Espacios. Vol. 37 (Nº 13) Año 2016. Pág. 12

Integração entre mercados de bezerros dos estados de Mato Grosso do Sul e São Paulo, Brasil

Integration of calve markets in the states of Mato Grosso do Sul and São Paulo, Brazil

Cleyzer Adrian DA CUNHA 1; Alcido Elenor WANDER 2; Waldemiro Alcântara da SILVA NETO 3

Recibido: 20/01/16 • Aprobado: 12/03/2016


Contenido

1. Introdução

2. Revisão de literatura

3. Modelo econométrico

4. Resultados e discussão

5. Considerações finais

Bibliografia


RESUMO:

O presente trabalho buscou avaliar a integração no mercado brasileiro de bezerros em Mato Grosso do Sul e São Paulo no período de 21/02/2000 a 16/11/2015. Para tanto, utilizou-se o modelo TVEC ("Threshold Vector Error Correction"), proposto por Hansen e Seo (2002). Os resultados mostram que os produtores refazem as estratégias de precificação quando defrontam com choques de preços acima 1,14% entre os mercados. Assim, os custos de transação não impedem a arbitragem eficiente entre os dois mercados. As implicações desses resultados para as estratégias de confinamentos ou invernistas são diretas, pois preços praticados nas duas praças tendem a caminhar juntos no longo prazo.
Palavras-chave: custos de transação, modelo de threshold vetorial de correção de erro, pecuária de corte

ABSTRACT:

This study aimed to evaluate the integration in the Brazilian market of calves in Mato Grosso do Sul and São Paulo in the period from February 21, 2000 to November 16, 2015. For this, we used the Threshold Vector Error Correction (TVEC) model, proposed by Hansen and Seo (2002). The results show that producers make the pricing strategies when faced with rates above 1.14% shocks between markets. Thus, transaction costs do not prevent the efficient arbitrage between the two markets. The implications of these results for the feedlots or ranchers' strategies are direct, because prices in both states tend to go together in the long run.
Key words: transaction costs, threshold vector error correction model, beef cattle

1. Introdução

A cadeia produtiva de carne bovina (CPCB) vem se destacando nos últimos anos dentro do complexo brasileiro de carnes, pela adoção de tecnologia e gestão de processos, abrangendo demandas dos mercados internos e externos, principalmente no tocante a cortes selecionados, padrões de qualidade, de certificação e de rastreabilidade.

Neste contexto, ainda a reposição dos animais no processo produtivo é tida como um dos pontos relevantes para sustentabilidade da pecuária de corte. Sabe-se que a maior parcela dos custos de produção está relacionada à aquisição de animais magros para a engorda. Assim, dependendo do comportamento dos preços durante a compra e venda de animais de reposição podem interferir nas estratégias de engorda, haja vista o aumento dos custos durante o processo de terminação dos animais. Diante disto o produtor disponibiliza no cocho alimentação de baixo custo, por consequência baixo valor nutricional para compensar a elevação dos custos de aquisição dos animais. Então, o preço do bezerro está associado ao abate de fêmeas. Ou seja, maior abate de fêmeas implica na menor oferta de bezerros, por consequência elevação nos preços do bezerro, e no ciclo futuro haverá maior retenção de fêmeas.

Não obstante, num cenário desfavorável a atividade econômica com pastagens degradadas, com problemas sanitários relacionados à exportação, arrefecimento do mercado interno diante da queda na massa salarial implica por parte de produto na estratégia de abater maior número de fêmeas com o objetivo de compensar o fluxo de caixa negativo. A possibilidade de operações de arbitragem no mercado é acompanhada pelos produtores em todas as regiões brasileiras por esses movimentos na oferta e demanda de bezerros e de vacas de descarte. Agora, espacialmente se os mercados forem integrados os choques de oferta e demanda serão transmitidos de uma região para outra inibindo os comportamentos oportunistas.

