álcool)

295

100

Ausência

57

19,3

F10.1 (uso nocivo)

38

12,9

F10.2 (dependência)

167

56,6

F 19 Múltiplas drogas

33

11,2

Sem informação

11

 

 

 

 

F12 (maconha)

294

100

Ausência

180

61,2

F12.1 (uso nocivo)

8

2,7

F12.2 (dependência)

58

19,7

F 19 Múltiplas drogas

48

16,3

Sem informação

12

 

 

 

 

F13

294

100

Ausência

223

75,9

F13.1

1

0,3

F13.2

8

2,7

Múltiplas drogas

62

21,1

Sem informação

12

 

 

 

 

F14 (cocaína)

295

100

Ausência

129

43,7

F14.1 (uso nocivo)

10

3,4

F14.2 (dependência)

131

44,4

F19  Múltiplas drogas

25

8,5

Sem informação

11

 

 

 

 

F17 (nicotina)

295

100

Ausência

126

42,7

F17.1 (uso nocivo)

4

1,4

F17.2 (dependência)

125

42,4

F 19  Múltiplas drogas

40

13,6

Sem informação

11

 

Fonte: Autor

Em relação à distribuição dos pacientes segundo o tipo de alta, nota-se que 46,7% dos pacientes abandonaram o tratamento em algum momento, sendo que 40,5% aderiram ao projeto terapêutico desenhado para eles (tabela 3).

Tabela 3: Distribuição dos pacientes segundo tipo de alta

Tipo de alta

N

%

Total

306

100

alta – abandono

120

39,2

alta - abandono precoce

23

7,5

alta – melhora

34

11,1

alta – encaminhamento

4

1,3

alta – pedida

1

0,3

em tratamento

124

40,5

Fonte: Autor

Corroborando ao dado apresentado na tabela 4, no qual a média de permanência no programa é apresentada em dias, foi possível notar que independente da forma de abandono, precoce ou não, o tempo de permanência foi similar, sendo de 134 dias (comparações múltiplas de Duncan, 5% de significância). Além disso, o tempo médio de permanência foi de 148,96 dias (mínimo de 8, máximo de 426, mediana 141 e desvio padrão de 84,58 dias). Dos pacientes que receberam alta-abandono ou abandono precoce cumpriram respectivamente 63,85% e 63,65% do processo de tratamento do programa.

Tabela 4 - Medidas-resumo de dias de permanência em pacientes com alta

Tipo de alta

Média

Med.

Mín.

Máx.

Desvio Padrão

N

Total

148,21

140,5

8

426

84,38

154

alta - abandono

134,09(A)

135,5

8

370

75,68

110

alta - abandono precoce

133,67(A)

109,5

15

426

120,8

12

alta – melhora

205,36(B)

206,5

59

372

75,43

28

alta - encaminhamento

206,33

252

85

282

106,14

3

alta – pedida

101

101

101

101

-

1

Fonte: Autor

Conforme a Tabela 4, encontram-se os seguintes resultados estatísticos:

  1. 28 pacientes com alta sem informação de data de alta ou data de início;
  2. Comparação de médias entre as três primeiras categorias de alta-Anova (F2,147=9,07, p<0,001). Teste de Kolmogorov-Smirnov para normalidade (p=0,438)
  3. (A) e (B) apresentam médias distintas a um nível de significância de 5% (comparações múltiplas de Duncan).

Tabela 5: Média de permanência e percentagem de permanência em relação ao período analisado

Tipo de alta

Média (em dias)

Percentagem de dias em tratamento

período analisado (em dias)

Total

148,21

70,58%

210

alta – abandono

134,09

63,85% (A)

210

alta - abandono precoce

133,67

63,65% (A)

210

alta – melhora

205,36

97,79% (B)

210

alta – encaminhamento

206,33

98,25%

210

alta – pedida

101

48,10%

210

Fonte: Autor

Para esses dados, não houve correlação entre o diagnóstico do uso de substância e o tipo de alta, (pelo teste exato de Fisher significância de 5%).

