Espacios. Vol. 37 (Nº 08) Año 2016. Pág. 16

Produção de Lavoura Branca na Amazônia: uma avaliação econômica da produção familiar rural do acre

Production of White Crop in the Amazon: an economic assessment of family production rural acre

Tiago de Oliveira LOIOLA 1; Paulo Alves da SILVA 2; Pedro Gilberto CAVALCANTE FILHO 3

Recibido: 10/11/15 • Aprobado: 29/11/2015


Contenido

1. Introdução

2. Metodologia

3. Coleta de dados

4. Resultados e Discussões

5. Considerações Finais

Referências Bibliográficas


RESUMO:

Dado o impacto que a produção da lavoura branca (arroz, feijão, milho e mandioca) possui para a agricultura familiar, o objetivo do presente trabalho é avaliar os resultados econômicos dessa produção no Estado do Acre, na década de 1996 a 2006. Para tanto, utiliza-se da metodologia desenvolvida pelo projeto de pesquisa Análise Socioeconômica dos Sistemas de Produção Familiar no Estado do Acre (ASPF). Os resultados da pesquisa apontam um enfraquecimento da produção de lavoura branca para o período, uma vez que a baixa produtividade e os elevados custos de produção inviabilizam a venda para o mercado.
Palavras-chaves: Agricultura Familiar. Lavoura Branca. Avaliação Econômica.

ABSTRACT:

Given the impact that the production of the white farming (rice, beans, maize and cassava) has for family farms, the aim of this study is to evaluate the economic results of the white crop production in Acre, in the decade from 1996 to 2006. Therefore, we use the methodology developed by the research project Socioeconomic Analysis of Family Production Systems in the State of Acre (ASPF). The survey results point to a weakening of white crop production for the period, as the low productivity and high production costs make it impossible to sell to the market.
Key Words: Family Agriculture. Crop White. Economic Evaluation.

1. Introdução

A agricultura familiar é caracterizada quando a família é detentora dos meios de produção ao mesmo tempo em que emprega sua mão de obra na unidade produtiva. Assim, a base da unidade de produção é geria pela família, implicando afirmar que não há distinção entre gestão e realização das atividades (WANDELEY, 2003; SALDANHA; 2003; OLALDE e PORTUGAL, 2004).

Por outro lado, alguns autores afirmam que a agricultura familiar, ao longo do tempo, tem-se distinguido da agricultura de subsistência, ou a pequena agricultura, ou agricultura de baixa renda para agricultura comercial ou empresarial (GUANZIROLI, 2001; BARROS, 2006).

Entretanto, a agricultura familiar ainda encontra imensas dificuldades produtivas, principalmente, por não estar inserida no processo de modernização da agricultura, sendo um processo centralizador voltado especialmente para a região Centro-Sul. Assim, para um desemprenho econômico viável dessa atividade é necessário a implementação de políticas de assistência técnica adequada a cada região (GUANZIROLI et al., 2001; TEIXEIRA, 2005).

Esse segmento produtivo apresenta um grande impacto na população rural, uma vez que, de acordo com o Censo Agropecuário de 2006, foi identificado que os estabelecimentos familiares rurais representam 84,4% dos estabelecimentos rurais brasileiros. Além disso, a agricultura familiar tem um grande impacto na economia brasileira, respondendo por 40% da produção agrícola nacional, e também é o setor responsável por cerca de 70% da produção de alimentos consumidos pela população brasileira, sobretudo os produtos constantes da pauta da chamada "lavoura branca" – arroz, feijão, milho e mandioca (SALLES FILHO e SOUZA, 2002; TOSCANO, 2005).

No estado do Acre, a situação da produção agrícola, notadamente da produção familiar rural, constitui-se num grande desafio para se promover o desenvolvimento do setor em virtude de suas diversas facetas, ou seja, na garantia do autoconsumo ou na busca por níveis de eficiência econômica exigida pelo mercado, possibilitando a geração de emprego, a ampliação e distribuição de renda (MACIEL, 2010).

Nesse sentido, ao observar a importância que produção da lavoura branca possui para a agricultura familiar, tanto para o autoconsumo como para a geração de renda, é neste ponto que a questão central do presente trabalho está atrelada: a produção da lavoura branca gera renda suficiente para a manutenção da produção familiar rural no Estado do Acre?