No Brasil, a maioria dos mercados agrícolas não é integrado, tendo em vista os elevados custos de transação e de transporte. Não obstante, contribuem para esse quadro negativo as diferenças estruturais na oferta e demanda que implicam em diferenças substanciais no diferencial de preços entre as regiões produtoras. Diante disto, a abordagem econômica tradicional de integração de preços usando os modelos auto-regressivos vetoriais (VAR) podem levar a erros de interpretação dos resultados, pois questões regionais que interferem na comercialização. Por não captarem esses efeitos na formação de preço induzem a se corroborar com a Lei do Preço Único (LPU), quando fatos estilizados não suportam tal hipótese.

A partir dos trabalhos de Balke e Forby (1997) e Hansen e Seo (2002) delineou-se nova agenda da pesquisa na integração e transmissão de preços entre as regiões produtoras de commodities. Por isso, diante deste problema real e falta de aderência metodológica a literatura preconiza nova classe de modelos para a análise de integração de mercado, são os modelos "Threshold Cointegration" (Serra e Goodwin, 2003; Balcombe et al., 2007).

A hipótese norteadora do estudo é duas principais regiões produtoras de bezerro, a saber, Mato Grosso do Sul e São Paulo apresentariam integração espacial somente na presença de efeitos "limiares" de preços ou efeitos de cointegração com "Threshold [4]". Essas regiões são importantes produtores e compradores e também são afetados por questões de comercialização no âmbito local e regional que interferem na formação de preços.

Fatos estilizados mostram que os choques no diferencial de preços entre as regiões devam baixos, principalmente, para induzirem os agentes econômicos refazerem suas expectativas de prefixação. Assim, nesse mercado há pouca possibilidade de arbitragem, pois o bezerro é usado no sistema de recria e engorda apresentando baixa especificidade de ativo e de incerteza, além da frequência das transações ocorrerem pela governança de mercado. Diante disto, espera-se que o parâmetro "limiar" estimado no artigo seja pequeno, pois se acredita que a rivalidade entre os numerosos agentes reduzam atuações oportunistas.

O objetivo geral do estudo foi avaliar a integração no mercado brasileiro de bezerro Mato Grosso do Sul e São Paulo no período de 21/02/2000 a 16/11/2015. Especificamente, pretende-se contribuir com o debate sobre a integração de mercado e preencher uma lacuna, no tocante ao entendimento dos interfluxos entre essas duas regiões produtoras. Os dados dos preços são diários e totalizaram 3.919 observações e foram coletados ao junto Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA) e o modelo TVEC ("Threshold Vector Error Correction") proposto por Hansen e Seo (2002) cujos parâmetros foram estimados para captar os efeitos do custo de transação sobre a integração dos preços entre as referidas praças.

O trabalho além da introdução está dividido em mais quatro seções. Na próxima apresenta-se a revisão de literatura, principalmente evidenciando o papel da integração de mercado e os custos de transação envolvidos no processo de ajustamento, além de estudos brasileiros sobre o assunto. Na terceira seção, tem-se o modelo econométrico a partir do trabalho de Hansen e Seo (2002). Na penúltima seção, apresentaram-se e discutiram-se os resultados a partir do modelo estimado, e finalmente apresentaram-se as considerações finais. 

2. Revisão de literatura

2.1. Integração de mercado

A Lei do Preço Único (LPU) regula as relações verticais e espaciais de comércio no âmbito macroeconômico. No âmbito microeconômico, os preços dos produtos dependem exclusivamente do comportamento das firmas, no tocante a escala de produção e aos custos. Por isso, os preços no mercado são importantes para balizar a alocação de recursos escassos e também a decisão do mix de produção das firmas, sinalizando a integração entre os mercados verticalmente ou horizontalmente separados.

