Espacios. Vol. 37 (Nº 14) Año 2016. Pág. 12

Bolsa Familía: Avaliação do impacto do programa sobre a pobreza no Brasil

Bolsa Familía: Program impact assessment on poverty in Brazil

André Luiz Marques SERRANO 1; Rosita Soares Pereira COSTA 2; Marcelo Driemeyer WILBERT 3; Carlos Rosano PEÑA 4; Luiz Medeiros de ARAUJO NETO 5

Recibido: 03/02/16 • Aprobado: 05/03/2016


Contenido

1. Introdução

2 Referencial teórico

3 Método

4 Resultados

5 Conclusão

Referências


RESUMO:

O presente artigo tem como meta avaliar o impacto do Programa Bolsa Família (PBF) sobre a redução da pobreza no Brasil no período de 2004 a 2012. Este trabalho parte da hipótese de que o PBF teve influência na redução da pobreza no Brasil no período analisado. Além do PBF, foram incluídas no modelo outras variáveis, tais como crescimento econômico, emprego, analfabetismo, domicílios com saneamento adequado e com energia elétrica, taxa de homicídios e mortalidade infantil, para diminuir distorções que possam afetar o modelo. A amostra foi selecionada a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), do período de 2004 a 2012, e constitui-se de um total de 3.700 municípios. Assim, foi estimado o efeito do PBF sobre a pobreza do Brasil com base na elaboração de um modelo econométrico. Os resultados indicam que o Programa Bolsa Família tem relação inversa com a pobreza, entretanto, o coeficiente da variação no valor de benefícios do PBF não é significativo para explicar as variações da pobreza no período considerado.
Palavras-chave: Pobreza. Transferência de Renda. Programa Bolsa Família.

ABSTRACT:

This article aims to assess the impact of the Bolsa Família Program (PBF) on poverty reduction in Brazil from 2004 to 2012. This work starts from the assumption that the PBF had influence on poverty reduction in Brazil during the study period . In addition to the PBF, they were included in the model other variables such as economic growth, employment, illiteracy, households with adequate sanitation and electricity, homicide rate and infant mortality, to reduce distortions that may affect the model. The sample was selected from data from the National Household Sample Survey (PNAD), the 2004-2012 period, and consists of a total of 3,700 municipalities. Thus, we estimated the effect of PBF on poverty in Brazil based on the development of an econometric model. The results indicate that the Bolsa Família Program has an inverse relationship with poverty, however, the coefficient of variation in GMP benefits value is not significant in explaining poverty variations over the period.
Keywords: Poverty. Income transfer. Family Grant program.

1. Introdução

Observa-se como tendência mundial, em especial nos países em desenvolvimento como o Brasil, nítido aumento das ações e políticas sociais, assim como uma preocupação com a avaliação dos programas implantados. A criação dessa cultura inscreve-se no quadro do desenvolvimento e fortalecimento da ação pública, com dois objetivos principais: oferecer subsídios para melhoria da eficiência e eficácia da administração desses programas; e oferecer respostas à sociedade sobre a efetividade social das políticas implantadas, num processo de accountability.

Os anos 1970 inauguram o início de uma ruptura importante com o modelo econômico que, por meio do Welfare State e da política keynesiana, orientava as políticas públicas dos países economicamente hegemônicos. A oferta de bens e serviços pelo Estado e o reconhecimento de direitos sociais, marcados pelo cunho da universalidade, começaram a ser questionados por instâncias internacionais que participam ativamente da redefinição dessa nova economia mundial e da reconfiguração das políticas públicas sociais e educacionais a elas subordinadas: Banco Mundial, FMI, OMS, OCDE, BID etc. No caso do Brasil, os programas de transferências de renda focalizadas nos mais pobres iniciam-se na década de setenta, porém, nessa época essas ações tinham pouca visibilidade e cobertura limitada, atendendo apenas idosos e portadores de necessidades especiais que não tinham renda suficiente para garantir seus meios de sobrevivência (ROCHA, 2011).

Na década de 1980 a tendência à redução do papel do Estado e à descentralização das suas atribuições, à privatização dos serviços públicos, à desregulamentação dos mercados e a flexibilização dos meios e agentes de produção impostas pela globalização da economia modificaram profundamente as relações entre Estado e sociedade. Desta forma, verificou-se uma ampliação do debate sobre assistência a famílias pobres e miseráveis e a concessão de benefícios concebida pontualmente e de forma indireta, geralmente com a distribuição de cestas básicas em áreas carentes, principalmente nas regiões norte e nordeste.