É fundamental a realização de mais estudos sobre o desempenho econômico da produção familiar rural na Amazônia, em particular no Acre, diagnosticando o sistema produtivo agrícola da região.

É preciso pontuar fatores convergentes para a prática de uma agricultura com dimensão abrangente que, de um lado, possa combater a pobreza e a exclusão social e, de outro lado, possa diminuir a dependência externa quanto aos gêneros alimentícios básicos, no que se refere à produção de lavoura branca.

Assim, o presente trabalho propõe-se analisar o desempenho econômico da produção de lavoura branca dos produtores familiares do Estado do Acre, buscando comparar esse tipo de atividade entre as duas mesorregiões do Estado, Vale do Acre e Vale do Juruá, considerando os períodos de 1996/1997 e 2005/2006.

A hipótese adotada para nortear o presente trabalho é que a produção da lavoura branca ainda não é suficiente para a manutenção da produção familiar rural, dado as dificuldades produtivas ainda encontradas, como a ausência de estradas adequadas para a escoação da produção, baixa tecnologia empregada no sistema produtivo etc.

2. Metodologia

Este estudo tem como objeto a produção familiar rural do estado do Acre, sendo a análise voltada para a linha de exploração da lavoura branca nas mesorregiões do Vale do Acre e do Vale do Juruá.

O Acre é uma das 27 unidades federativas do Brasil, com extensão territorial de 152.581,38 Km2 e formado por 22 municípios. Desde 1999 está politicamente divido em cinco microrregiões, que são Alto Acre, Baixo Acre, Purus, Tarauacá/Envira e Juruá; e duas mesorregiões: Vale do Acre e Vale do Juruá.

Conforme Acre (2009), na região acreana existem 30.295 produtores familiares assentados em diversas formas de assentamento, incluindo Projetos de Assentamento, Florestas Estaduais e Reservas Extrativistas.

Tabela 1 - Área, famílias assentadas e população estimada por tipo de assentamento, Acre – 2009.

Tipos de assentamento

Número de famílias assentadas

Titulados

Não titulados

Total

Floresta Estadual

-

479

479

Floresta Nacional

-

26

26

PA

2.557

8.879

11.454

PAD

6.563

1.990

8.553

PAE

-

1.989

1.189

PAF

-

469

469

PAR

125

282

407

PCA

-

226

226

PDS

-

2.719

2.719

Pólo Agroflorestal

-

560

560

Reserva Extrativista

-

4.213

4.213

Total

9.245

21.050

30.295

Fonte: Acre (2009)
PA – Projeto de Assentamento; PAD – Projeto de Assentamento Dirigido; PAE – Projeto de Assentamento Estadual;
PAF - Projeto de Assentamento Federal; PAR - Projeto de Assentamento Rápido; PCA – Projeto Casulo de Assentamento;
PDS – Projeto de Desenvolvimento Sustentável

Assim, conforme metodologia e banco de dados do projeto ASPF, estudou-se os valores gastos pelos produtores familiares rurais depois que os produtos já foram gerados, ou seja, uma análise ex-post. Foram feitas duas análises em dois períodos, utilizando-se o calendário agrícola da região. O primeiro compreendeu o período de maio de 1996 à abril de 1997 e o segundo entre maio de 2005 à abril de 2006, havendo um intervalo de 10 anos entre esses períodos. O levantamento de dados foi realizado entre as famílias rurais por intermédio de amostragem.

A amostra pesquisada no Vale do Acre foi de 310 produtores em 11 municípios (Sena Madureira, Acrelândia, Capixaba, Plácido de Castro, Porto Acre, Senador Guiomard, Assis Brasil, Epitaciolândia, Rio Branco, Brasiléia e Xapuri). No Vale do Juruá, a amostra pesquisada foi de 158 produtores em 06 municípios (Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima, Marechal Thaumaturgo, Rodrigues Alves, Feijó e Tarauacá).

Utilizou-se como referência para o levantamento das informações, o calendário agrícola da região, definido conjuntamente com as próprias comunidades estudadas, que se refere ao período de maio de um ano a abril do ano seguinte, englobando o conjunto de atividades econômicas produtivas das famílias.