Neste contexto, a literatura econômica deu muita relevância aos estudos sobre a integração e a transmissão de preço das commodities, principalmente, utilizando o modelo de concorrência perfeita. Para um dado choque exógeno no equilíbrio de mercado, considerando a concorrência perfeita, espera-se que os preços se ajustem instantaneamente, levando novamente ao equilíbrio.

Todavia, nem sempre os mercados são integrados e a resposta é instantânea, por exemplo, a velocidade de ajustamento pode ser diferente para a nova fixação de preços considerando, sobretudo, quando ocorreu choque positivo ou negativo. Entretanto, segundo Tardelli (2012) ao não se considerar a existência dos custos de transação não estacionários no termo de erro do modelo, isto pode invalidar a presença de cointegração, mesmo quando a situação poderia ser consistente com integração de mercado. Posto de outra forma, a cointegração também não é suficiente. Por isso, diante dos fluxos comerciais descontínuos por causa de mudanças sazonais nos padrões da oferta e demanda ou nos custos de transação, a cointegração não seria suficiente para sustentar a integração de mercado [5].

Segundo Balcombe et al. (2007) e Campenhout (2007), a integração entre mercados depende essencialmente da magnitude dos custos de transação, de tal modo que, quanto menores tais custos, mais integrados serão os mercados. Além dos custos de transação estáticos, a integração de mercados também é afetada pela velocidade de ajustamento entre o diferencial de preço entre as regiões (longo prazo), o que pode ser interpretada, em última análise, como a ocorrência de custos de transação na arbitragem intertemporal [6].

Na análise espacial, segundo Conforti (2004), podem-se elencar pelo menos seis grupos de fatores que afetam a integração entre as regiões: a) o transporte e os custos de transação; b) o poder de mercado; c) o aumento dos retornos a escala na produção; d) a homogeneidade e diferenciação de produtos; e) o regime cambial; e f) as políticas comerciais adotadas pelos tomadores de decisão. 

Ainda de acordo com Conforti (2004), todos esses fatores podem afetar tanto a relação espacial e vertical de preço. O poder de mercado, os retornos à escala a homogeneidade e a diferenciação de produtos têm sido investigadas principalmente com referência a transmissão de preços vertical, enquanto que os demais fatores têm sido amplamente usados na referência à transmissão espacial de preços.

Os custos de ajustamento são os mais relevantes no contexto espacial, em que os custos de transportar bens entre regiões ocasionam a assimetria espacial por meio do comportamento otimizador dos agentes. Essa assimetria é ocasionada e sustentada pelas estratégias dos varejistas em suprir as necessidades da demanda em vários pontos do mercado, assim, no momento de decidir quanto comprar e pagar, os consumidores consideram o custo de oportunidade de se locomover a um local mais distante ou de adquirir determinado produto em um local mais próximo, porém com um preço mais elevado (Azzam, 1999).

Todavia, segundo Heckscher (1916) citado por Meyer (2004), os custos de transferência entre os mercados espaciais limitará a transmissão de choques de preços abaixo de um nível crítico, porque os potenciais ganhos do comércio não podem prevalecer sobre estes custos e, portanto, ajustamento perfeito nos preços não ocorrerá. Assim sendo, no caso de custos de transação significativos, o ajustamento ao equilíbrio de longo prazo não será contínuo.

As implicações empíricas dos custos de transação justificam o uso de modelos com ajuste de preço TVEC [7].  Os autores citados trabalham com as análises dos preços produtos agrícolas e estes são distintos dos custos de transação definidos por Coase (1937) e que deram origem a chamada Economia dos Custos de Transação, ECT (Williamson, 1996; Barzel, 1997), uma vez que incorporam também custos logísticos e, portanto, de transformação do produto, da redação, cumprimento, monitoramento dos contratos.