A partir da década de 90 ocorre um aprimoramento na elaboração de políticas de combate à pobreza, com o surgimento de programas governamentais de transferências de renda para famílias economicamente vulneráveis. A ideia se dá com o aperfeiçoamento de um programa de transferência de renda para famílias pobres com crianças em idade escolar, o Bolsa Escola, implantado primeiramente no município de Campinas e no Distrito Federal.

No início do século XXI, as políticas de transferência de renda condicionadas ganharam relevância na agenda nacional e no ano de 2003, o Brasil já possuía um conjunto de programas sociais que beneficiavam aproximadamente cinco milhões de famílias, através de programas como o Bolsa Escola, o Auxílio Gás,  o Bolsa Alimentação e o Programa Nacional de Acesso à Alimentação, cada um desses, geridos por administrações burocráticas diferentes. A criação do Programa Bolsa Família consistiu na unificação e ampliação desses programas num único programa social, com cadastro e administração centralizados no Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, o que, segundo o Banco Mundial, proporciona sua eficiência administrativa e de fiscalização.

A unificação de tais programas ampliou significativamente o público alvo atendido, elevando os recursos a ele destinados e instituindo novas regras, como: universalização da elegibilidade do benefício para todas as famílias de baixa renda; elevação do teto da renda familiar per capita para fins de elegibilidade, que deixou de ser atrelado ao salário mínimo; mudança na forma de estabelecimento do valor do benefício, que passou a ser variável, conforme a renda e a composição da família.

Os programas brasileiros de transferência direta de renda à população de baixa renda são importantes porque sem eles dificilmente a erradicação da pobreza e a redução da desigualdade a níveis toleráveis serão possíveis dentro de um horizonte de tempo razoável. Mesmo sem ter uma longa história e sem atingir toda a população elegível, eles têm tido o condão de aliviar ou sanar a pobreza de milhões de brasileiros. Embora esses programas seguramente não constituam uma solução única e permanente para os problemas sociais do país, não há dúvida de que devem fazer parte de qualquer proposta séria de promoção de uma sociedade mais justa (SOARES et al., 2006).

Considerando o elevado nível de desigualdade de renda e pobreza ainda existente no Brasil, a importância de programas de transferência de renda para a redução desses níveis e ainda, e que o Programa Bolsa Família é hoje o principal programa de transferência direta de renda no âmbito do governo federal, esse estudo se propõe a responder o seguinte questionamento: Qual o impacto do Programa Bolsa Família sobre a redução da pobreza no Brasil no período de 2004 a 2012?

Portanto, este artigo tem como objetivo geral avaliar o impacto do Programa Bolsa Família sobre a redução da pobreza no Brasil, no período de 2004 a 2012, a partir da avaliação de como o principal programa de transferência de renda do país, com dimensão nacional e inegável relevância política, está influenciando a diminuição da pobreza no Brasil.

Para tanto, a presente pesquisa encontra-se dividida em cinco seções, incluindo esta introdução. A segunda seção discute a questão da Pobreza, além dos Programas de Transferência de Renda e seus antecedentes, para finalmente definir e fundamentar a existência do Programa Bolsa Família no Brasil, com o objetivo de descrever de que maneira esse programa de transferência de renda pode influenciar a redução da pobreza brasileira. A terceira seção apresenta a metodologia utilizada e a base de dados. A quarta seção discute os resultados empíricos obtidos e a última seção é dedicada às principais conclusões.

2. Referencial teórico

As primeiras pesquisas sobre a pobreza (séculos XIX e XX) fundamentavam-se na definição associada à ideia de subsistência, ou seja, ter acesso às necessidades nutricionais mínimas, suficientes para a manutenção e a sobrevivência do indivíduo e da sua família, abordando a pobreza de forma unidimensional. Porém, desde os anos 70, estudiosos encontram formas alternativas de analisá-la, e ainda hoje, não há uma definição consensual sobre o que é a pobreza, suas causas e seu tamanho e dificilmente haverá, por se tratar de uma teia que envolve múltiplas questões: sociais, econômicas, culturais, políticas e morais. Percebe-se, no entanto, uma tendência para uma definição mais abrangente e multidimensional da pobreza (OLIVEIRA e STRASSBURG, 2014).