3. Coleta de dados

Os dados utilizados para a presente pesquisa foram disponibilizados pelo projeto de Análise Socioeconômica dos Sistemas Básicos de Produção Familiar Rural no Estado do Acre – ASPF, desenvolvido pelo Centro de Ciências Jurídicas e Sociais Aplicadas (CCJSA) da Universidade Federal do Acre (UFAC), criado em 1996, com o objetivo de fazer a avaliação socioeconômica da produção familiar no referido estado, por intermédio de metodologia adequada e especifica a este tipo de produção.

O projeto de pesquisa ASPF foi criado no ano de 1996 com pesquisa socioeconômica rural na mesorregião do Vale do Acre. A partir de 2000, o projeto ampliou a sua pesquisa para mesorregião do Vale do Juruá.  

No projeto ASPF foram construídos vários indicadores para a avaliação econômica da produção familiar rural no Acre, que vão desde os tradicionais até os que somente se aplicam à produção familiar rural. Os principais indicadores econômicos utilizados neste trabalho estão sucintamente descritos a seguir:

Os principais indicadores econômicos são sucintamente descritos a seguir:

Renda Bruta (RB) - indicador de escala de produção                                            

                                                  

                                                                                                           (1)

sendo:

RB = renda bruta

Q = quantidade do produto comercializada no mercado

P = preço unitário ao produtor

i = produto comercializado no mercado (i = 1, 2, ... , n)

Margem Bruta Familiar (MBF) - valor monetário disponível para a família

                                                                                (2)

Sendo,

MBF = Margem Bruta Familiar

RB = Renda Bruta

CV = Custo Variável

Cftf = Custo da força de trabalho familiar

Índice de Eficiência Econômica (IEE) - indicador de benefício/custo

                                                                                                             (3)

Sendo,

IEE = Índice de Eficiência Econômica

IEE > 1, a situação é de lucro

IEE < 1, a situação é de prejuízo

IEE = 1, a situação é de equilíbrio

MBF/Qh/d - índice de remuneração da mão de obra familiar, demonstra a produtividade do trabalho.

Sendo,

MBF = Margem Bruta Familiar

Qh/d = quantidade de força de trabalho familiar utilizada no ciclo produtivo da linha de exploração

Produtividade Física da Produção (PFP)

                                                                                                               (4)

sendo:

PFP = renda bruta

Q = quantidade (kg) colhida do produto

A = área plantada em hectares (ha)

i = produto colhido (i = 1, 2, ... , n)

Ponto de equilíbrio (PE) - é um indicador do custo de produção expresso em unidade de produto. Aponta o nível de produção mínimo para cobrir um nível de custo. É determinado por:

                                                                                                               (5)

                        

sendo:

PE = ponto de equilíbrio

(CT)i = custos totais de uma linha de exploração

P = preço unitário do produto

4. Resultados e Discussões

Na Tabela 2, observa-se que dentre os 10 produtos que compõem as primeiras posições do ranking de produção mundial de commodities, em 2012, a produção de lavoura branca vem se destacando entre as primeiras posições. A produção de milho é o 2º, com uma produção anual de 877.924.227 toneladas, o arroz em 3ª posição, com uma produção anual de 734.906.259 toneladas e a mandioca em 9º com uma produção anual de 266.128.405 toneladas, assim a lavoura branca mostra sua importância na produção mundial de alimentos. A produção de feijão é o único produto que compõem a produção de lavoura branca que não aparece no ranking.

Tabela 2 – Ranking da Produção Mundial de Commodities - 2012

Commodity

Produção

(Toneladas)

Produção (1000$ Int)

1

Cana de Açúcar

1.838.535.433

  58.453.524,98

2

Milho

  877.924.227

  58.381.309,16

3

Arroz com Casca

  734.906.259

188.766.282,98

4

Trigo

  671.481.923

  80.060.204,29

5

Leite

  630.183.852

196.655,803,29

6

Batatas

 370.594.694

  49.283.065,76

7

Legumes

 275.380.375

  46.826.788,12

8

Beterraba Sacarina

269.617.030

  10.921.760,49

9

Mandioca

266.128.405

  26.141.998,32

10

Soja

240.971.129

  60.680.725,23

Fonte: FAO, 2015. Elaboração Própria.