Dos 219 pacientes que responderam a questão sobre tentativas anteriores de tratamento, 60,7% já apresentavam uma tentativa anterior, sendo que a média de tentativas foi de 2,73 (mínimo de 1, máxima 10 e desvio padrão de 2,22).

4. Discussão

O Ambulatório é composto por cinco especialidades: 1 - psicogeriatria, 2 - álcool e drogas, 3 - psiquiatria infantil e da adolescência, 4 - transtornos psicóticos e 5 - transtornos afetivos e de ansiedade. O atendimento é oferecido a pacientes com perfil ambulatorial e quadros psiquiátricos de intensidade moderada a grave, com manejo clínico difícil, necessitando estratégias terapêuticas mais complexas, com dúvida diagnóstica e recém-saídos de internação psiquiátrica.

O tratamento do programa de álcool e drogas, local onde foi realizada a pesquisa, é multiprofissional. Os pacientes recebem tratamento farmacológico, se necessário, avaliação neuropsicológica, acompanhamento psicológico individual e em grupos homogêneos, divididos pelo tipo de substâncias utilizadas.  Técnicas de prevenção da recaída e psicoeducação são utilizadas. Em muitos casos há orientação familiar e a inclusão da terapia ocupacional. O tratamento visa, principalmente, avaliar comorbidades dos pacientes, estabilizar um quadro de crise, para por fim serem reencaminhados para o serviço de origem.

De acordo com Figlie (2004), é importante o paciente receber muitas chances para se tratar, e esta oportunidade é uma ação que facilita a adesão dos pacientes por meio de busca ativa com o objetivo de evitar que ele não se perca no processo de tratamento. No programa analisado, são realizados telefonemas ou envio de telegramas, a fim de organizar o seguimento e manter a comunicação com os pacientes.

O critério utilizado para determinar a adesão do paciente ao tratamento foi a frequência por pelo menos três meses em uma das modalidades oferecidas pela equipe de álcool e drogas do Ambulatório Médico de Especialidades. Esta frequência de três meses é defendida em alguns estudos como o tempo mínimo necessário para determinar se um paciente aderiu ou não ao tratamento (PEIXOTO, 2010).

Ratificando a frequência escolhida pelo programa estudado, em um CAPS AD no Piauí, a adesão foi considerada quando o cliente permanece acima de três meses em tratamento (MONTEIRO et. al., 2011). Já um período de 6 meses é considerado como uma boa adesão (PELISOLI, 2005).

Foi constatado nas entrevistas a necessidade de organizar os serviços de rede que poderão fazer parte do tratamento, como internação breve para desintoxicação e diagnostico diferencial, internação a longo prazo em comunidade terapêutica, encaminhamentos para atendimentos mais intensivos.

Observa-se que o perfil sócio demográfico e o diagnóstico dos pacientes atendidos no ambulatório é similar ao perfil epidemiológico do uso de substâncias no Brasil, isto é, sexo masculino, solteiro e desempregado, com faixa etária entre 30-40 anos, idade mencionada em outros estudos de dependência química, com diagnóstico de uso ou dependência de álcool seguido por cocaína e tabaco (LARANJEIRA, 2012; BURNS, 2009;  PEIXOTO et. al., 2010).

Sobre o histórico de uso de substâncias na vida, 96% da amostra usou álcool, 83% tabaco, 63% maconha e 62,3% cocaína. O álcool é a substância mais frequente. Com relação aos diagnósticos dos pacientes, 56% apresentou dependência de álcool; 44% dependência de cocaína, sendo que uma minoria dessa população consumia crack; 42% dependência de tabaco e 19% dependência de maconha. A principal comorbidade encontrada, com 22% foi de episódio depressivo moderado. Dos problemas relacionados ao consumo, 76% relataram serem os familiares, seguido de psicológicos, 75%.  