Mesmo assim, os custos de transferência entre regiões captam importantes dimensões dos custos de transação, expressando, em última análise, os custos de arbitragem e, portanto, limites à LPU. Os trabalhos que utilizam a metodologia de "Threshold" conforme Goodwin e Piggott (2001), Meyer (2004), Campenhout (2007) assumem como se fosse iguais os custos de transferência aos custos de transação. Segundo Matos (2010) e Alves e Lima (2010), o custo de transação elevado e outras imperfeições de mercado frequentemente causam fraca transmissão de preços entre os mercados espacialmente separados e desvios da LPU.

A presente seção mostrou que a LPU pode ser invalidada pelos custos de transação captados pelos sistemas de preços e que estão condizentes com imperfeições de mercado e a dinâmica dos custos de transferência de deslocamento de produtos entre regiões.  Na próxima seção buscaram-se elementos na literatura brasileira entre a integração de mercado e os ditos custos de transações.  

2.2. Revisão dos estudos brasileiros de integração espacial

Conforme destacado na seção anterior a diferença de preços entre as regiões são explicados por custos de transação, que dificultam a arbitragem de preços por parte dos agentes econômicos. Assim, a possibilidade de arbitragem surge somente quando o diferencial de preço é substancial e o lucro potencial excede os chamados custos de transação entre o mercado. A rigor essa nova literatura coloca que o custo de transação elevado e outras imperfeições de mercado frequentemente causam fraca transmissão de preços entre os mercados espacialmente separados e desvios da LPU [8].

Matos et al. (2010) analisaram a integração espacial dos mercados de frango inteiro resfriado no atacado, considerando a presença de custos de transação. A hipótese que custos de transação não são desprezíveis e se fazem presentes na transmissão de choques de preços entre os mercados espacialmente separados. Não obstante, segundo esses autores há presença de barreiras à transmissão de preços entre os mercados brasileiros de frango inteiro resfriado no atacado, que provavelmente são explicados pelos custos de transação [9].

Segundo Matos et al. (2010) [10], os parâmetros estimados do TVEC consideraram a cidade de São Paulo como sendo o mercado relevante, haja vista os resultados do teste de exogeneidade fraca. Desta forma, para o primeiro "Threshold"estimado ( existem dois grupos de valores. O primeiro grupo é composto pelas praças (Descalvado-SP, Goiânia-GO, Recife-PE, Belém-PA e Belo Horizonte-MG) com os menores valores estimados em termos absolutos em relação a São Paulo-SP, ou seja, onde existem menos entraves para a arbitragem de preços. Todavia, para os autores os resultados de Descalvado (-0,01019) e Belo Horizonte (-0,03220) corroboram com distância em Km próximo a São Paulo. Agora, Belém (-0,02047) e Recife (-0,01529) a produção de carne de frango é inexpressiva mesmo diante do baixo coeficiente. Não obstante, na visão dos autores, o segundo grupo, Oeste Paranaense (- 0,12798; Litoral Catarinense (-0,11805); Ponta Grossa (-0,09899); e Porto Alegre (-0,08483), por apresentaram os maiores valores estimados, em termos absolutos estariam mais protegidos contra aumentos nos preços no mercado relevante).

Por fim, os resultados dos autores sugerem que as praças do Litoral Catarinense, Porto Alegre-RS e, principalmente, Ponta Grossa-PR e Oeste Paranaense apresentam barreiras aos choques de preço ocorridos no mercado central além daquelas impostas pelos elevados custos de transação decorrentes, sobretudo, dos custos relativos ao frete. Contribuem para tal assertiva, conforme Matos et al. (2010) a elevada produção de carne de frango nessas regiões e a menor dependência do mercado interno, haja visa a produção destinada a exportação.

Alves e Lima (2010) [11] analisaram a integração espacial dos mercados de açúcar brasileiro, considerando a presença de custos de transação. As praças de comercialização analisadas foram Alagoas, Pernambuco, São Paulo (Araçatuba e Ribeirão Preto), Paraná (Maringá) e Minas Gerais (Triângulo Mineiro), no período de maio de 2003 a dezembro de 2008. Para tanto, os autores definiram por meio do teste de Razão de Verossimilhança (LR) para exogeneidade fraca, o mercado relevante como sendo Ribeirão Preto-SP.