A Tabela 3 apresenta o ranking brasileiro na produção alimentos para o ano de 2012. Os principais produtos referentes a produção de lavoura branca que estão entre os 10 mais produzidos no Brasil são o milho, mandioca e o arroz em casca. 

Tabela 3 - Ranking da Produção de Commodities – Brasil – 2012

Commodity

Produção

(Toneladas)

Produção (1000$ Int)

1

Cana de Açúcar

721.077.287

23.458.006,97

2

Milho

 71.072.810

  4.506.253,34

3

Soja

 65.848.857

17.619.429,79

4

Leite de Vaca

 32.304.421

10.080.949,92

5

Mandioca

 23.044.557

  1.203.651,78

6

Laranja

 18.012.560

   3.481.071,32

7

Carne de Frango

 11.583.137

 16.499.101,42

8

Arroz em Casca

11.549.881

   3.167.941,36

9

Carne de Vaca

  9.424.092

 25.458.017,99

10

Bananas

  6.902.184

   1.943.868,98

Fonte: FAO, 2015. Elaboração Própria.

O milho é 2º do ranking com uma produção de commodities no ano de 2012 com uma produção de 71.072.810 toneladas, a mandioca em 5º com uma produção de 23.044.557 e o arroz em casca em 8º com uma produção total de 11.549.881 toneladas.

Conforme a Tabela 4, no ranking das culturas temporárias no estado do Acre, a mandioca é o 1º no ranking, é o produto com maior produção 897.160 toneladas no que se refere a lavoura branca, o milho aparece em 3º com uma produção de 96.687 toneladas, o arroz foi o 5º maior produto de lavouras temporárias com uma produção de 18.358 toneladas e o feijão foi 6º com uma produção de 6.428 toneladas.

Tabela 4 - Ranking da Produção de Lavoura Temporária – Acre – Brasil - 2012

Principais Produtos das Lavouras Temporárias

Quantidade Produzida (t)

Valor (1000 R$)

 

1

Mandioca (2)

897.160

261.794

2

Cana-de-açúcar (2)

199.370

 11.600

3

Milho (em grão)

  96.687

  54.980

4

Melancia

  18.860

    8.803

5

Arroz (em casca)

  18.358

 12.094

6

Abacaxi (1) (2)

   7.712

 12.848

7

Feijão (em grão)

   6.428

 18.001

8

Amendoim (em casca)

      566

   1.503

9

Batata-doce

     532

     679

10

Fumo (em folha)

    180

     761

Fonte: IBGE, 2015. Elaboração Própria.
(1) Quantidade produzida em 1 000 frutos e rendimento médio em frutos por hectare.
(2) A área plantada refere-se a área destinada à colheita no ano.

Avaliação econômica da produção de lavoura branca no estado do Acre

Mostrar a quantidade produzida os produtos relacionados a lavoura branca nos níveis estadual, nacional e internacional é importante para conhecer o papel de tais culturas no mercado.

Contudo, a manutenção e reprodução social das famílias é o grande desafio principalmente na Amazônia, tendo em vista as grandes dificuldades, como por exemplo, falta de mão de obra qualificada, falta de tecnológica adequada, além disso, ainda tem a ausência do documento da terra que impede o produtor contrair empréstimos para fazer investimento em sementes ou maquinário para melhorar a produção.

Avaliação Econômica da Lavoura Branca no Vale do Acre

Um primeiro aspecto a ser considerado na avaliação econômica da lavoura branca é o valor em percentual da geração de renda bruta por linha de exploração.

Conforme com a Tabela 5, os produtos da lavoura branca têm impactos reduzidos na geração de renda bruta entre as famílias rurais do Vale do Acre, destacando-se apenas a produção de mandioca, responsável por 7,7% da renda gerada na região, resultando em uma evolução de 68,5%, no período em torno de uma década. Além disso, os demais produtos da lavoura branca obtiveram resultados desastrosos do ponto de vista de geração de renda bruta.

Tais resultados evidenciam um desestímulo na produção de feijão de (-83,5%), arroz (-74,5) e milho (-74,5), vale destacar que a produção da lavoura branca é muito importante para autoconsumo.