Sen (2000) tem uma visão multidimensional da pobreza, definindo-a como privação de capacidades, destacando que esta deve ser vista como privação das liberdades substantivas e não somente como baixo nível de renda, o que não indica que uma das principais causas da pobreza não seja a renda baixa, mas que existem outras causas da privação das capacidades de uma pessoa. Uma renda insuficiente gera uma vida pobre, no entanto, a renda é apenas um instrumento para o aumento das capacidades básicas, ou seja, um meio e não um fim. A relação instrumental entre baixa renda e baixa capacidade é variável entre comunidades, famílias e indivíduos. O impacto da renda sobre as capacidades é incerto e condicional e isto dever ser levado em conta quando se analisa a ação pública para reduzir a pobreza e a desigualdade porque a relação entre a renda e a capacidade seria muito afetada pela idade da pessoa, pela localização, pelas condições epidemiológicas e por outras variáveis sobre as quais não se tem controle.

A linha de pobreza é utilizada como indicador para distinguir a população total em pobres e não pobres, todavia, não existe um consenso na literatura quanto ao método de construção de linhas de pobreza. Alguns autores usam como referência os gastos para o consumo diário das calorias mínimas necessárias (aproximadamente 2000/2500 quilocalorias), definindo a linha de indigência ou pobreza extrema e acrescentando o conjunto de outras necessidades básicas (habitação, vestuário, higiene, saúde, educação, transporte, lazer, etc.) para estimar a linha de pobreza moderada, enquanto outros pesquisadores, para simplificar, adotam o critério do salário mínimo ou um de seus múltiplos. O Banco Mundial segue o critério de 1 dólar por dia para definir a pobreza extrema e para a pobreza moderada entre 1 e 2 dólares diários, convertidos pela paridade do poder de compra (PENA et al., 2014).

De acordo com o MDS, atualmente o critério do PBF determina a extrema pobreza como viver com até R$ 77 de renda familiar por pessoa por mês, e a pobreza entre R$ 77 e R$ 154. A linha de extrema pobreza do PBF foi estimada pelo IPEA com base no valor de uma cesta de alimentos com o mínimo de calorias necessárias para suprir adequadamente uma pessoa, segundo recomendações da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) e da Organização Mundial da Saúde (OMS). A linha de pobreza aqui considerada é o dobro da linha de extrema pobreza (PENA et al., 2014).

Contudo, do ponto de vista científico, essa pluralidade de medições de pobreza não precisa ser motivo de preocupação, desde que as medições sejam corretas e haja transparência quanto às metodologias adotadas. No Programa Bolsa Família, a linha de extrema pobreza é usada para delimitar o patamar de elegibilidade para concessão do benefício básico e é referência para cálculo da complementação de renda feita pelo benefício de superação da extrema pobreza. O PBF não definiu um critério de reajuste periódico dessas linhas, porém, dada a necessidade de atualização do poder de compra das famílias beneficiárias, houve em junho de 2014, o último reajuste verificado, que teve como referencial os US$ 1,25 PPC, ajustado pelo fator de conversão para consumo doméstico do Banco Mundial, proporcionando comparabilidade internacional aos resultados brasileiros na superação da extrema pobreza (FALCÃO E COSTA, 2014).

Sen (2000) definiu as "fomes coletivas" como uma forma de privação de liberdade, pois negam às pessoas a liberdade básica de sobreviver. Além dessa, existem outras formas de privação como a falta de serviços de saúde, educação, saneamento básico e água tratada, além de desemprego, analfabetismo etc. A liberdade é um começo e um meio do desenvolvimento, por isso o desenvolvimento deve estar relacionado com a melhoria tanto da vida das pessoas quanto das liberdades que estas desfrutam. Não se deve ter uma visão restrita identificando o desenvolvimento apenas como o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), aumento da renda per capita, industrialização, avanço tecnológico ou modernização, mesmo que esses fatores sejam importantes como meios de expandir as liberdades, pois essas são essencialmente determinadas pela saúde, pela educação e pelos direitos civis.

Um dos principais efeitos esperados do Programa Bolsa Família é a redução da pobreza, que pode ocorrer de três formas diferentes, a primeira ocorre quando parte dos pobres deixa de ser pobre, a segunda quando a renda média dos pobres remanescentes se eleva, e a terceira, quando a desigualdade entre eles diminui. Das três, a primeira é a mais relevante, por fazer a sociedade caminhar rumo à erradicação da pobreza, enquanto as demais apenas aliviam a pobreza, tornando-a menos dura para os que nela permanecem. O indicador que capta esta redução – ignorando as outras – é a taxa de pobreza, a razão entre o número de pobres e a população total.