Autores argumentaram que os custos de transação dificultam a integração de mercado, pois eles afetam o fluxo de bens e de informações entre as regiões. Além dos custos de redigir, garantir e cumprir os contratos, também é incorporado à análise os custos de transferência, de transporte e custo de oportunidade. Assim, eles mostraram que apenas choques acima de 16,72% no preço do açúcar eram transmitidos de Ribeirão Preto para Alagoas, tendo em vista o elevado valor estimado para o parâmetro (0,1672). Em contrapartida, o menor "Threshold" se deu entre Araçatuba e Ribeirão Preto, cujo valor foi de 0,0145, indicando que choques acima de 1,45% do preço médio do açúcar em Araçatuba seriam repassados Ribeirão Preto para Araçatuba (Alves e Lima, 2009).

O mercado de açúcar do Triângulo Mineiro próximo a Ribeirão Preto teriam repasses de preços se os choques excederem 4,17% do preço médio do açúcar neste último mercado, pois o "Threshold"foi igual a 0,0417. Para as praças de Maringá e Ribeirão Preto apenas choques acima 4,37% do preço médio de açúcar em Maringá serão transmitidos entre os dois mercados ("Threshold"de 0,0437). Por fim, Pernambuco e Ribeirão Preto, apresentou valor de "Threshold"(0,0146), logo contrário ao esperado pela distância entre as regiões. 

3. Modelo econométrico

Segundo Balke e Forby (1997) a análise de cointegração não linear, se faz presente em muitos estudos empíricos, no qual os ajustes são assimétricos em torno do equilíbrio de longo prazo. A ideia é corroborada por Bakhat e Wurzburg (2013) segundo os fenômenos do mundo real, tais como as "fricções de mercado", a assimetria de informação e os custos de transação não podem ser captados pela análise tradicional de cointegração. Não obstante, isto significa que há comportamento não linear nas relações de cointegração e que o modelo tradicional não consegue explicar, pois neste se trabalha com combinações lineares que ligam as séries de preços no equilíbrio de longo prazo.

Ainda de acordo com Bakhat e Wurzburg (2013) o modelo de cointegração com "Threshold" proposto por Balke e Forby (1997) inclui o ajuste discreto em relação ao equilíbrio de longo prazo. A novidade é que a relação de cointegração entre duas variáveis ​​pode não ocorrer dentro de certo "limiar". Por isso, pode ​​não haver ajuste das variáveis aos desvios do equilíbrio. Segundo Gonzalo e Pitarakis (2006) o ajustamento só ocorre quando os desvios tornam-se grandes e excedem o parâmetro "limiar". Desta forma, a omissão de componentes não lineares, como os efeitos "Threshold" no equilíbrio de longo prazo, podem levar a erros de interpretação das relações de cointegração. Ou seja, o vetor cointegrante estimado não é o correto diante da não lineariedades das relações entre os mercados.

De acordo com Hansen e Seo (2002) o modelo de cointegração com correção de erros sob a presença de um único efeito "limiar" e dois regimes pode ser descrito:

Para Meyer e Von Cramon-Taubadel (2004) no caso do custo de ajustamento diferente de zero, a estimação do modelo de "Threshold" pode referendar a análise da transmissão assimétrica de preços. Mas, segundo os autores quantos efeitos limiares devem ser incluídos na análise e como estes podem ser testados? Como resposta, os autores afirmam que empiricamente o modelo requer a imposição de uma restrição, segunda a qual há percentual mínimo de observações que devem ser incluídas na "banda neutra" [12].