Tabela 5 – Geração de Renda Bruta da Produção
Familiar Rural, Vale do Acre, Acre – 2005/2006.

Linha de Exploração

Geração de Renda Bruta (%)

Vale do Acre

2005/2006

Evolução

Criações

54,6%

20,7%

Criação de Bois

47,5%

46,4%

Criação de Porcos

3,3%

-59,9%

Criação de Aves

2,7%

-23,0%

Outros

1,1%

2,3%

Agricultura

27,3%

-34,3%

Café

2,4%

67,8%

Macaxeira

7,7%

68,5%

Banana

2,8%

-36,3%

Melancia

1,5%

-30,9%

Feijão

1,2%

-83,5%

Arroz

2,0%

-74,7%

Milho

2,5%

-74,7%

Outros

7,2%

78,2%

Agrofloresta

5,6%

-14,6%

Pupunha Fruto

2,0%

-35,3%

Cupuaçu

1,2%

-49,5%

Pupunha Palmito

0,8%

5149,7%

Café

1,1%

-*

Outros

0,5%

-53,0%

Extrativismo

12,6%

85,5%

Castanha

6,7%

140,0%

Borracha

2,0%

0,0%

Madeira

2,6%

49,4%

Outros

1,3%

406,7%

Fonte: ASPF (2015)


O baixo valor dos produtos da lavoura branca na geração de renda já evidencia o fraco resultado econômico apresentado pelas famílias rurais do Vale do Acre.

O gráfico 1 mostra dados sobre a evolução dos indicadores econômicos no Vale do Acre, com as informações apresentadas é possível fazer um uma análise econômica da situação das famílias rurais que vivem no Vale do Acre. 

No gráfico 1 há uma redução tanto no nível de vida quanto no autoconsumo das famílias, comparando-se com o primeiro período, o nível de vida é um indicador importante, pois representa o valor apropriado da produção familiar rural. Assim, com a redução de 43,80%, as famílias que moram no Vale do Acre tiveram algum tipo de privação, impactando negativamente no seu bem-estar.

Gráfico 1 - Desempenho econômico mediano do Vale do Acre, 1996/1997 e 2005/2006, Acre – Brasil.

Fonte: ASPF (2014). Elaboração Própria.
Obs.: Valores atualizados Fev/2015.
Resultados medianos; *Relatório ao período 1996/1997; BR - Renda Bruta; MBF - Margem Bruta    
Familiar; VBCC - Bens de Consumo Comprados no Mercado: LDM - Linha de Dependência do Mercado; AC – Autoconsumo; NV - Nível de Vida.

O autoconsumo apresenta uma redução de 70,47%, significando que para o período as famílias reduziram a produção, esse resultado pode ter consequência drásticas se mantiver essa tendência, pois o meio rural pode até perder suas características, por exemplo, virar "zona urbana". Além disso, a redução do autoconsumo pode aumentar a quantidade de pobres e miseráveis.  

O gráfico 1 mostra um acréscimo na linha de dependência do mercado, essa dependência ocorre por causa da baixa produção, assim as famílias têm que buscar suas mercadorias fora da sua residência. O aumento da linha de dependência de mercado das famílias do Vale do Acre foi de 142,73%.

Os bens comprados no mercado também tiveram uma elevação de 129%, provavelmente para esse período houve um dispêndio maior das famílias rurais, pois se as famílias rurais do Vale do Acre não produzem alimentos para o autoconsumo faz-se necessário a busca destes no mercado.

Na tabela 6 mostra resultados de indicadores e índice das famílias rurais do vale do Acre. O valor pago na diária (MBF/Qh/d), foi inferior ao custo de oportunidade da região, diária da região em torno de R$ 54,00. É importante enfatizar que alguns produtos estão com uma evolução negativa, agravando ainda mais a relação trabalho versus remuneração.

Tabela 6 - Indicadores/Índices Econômicos da Lavoura Branca,
Agricultura Familiar – Vale do Acre, Acre, Brasil – 2005/2006.