O índice de Sen foi utilizado nos trabalhos de Hoffmann (2006), Teixeira et al. (2008), nos estudos de Ottonelli et al. (2012) e Marinho et al. (2011). Marinho et al. (2011) controlaram também o viés causado pela presença de variáveis endógenas no lado direito da regressão, e encontraram que a variável representativa das transferências de renda deveria ser considerada fracamente exógena em relação ao termo de erro.

A partir dos anos 90, o Brasil se vê diante de uma nova realidade evidenciada pela rápida abertura aos capitais e ao comércio internacional. Nesse contexto, o Estado brasileiro, que ano após ano tornou-se cada vez mais inchado, viu-se obrigado a promover reformas para aliviarem seu peso e diminuir sua presença no setor produtivo, direcionando-se para o segmento mais importante de sua área de atuação: a sociedade civil. Partindo desta premissa, o Governo Federal lançou, em meados da última década do século passado, uma ampla reforma na máquina estatal.

Os programas de transferência de renda escolheram as famílias pobres com crianças e adolescentes como a categoria-alvo do combate à pobreza atual e futura. Tratava-se de um investimento em recursos humanos na tentativa de integrar a população jovem e pobre nas redes públicas de educação. Os programas tinham como objetivo, assim, a redução das desigualdades de oportunidades pela ampliação dos anos de escolaridade (SANT'ANA, 2007).

Impulsionado por uma nova maneira de enxergar o Estado Brasileiro e com base nos novos preceitos constitucionais, o Governo Federal, nos últimos anos, desenvolveu uma série de programas que buscam a erradicação da pobreza, a redução das desigualdades e a promoção do bem-estar social. Os principais foram:

a) Programa Bolsa Escola, instituído em 2001 pela Lei 10.219 e regulamentado pelo Decreto 4.313, o programa nacional de renda mínima vinculada à educação, constituiu o instrumento de participação financeira da União em programas municipais de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas;

b) Programa Nacional de Renda Mínima vinculada à Saúde (Bolsa Alimentação), instituído em 2001 pela Medida Provisória 2.206-1 e regulamentado pelo Decreto 3.934, destinava-se à promoção das condições de saúde e nutrição de gestantes, nutrizes e crianças de seis meses a seis anos e onze meses de idade, mediante a complementação da renda familiar para melhoria da alimentação;

c) Programa Auxílio-Gás, criado em 2001 pelo Decreto 4.102, destinado a subsidiar o preço do gás liquefeito de petróleo às famílias de baixa renda, teve a validade dos benefícios concedidos encerrada em 31 de dezembro de 2008, através do Decreto 6.392;

d) Programa Nacional de Acesso à Alimentação (PNAA), criado em 2003 pela Lei 10.689, vinculado às ações dirigidas ao combate à fome e à promoção da segurança alimentar e nutricional;

e) Programa Bolsa Família, criado para o desenvolvimento de ações articuladas e intersetoriais buscando racionalizar o uso dos recursos federais, unificou os Programas Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, PNAA e Auxílio-Gás.

O Programa Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda que tem por objetivo beneficiar famílias em situação de pobreza, extrema pobreza e em situação de vulnerabilidade social em todo país e integra o Plano Brasil Sem Miséria. O Programa Bolsa Família (PBF) foi criado pela Medida Provisória nº 132, de 20 de outubro de 2003, que posteriormente foi convertida na Lei 10.836, de 09 de janeiro de 2004 e regulamentado pelo Decreto nº 5.209 de 17 de setembro de 2004.

O PBF é resultante de um processo de unificação de quatro programas de transferência de renda (Bolsa Escola, Bolsa-Alimentação, Programa Nacional de Acesso à Alimentação e Auxílio-Gás). O argumento a favor da junção fundamentava-se na concepção de que o combate à pobreza e à exclusão de forma unificada tenderia à melhoria da gestão e do aumento da efetividade do gasto social. Nessa linha, o programa introduziu as seguintes  inovações nos programas de transferência de renda do governo federal: passou a proteger a família inteira, em vez de apenas o indivíduo; aumentou o valor dos benefícios pagos; simplificou a gestão de todos os programas em um só; exigiu maior compromisso das famílias atendidas; e potencializou as ações de governo, articulando União, Estados e Municípios (CAVALCANTE, 2009).