Para Hansen e Seo (2002) o teste de MLE [13] pode ser usado para verificar a hipótese nula de cointegração linear (H0) versus a cointegração "limiar" (H1). Para tanto, o teste de SupLM é obtido pelo método paramétrico de bootstrap para calcular os valores críticos assintóticos com seus respectivos p valores. Sendo o vetor de cointegrante ( desconhecido usa-se o teste abaixo:

Para a efetivação do modelo TVEC foram adotados três passos, a saber: primeiramente testou a estacionariedade dos logaritmos das séries de preços entre as regiões e também se há relação de longo prazo entre os mercados, por meio da cointegração. Para a estacionariedade utilizou-se o teste KPSS e para a cointegração o teste de Johansen (1988). Também se executou o teste de Hansen e Seo (2002) para não linearidade dos dados, no qual, a hipótese nula de cointegração linear (H0) versus a cointegração "limiar" (H1). Por fim, as estimativas do TVEC foram obtidas pela estimativa de MLE considerando número mínimo de 10% das observações em cada regime.

3.1. Fonte de dados

Os dados diários foram coletados junto ao CEPEA (2015) e compreendem o período que vai de 21/2/2000 a 16/11/2015, totalizando n= 3.919 observações. Nas estimativas dos modelos utilizou-se o logaritmo dos preços em valores nominais Bezerro em duas regiões, a saber: preço coletado no Mato Grosso do Sul, como sendo o Indicador Bezerro ESALQ/BM&FBovespa e média de preços de São Paulo. Ambos os preços refletem o comportamento do mercado spot.

4. Resultados e discussão

Na primeira etapa estimação do modelo TVEC conforme destacado anteriormente, analisou-se a estacionariedade das séries pelo teste de raiz unitária KPSS. De acordo com a Tabela 1 conclui-se que as séries de preços são estacionárias em primeira diferença.

Tabela 1 - Teste de raiz unitária KPSS para as variáveis Log(MS) e Log(SP).

Variável
I(0)
I(1)

Estatística LM (KPSS)

Estatística LM (KPSS)

Log(MS)

0,5279

0,0689

Log(SP)

0,6777

0,1046

Fonte: Resultados da pesquisa
Nota: Segundo Kwiatkowski, Phillips, Schmidt e Shin (1992) os valores críticos do teste são
para 1%=0,216; 5% = 0,1460; 10%=0,1190. Foram estimados os modelos com tendência e intercepto.

Não obstante, mesmo as séries não sendo integradas em nível essas apresentam relação de equilíbrio de longo prazo pelo Teste de Johansen (1988). Os resultados mostram que as praças são integradas ao nível de significância de 5% e que há pelo menos um vetor de cointegração ligando as séries no longo prazo O vetor de cointegração foi normalizado para o preço no Mato Grosso do Sul, sendo este significativo a 5% e tendo o valor igual a -1,035. Sendo invertido o sinal do coeficiente, este indica relação positiva entre as variáveis no equilíbrio de longo prazo. Isto significa que um aumento de 1% nos preços do Bezerro em São Paulo implica um aumento aproximado de 1,035% nos preços no Mato Grosso do Sul (Tabela 2).

A Tabela 3 evidencia o teste de não lineariedade de Hansen e Seo (2002), bem como as estimativas do modelo TVEC e do parâmetro "Threshold". O valor da estatística calculada de SupLM de 56,399 com p-valor de 0,0000 indica rejeição da hipótese nula que há cointegração linear entre os mercados, mostrando que há um componente não linear, evidenciando custos de transação entre os dois mercados envolvidos.

Tabela 2 – Teste de Johansen para vetor de cointegração (Mato Grosso do Sul e São Paulo)

Teste Traço

Teste de hipótese

Traço calculado

Valor crítico 

Ho

Ha

r = 0

r > 1

71,8995

15,4947

r ≤ 1

r > 1

0,6462

3,8414

 Teste Lmax

Teste de hipótese

Lmax calculado

Valor crítico     

Ho

Ha

r = 0

r > 1

71,2532

14,2646

r ≤ 1

r > 1

0,6462

3,8414

Fonte: Resultados da pesquisa
*Rejeição da hipótese nula a 5% de significância.
Os valores críticos teste citados por Osterwald-Lenum (1992).