Na amostra analisada, o tempo de tratamento teve uma média de sete meses de duração, e 60% já tentou tratamento anterior. A taxa de abandono no programa é de 39,2%, bem abaixo das taxas apresentadas em outros estudos que tem índices acima de 50% até o primeiro mês, sendo que os três primeiros meses parecem estar associados aos maiores índices de recaída e abandono. (STARK, 1992; RIBEIRO, 2008).

Considerando que os pacientes que receberam alta melhorada e os que receberam alta por encaminhamento aderiram às propostas terapêuticas planejadas para eles e permaneceram em tratamento até serem encaminhados ou terem uma boa evolução, podemos afirmar que 60,8% dos pacientes aderiram à proposta terapêutica do programa.

Como uma limitação deste trabalho, por ser o primeiro ano do programa de álcool e drogas no AME, alguns itens do questionário não estavam com as informações completas. Esse fato, pode ter ocorrido devido à falta de coleta pela equipe em dado momento, seja por razões intrínsecas ao atendimento ou pela não continuidade do tratamento pelo paciente.

O AME tem como objetivos otimizar o atendimento a pacientes com transtornos mentais graves com perfil ambulatorial (não-intensivo), complementar e fortalecer o atual sistema de atendimento em saúde mental (CAPS), referência de atendimento ambulatorial para UBS, CAPS, CECCO e NASF.

Aspectos que demonstraram importantes para uma gestão eficiente de serviço da dependência química, permitindo o AME ter um resultado de adesão acima da média, é conhecer o perfil sócio-demográfico do paciente que procura e realiza o tratamento especializado em álcool e drogas, e analisar a adesão ao programa ambulatorial. Para tanto, o AME desenvolve uma combinação de terapias e trabalho em rede com outros serviços, discussões periódicas dos casos administrados, e a seleção e treinamento da equipe direcionados as necessidades dos pacientes.  Este formato de tratamento é apresentado de forma parcial ou como um conjunto de ações em diversos estudos  (MARINHO et. al., 2011; LOPEZ-GONI, 2011; DH, 2007; NIDA, 2012; SÁNCHEZ-HERVÁS et. al, 2010).

5. Conclusão

Concluiu-se que o resultado acima da média na adesão dos pacientes em tratamento em dependência pode estar relacionado a um conjunto de ações como: mapeamento detalhado do perfil dos pacientes, equipe especializada e treinada para atender esta população com uma combinação de diversas atividades terapêuticas e discussão constante dos casos em reuniões periódicas. A identificação precoce dos fatores preditores de risco de abandono decorrente de um mapeamento do perfil do paciente, fornece informações úteis sobre as necessidades de tratamento específico para essa população, isso permite que se possa implementar estratégias adaptadas individualmente, sendo um possível fator de retenção em programas de intervenção.

Referências bibliográficas

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1 Mestranda pelo Departamento de Psiquiatria e Psicologia Médica da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Brasil. E-mail: ju.deacmarinho@gmail.com.

2. Especialista em Dependência Química pela Unidade de Pesquisa em Alcool e Drogas da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), BrasilE-mail: cicachohfi@hotmail.com

3. Especialista em Dependência Química pela Unidade de Pesquisa em Alcool e Drogas da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Brasil. E-mail: mel_basilio@hotmail.com.

4. Especialista em Dependência Química pela Unidade de Pesquisa em Alcool e Drogas da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Brasil. E-mail: adrianogeraldini@hotmail.com.

5. Doutorado em Neurologia/Neurociências pela Universidade Federal de São Paulo. Docente da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto. Brasil. E-mail: filho.gerardo@gmail.com.

6. Doutorado em Phd In Psychiatry pela London University, Grã-Bretanha. Professor Titular do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Brasil. E-mail: laranjeira@uniad.org.br

7. Doutorado em Psiquiatria pela Universidade Federal de São Paulo, Brasil. Professor Afiliado da Universidade Federal de São Paulo, Brasil. Brasil. E-mail: claudiojeronimo@uniad.org.br.

Vol. 36 (Nº 04) Año 2015
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