Indicadores/Índices

Linha de Exploração

Feijão

Arroz (C)

Milho (C)

Farinha de Mandioca (S)

Arroz (S)

Milho (S)

MBF/Qh/d (R$)

37.14

29.56

23.21

22.60

12.88

10.63

Evolução (%)*

42

62

-45

211

-75

-52

IEE

0.45

0.84

0.49

0.39

0.34

0.26

Evolução (%)*

-48

-1

-5

-19

-65

-55

Custo Unitário (R$/kg)

5.49

2.79

1.30

4.84

2.94

2.05

Evolução (%)*

52

-31

70

-

1

56

Preço (R$/kg)

2.85

2.38

0.95

1.90

2.38

0.95

Evolução (%)*

-3

8

27

-19

8

27

PE (kg)

1220.69

1826.96

2719.87

8112.06

2805.54

6794.55

Evolução (%)*

-38

-28

-15

36

-44

-37

Produtividade (kg/ha)

432.14

1080.35

864.28

2160.70

1728.56

1296.42

Evolução (%)*

-33

67

33

100

26

12

Obs.:* Relativo ao período 1996/1997; MBF/Qh/d - Remuneração diária da força de trabalho familiar; MBF - Margem Bruta Familiar; IEE - Índice de Eficiência Econômica; PE - Ponto de Equilíbrio C - Consorciada; S – Solteira

Obs.:Valores atualizados Fev/2015.

Fonte: ASPF (2015)

Ainda segundo a Tabela 6, a produtividade de todas as culturas avaliadas é claramente insuficiente para cobrir o Ponto de Equilíbrio produtivo, no qual não se produz o suficiente nem para cobrir os custos produtivos para viabilizar a produção, ou seja, os produtores estão produzindo abaixo dos custos de produção, destaca-se ainda que para o período analisado os resultados da produtividade e ponto de equilíbrio (PE) apresentaram uma evolução, mesmo assim não foi o suficiente para melhorar esses indicadores.

A Tabela 6 destaca ainda os resultados referente ao Índice de Eficiência Econômica (IEE) que que para o período apresenta prejuízo para todas as culturas produzidas na região, cuja evolução negativa para o período analisado, causa verdadeira apreensão com o futuro, visto que essas lavoras servem tanto para uma produção de mercado e para o autoconsumo.

A ineficiência econômica da lavoura branca produzida no Vale do Acre está claramente relacionada, pelo lado da oferta, aos baixos níveis de produtividade física, que, por sua vez, estão relacionados com as dificuldades entre os produtores de progresso tecnológico das referidas culturas, ainda tradicionalmente ligadas ao processo produtivo denominado de "corte e queima", utilizando-se de equipamentos e ferramentas artesanais. Destarte, a baixa produtividade física está expressa nos altos custos produtivos.

Avaliação Econômica da Lavoura Branca no Vale do Juruá

Conforme a Tabela 7, a agricultura é a principal atividade produtiva entre os produtores familiares rurais da região do Vale do Juruá, tendo a produção de mandioca como responsável por 57,7% da renda bruta total. A macaxeira obteve um crescimento de 86,3% para o período. Destaca-se que a região do Vale do Juruá a forte produção de farinha para o consumo interno e também para exportação para outras regiões do estado do Acre.

Contudo, a geração de renda bruta a partir da produção de arroz teve queda acentuada para o período analisado, tornando os produtores da região nitidamente dependentes da produção de mandioca, além, claro, da criação de gado bovino, cuja evolução em termos de geração de renda praticamente dobrou no referido período. Cabe destacar, ainda, a pouca diversidade produtiva entre os produtores da região, além da forte queda na evolução da geração de renda dos produtos extrativistas, em mais de 80% nos últimos sete anos

Tabela 7 – Geração de Renda Bruta da Produção
Familiar Rural, Vale do Juruá, Acre – 2006/2007

Linha de Exploração

Geração de Renda Bruta (%)

Vale do Juruá

2006/2007

Evolução*

Agricultura

74,2%

20,8%

Macaxeira

57,7%

86,3%

Arroz

4,8%

-61,6%

Outros

11,7%

-34,6%

Criações

23,5%

-6,6%

Criação de bois

17,7%

109,4%

Outros

5,8%

-65,4%

Extrativismo

2,3%

-82,9%

Borracha

1,2%

-80,9%

Madeira

1,0%

-85,1%

Outros

-*

0,0%

*Relativo ao período 1999/2000

Fonte: ASPF (2015)


O gráfico 2 apresenta um baixo desempenho nos valores econômicos das famílias que moram no Vale do Juruá comparados ao primeiro período.