Tabela 3 - Modelo TVEC para os preços do bezerro no Mato Grosso do Sul e São Paulo.

Baixo Regime

ECT

Constante

LogMS(t-1)

LogSP(t-1)

LogMS

-0,0303**

(0,0103)

-0,0003 ns

(0,2691)

0,0481 ns

(0,1129)

-0,0363 ns

(0,1544)

LogSP

0,0483 ***

(0,0000)

0,0011 ***

(0,0000)

0,0643 *

(0,0225)

-0,0903 ***

(0,0001)

"Theshold"

 = 0,0114

 

 

 

Alto Regime

LogMS

-0,0847 ***

(0,0000)

0,0015 ***

(0,0000)

0,0814 **

(0,0019)

0,0968 **

(0,0036)

LogSP

0,0696 ***

(0,0000)

-0,0003 ns

(0,1673)

-0,0285 ns

(0,2406)

0,0233 ns

(0,4506)

Vetor de cointegração

(-0,9959)

 

 

 

SupLM

p-valor

56,399

0,0000

 

 

 

Fonte: Resultados da pesquisa
Nota: * = significativo a 1%, ** = significativo a 5%; *** = significativo a 10% e
ns= não  significativo. Os valores entre parênteses são os p-value.

Conforme Tabela 3, o parâmetro estimado para o "Threshold" foi de 0,0114, ou seja, que choques acima do 1,14% entre os mercados do Bezerro entre Mato Grosso do Sul e São Paulo são transmitidos entre eles. Esse valor é considerado baixo quando comparado com outros trabalhos da literatura brasileira, mas indicam que as praças são integradas, sinalizando para a presença de baixo nível de custos de transação entre os dois mercados. Fatos estilizados corroboram com o resultado, pois dentro do ciclo pecuário a falta de animais no mercado vai depender do abate e retenção de fêmeas, ou seja, sobre a velocidade de abate de fêmeas.

Neste contexto, para maior retenção no número de fêmeas espera-se mais adiante maior oferta de bezerros, por consequência, queda nos preços. Por outro lado, quando se aumenta o abate de fêmeas haverá queda na oferta de bezerros nos períodos subsequentes do ciclo levando a redução nos preços dos animais. Nitidamente, os animais poderiam ser deslocados dentro espaço geográfico diante do ponto que cada região se encontra dentro do ciclo pecuário.

Todavia, as possibilidades de arbitragem são reduzidas, haja vista o grau de integração denotado pelo parâmetro "limiar" estimado. Ademais, a informação entre os mercados tendem a ser simétrica, pois dados zootécnicos mostram que ao final da desmama o peso do bezerro deve ser ao menos 45% do peso da mãe, ou seja, superior a 200 kg e de forma geral a reposição é de 2,2 bezerros desmamados para a venda de um de um boi gordo de 16,5 arrobas.

5. Considerações finais

De acordo com o modelo TVEC o mercado de bezerro apresenta integração entre mercados do Mato Grosso do Sul e de São Paulo, pois os resultados corroboram a validação da hipótese. Os resultados evidenciam relações não lineares entre os mercados. Todavia, essas são baixas, por conta dos baixos custos de transação entre os mercados que mostram que choque em um mercado tende a se dissipara rapidamente, afetando o outro mercado.  O mercado integrado é uma característica fundamental para a elaboração de estratégias públicas e privadas, para a avaliação de efeitos de fusões a políticas de segurança alimentar.

Os reduzidos custos de transação não impedem a arbitragem eficiente entre os dois mercados. As implicações desses resultados para as estratégias de confinamentos ou invernistas são diretas, pois preços praticados nas duas praças tendem a caminhar juntos no longo prazo. Os produtores refazem as estratégias de precificação quando defrontam com choques de preços acima 1,14% entre os mercados. 