O nível de vida foi um dos indicadores com maior redução para o período, 43,19%, esse resultado impacta no aumento da pobreza e miséria das famílias, significando que o poder aquisitivo das famílias diminuiu ao longo do período, ou seja, as famílias rurais ficaram mais pobres em 2006/2007, o valor líquido mediano disponível obtido pelas as famílias foram de R$ 261,50 mês.

Gráfico 2 - Desempenho econômico mediano do Vale do Juruá, 2006/2007, Acre – Brasil.

Fonte: ASPF (2014). Elaboração Própria.
Obs.: Valores atualizados Fev/2015.
Resultados medianos; *Relatório ao período 1999/2001; BR - Renda Bruta; MBF - Margem Bruta    
Familiar; VBCC - Bens de Consumo Comprados no Mercado: LDM - Linha de Dependência do Mercado; AC – Autoconsumo; NV - Nível de Vida.

O autoconsumo seria um meio para melhorar o nível de vida das famílias rurais do Vale do Juruá, mas o gráfico 2 mostra que o autoconsumo teve a maior redução para o período, 66,65%. A produção para o autoconsumo em tese seria um indicador que poderia mudar a situação de pobreza e miséria, pois aumentaria a reprodução familiar sem a necessidade de dispêndio monetário.

De acordo com o gráfico 2, o valor gasto mediano no mercado foi de R$ 1.497,57 ao mês, representando uma elevação de 544,17%. Com a redução da produção para o autoconsumo a linha de dependência do mercado (LDM) aumentou no o período. Esse resultado contradiz as características da agricultura familiar rural.

Em relação à eficiência técnica e econômica, de acordo com a Tabela 9, a produção de lavoura branca na região do Vale do Juruá segue o mesmo padrão de ineficiente do restante do estado acreano. No tocante à produtividade do trabalho, embora a remuneração recebida por dia de trabalho nas produções de lavoura branca seja melhor que em outras áreas do estado, a renda auferida pelos produtores ainda está abaixo do custo de oportunidade da região, com valor (R$ 25,00/dia) semelhante ao constatado no Vale do Acre.

A diária da produção do Arroz foi o que apresentou o maior valor, R$ 22,45 MBF/Qh/d, a macaxeira-farinha mesmo apresentando melhor resultado econômico é a cultura que paga o menor valor na diária, R$ 18,10.

A tabela 8 apresenta os principais indicadores e índices das famílias rurais do Vale do Juruá, destacando o baixo nível de produtividade acarretando um elevado custo de produção, por outro lado, os preços da produção projetada para o mercado se mostra abaixo dos custos de produção.

Tabela 8 - Indicadores/Índices Econômicos da Lavoura Branca, Agricultura Familiar – Vale do Juruá, Acre, Brasil – 2006/2007

INDICADORES/

ÍNDICES

Linha de Exploração

Macaxeira –

Farinha (S)

Arroz (S)

Arroz (C)

MBF/Qh/d (R$)

24.75

30.69

27.47

Evolução (%)*

4

-27

-64

IEE

0.71

0.67

0.66

Evolução (%)*

-35

-39

-72

Custo Unitário (R$)

2.05

1.00

1.12

Evolução (%)*

162

-69

-27

Preço (R$)

1.33

0.66

0.66

Evolução (%)*

54

-81

-81

PE (kg)

7530.77

3176.10

2324.31

Evolução (%)*

162

-69

-27

Produtividade (kg/ha)

4101.73

1367.24

1025.43

Evolução (%)*

173

153

72

Obs.:* Relativo ao período 1999/2001; MBF/Qh/d - Remuneração diária da força de trabalho familiar; MBF - Margem Bruta Familiar; IEE - Índice de Eficiência Econômica; PE - Ponto de Equilíbrio C - Consorciada; S – Solteira
Obs.: Valores atualizados Fev/2015.

Fonte: ASPF (2015)


Quanto à produtividade física dos produtos comercializados, observa-se Tabela 8 que para chegar ao Ponto de Equilíbrio produtivo, igualando custos às receitas, a produtividade dos produtos analisados tem mais que dobrar os níveis atuais. Vale notar, que, nos últimos sete anos, tanto a produção de macaxeira quanto a do arroz auferiram enorme aumento de produtividade. Claro que, devido ao baixo nível tecnológico da região, como em toda a região acreana, devem-se buscar maiores explicações sobre esse aumento. Talvez a resposta esteja relacionada ao aumento da produção de farinha de mandioca tenha pressionado os produtores a aumentar o beneficiamento da macaxeira.

Do ponto de vista da eficiência econômica (IEE), segundo a Tabela 8, a lavoura branca da região do Vale do Juruá apresenta índices com prejuízo, pois todos mostram resultados inferior a 1. O produto com melhor eficiência apresentada foi a produção da macaxeira, apresentando o índice de 0,71.

Assim, analisando os resultados da lavoura branca no vale do Juruá, o produto com maior destaque foi a macaxeira, mesmo assim apresenta resultado de prejuízo na sua produção para o período analisado. Os resultados da macaxeira mostram ainda que o preço da macaxeira era de R$ 0,97 para o período analisado, enquanto os seus custos unitários eram de R$ 1,50, com esses valores fica evidente o total prejuízo que os produtores tiveram com a produção da macaxeira.

A mesma coisa acontece com a produção de arroz no vale do Juruá, onde seus custos unitários são bem superiores que o preço vendido.

Vale destacar que as lavouras de milho e feijão não tiveram uma produção significante nem para o autoconsumo.

5. Considerações Finais

A partir do presente estudo, pode-se inferir que a cultura da lavoura branca no estado do Acre está passando por um momento delicado, no que se refere a sua contribuição ao crescimento e desenvolvimento local. O objetivo maior deste trabalho foi identificar quais fatores resultam na ineficiência observada nas unidades produtivas familiares de lavoura branca no estado do Acre. Verificou-se, ainda, que uma das maiores causas desse cenário está intimamente relacionado a baixa produtividade e a altos custos gerados no processo produtivo e aos baixos preços praticados no mercado.

Destarte, percebe-se que para melhorar a remuneração da mão-de-obra utilizada nas unidades produtivas familiares e a produtividade das culturas deve-se considerar a adoção de novas tecnologias, de forma a aperfeiçoar a produção de maneira consciente e sustentável, ou seja, manejando adequadamente o solo. Nesse viés, é preponderante a contribuição do governo em seus três níveis (União, Estados e Municípios), em particular na capacitação do produtor rural, fornecendo-lhe aparatos institucionais, como a garantia de assistência técnica, e ferramentas que resultem na melhoria da produtividade. Por outro lado, deve-se pensar em novas tecnologias que possam levar a uma maior agregação de valor aos produtos, mediante o beneficiamento destes e seus derivados.

Com relação aos preços praticados nos mercados de lavoura branca, torna-se decisivo a organização dos mesmos. Nesse processo, a atuação do estado é primordial no sentido da regulação, como acontece já nas políticas de preços mínimos, mas que nem sempre chega para o produtor rural. Ora, no meio rural amazônico, a figura do atravessador está no cerne dos processos de comercialização entre os produtores rurais e os comerciantes. Nesse processo quem ganha menos é o produtor rural, visto que muitos atravessadores ficam com parte dos lucros. Um caminho interessante para o fortalecimento dos produtores rurais é justamente o estabelecimento de maiores incentivos à autogestão, a partir das associações e cooperativas.

Assim, na discussão sobre o desenvolvimento rural e a produção de alimentos, torna-se primordial fortalecer a produção familiar rural, auxiliando na reprodução social desse segmento tanto do ponto de vista do autoconsumo quanto dos aspectos técnicos e econômicos, visando sua comercialização no mercado. A evolução desse processo está no oferecimento de produtos com qualidade e preços acessíveis para o consumidor.

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1. Mestre em Desenvolvimento Regional e Professor de Economia do curso de Administração do Campus de Guajará Mirim da Universidade Federal de Rondônia. (UNIR). Email: tiago.loiola@yahoo.com.br
2. Mestre em Desenvolvimento Regional e Economista.

3. Graduando do curso de Economia da Universidade Federal do Acre. (UFAC)



Vol. 37 (Nº 08) Año 2016

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