Por fim, os agentes econômicos não interessam por choques de preços abaixo do efeito "limiar" estimado. Logo, conclui-se que para o mercado de bezerro contemplado pelos estados de Goiás e de Mato Grosso são mais integrados e apresentam baixo custo de transação.

A importância do artigo está na análise de uma metodologia relativamente nova na literatura, robusta e contemplada por poucos trabalhos no Brasil. Além disso, o bezerro é um "produto" vital para que a pecuária continue crescendo de forma satisfatória. A pecuária brasileira históricamente tem gerado importante superávit na balança comercial, graças a consolidação do Brasil como maior exportador mundial de carnes e de ser detentor do maior rebanho comercial.

Outras pesquisas podem ser conduzidas a partir dos resultados aqui obtidos, como a inclusão de outras praças que se destacam no cenário brasileiro da criação de bezerro e ainda, com a inclusão dos preços do boi gordo na análise.

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1. Professor Doutor de Economia, Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil. E-mail: cleyze@yahoo.com.br
2. Pesquisador Doutor de Economia Agrícola, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Santo Antônio de Goiás, GO, Brasil. E-mail: alcido.wander@embrapa.br

3. Professor Doutor de Economia, Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil. E-mail: netoalcan@gmail.com

4. "Threshold"em tradução literal seria efeito limiar e a literatura de integração de mercado trata como sendo custos de transação.

5. Segundo Tardelli (2012) a grande dificuldade dos trabalhos é a falta de séries de dados e dos custos de transação envolvidos no processo.

6. Segundo Dercon e Campenhout (1998) os estudos de integração entre os mercados e os custos de transação se dividem abordagens econométricos de "Threshold Autoregression Models" (TAR) e "Parity Bound Models" (PBM).

7. A vasta literatura que discute os trabalhos incorporando os modelos com "Threshold", por exemplo, ver Obstfeld e Taylor (1997), Balke e Fomby (1997), Lo e Zivot (2001), Goodwin e Piggot (2001).

8. A literatura não é homogênea sobre termologia custo de transporte e de transação. A maioria dos trabalhos assume igualdade entre as termologias, todavia destaca-se que existe uma abordagem na Nova Economia Institucional (NEI) que trata do assunto.

9. Segundo os autores citados as praças escolhidas representam 90% da produção interna de carne de frango, são elas: a) São Paulo (SP); b) Descalvado (SP); c) Porto Alegre (RS); c) Litoral Catarinense (SC), que inclui os municípios de Itajaí e Florianópolis; d) Oeste Paranaense (PR), que inclui os municípios de Toledo, Cascavel, Palotina e Medianeira, Ponta Grossa (PR); e) Belo Horizonte (MG); f) Goiânia (GO); g) Fortaleza (CE); h) Recife (PE); e i) Belém (PA).

10. Os autores utilizam modelos auto-regressivos multivariados com "Threshold"(TVAR models) conforme proposição de Lo e Zivot (2001).

11. Esses autores usaram o modelo auto-regressivo com threshold (TAR) conforme os trabalhos de Meyer (2004) e Campenhout (2007). A literatura não é homogênea sobre termologia custo de transporte e de transação. A maioria dos trabalhos assume como se for igual.

12. Segundo Meyer e Von Cramon-Taubadel (2004) surgem alguns questionamentos "What impact does this restriction have on the results of such estimation? Since price adjustment outside the neutral band is still assumed to be linear in threshold models, would it be useful to combine thresholds with other forms of non-linear adjustment?" e tem como respostas apenas: "Finally, while applications of the threshold approach are no longer rare, we are aware of no application in which the magnitudes of the estimated thresholds are interpreted in an economic sense".

13. Método de estimação por máximo verossimilhança, o autor nomeia o teste com sendo SupLM que é procedimento quasi-MLE conforme descrito no trabalho.


Vol. 37 (Nº 13) Año 2016

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