O Programa Bolsa Família tem uma vertente emergencial (transferência direta de renda aos beneficiários e acompanhamento básico de saúde) e uma vertente de longo prazo (educação infanto-juvenil). Apesar disso, se não for fortalecido por outras ações, terá ainda um resultado limitado, uma vez que a questão da pobreza no Brasil passa por diversos outros aspectos como: desemprego massivo, problemas de reconhecimento social, dificuldades de criar e manter um ensino gratuito de qualidade, carências de infraestrutura que interferem no saneamento básico e na saúde, etc (SANT'ANA, 2007).

O PBF tem como objetivos a redução da pobreza e desigualdade atuais, fornecendo transferências em dinheiro para as famílias que atendam os critérios do programa e a redução da pobreza e desigualdade futuras, promovendo incentivos ao investimento em capital humano das famílias beneficiárias, possibilitando que essas famílias abandonem a situação de pobreza e não precisem mais do benefício para viver (ROMERO e HERMETO, 2009).

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2014, a projeção da população brasileira era de mais de 203 milhões de pessoas e de acordo o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), 88 milhões de brasileiros estavam inscritos no CadÚnico sendo que desses, aproximadamente 49 milhões eram beneficiários do Programa Bolsa Família, ou seja, pouco menos de 25% da população brasileira foi beneficiária do PBF nesse ano.

Conforme dados extraídos do DATASOCIAL, base de dados do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), em 2014, o Programa Bolsa Família beneficiou mais de 14 milhões de famílias brasileiras repassando um valor médio mensal de R$ 169,03 por família que totalizou um valor repassado de mais de R$ 27 bilhões.

Analisando o período de 2004 a 2014, por meio do Gráfico 2, nota-se que a quantidade de famílias beneficiadas pelo PBF cresceu em todos os anos desde 2004, com exceção de 2008 e 2014, quando o número de famílias beneficiadas sofreu uma pequena queda.

O Programa Bolsa Família (PBF) foi formulado a partir da articulação intersetorial de ministérios das áreas social e econômica, sob a coordenação da Casa Civil e da Assessoria da Presidência da República. Após um breve período na Presidência, a gestão do programa foi repassada para o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Nessa pasta, a Secretaria Nacional de Renda de Cidadania (SENARC) é a responsável pela coordenação, gestão e operacionalização do programa (CAVALCANTE, 2009).

A gestão do programa é descentralizada e compartilhada entre a União, estados, Distrito Federal e municípios. A seleção das famílias para o Bolsa Família é feita com base nas informações registradas pelos municípios no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), instrumento de coleta e gestão de dados que tem como objetivo identificar as famílias de baixa renda existentes no Brasil. Com base nesses dados, o MDS seleciona, de forma automatizada, as famílias que serão incluídas para receber o benefício, que é pago pela CEF. Esta seleção é feita a partir das cotas de benefícios municipais, previamente estabelecidas com base no número de pobres que o município possui. Já o cadastramento das famílias no CadÚnico não depende das cotas municipais (TAVARES et al., 2009).

A seleção dos domicílios beneficiários no PBF é realizada sob a égide do MDS, da Caixa Econômica Federal (CEF) e dos municípios. A SENARC (MDS), entre outras importantes ações, estabelece os critérios de seleção dos beneficiários, ou seja, de quem recebe e de quanto recebe, assim como define também o questionário do Cadastro Único e os critérios para suspensão e corte dos benefícios, entre várias outras definições de parâmetros operacionais. O papel da CEF no PBF é bastante significativo pois, além de ser o órgão operador e pagador, é também o órgão responsável por processar as informações que compõem o Cadastro Único, levantadas pelos municípios, calcular a renda domiciliar per capita (RDPC) e quanto deve receber cada família, e pagar, através do cartão magnético, o benefício mensalmente. Já com relação aos municípios, a função mais importante é a de identificar as famílias que deverão ser beneficiadas, através do recolhimento das informações que compõem o cadastro (BARBOSA E CORSEUIL, 2013).

Em última instância, são os agentes municipais que decidem quem será ou não potencial beneficiário, na medida em que toda a informação que a Caixa processa ou a SENARC analisa é por eles coletada, ou seja, sem municípios empenhados e bem geridos, o funcionamento do PBF estaria comprometido (SOARES E SÁTYRO, 2009).

Uma outra atribuição dos municípios é manter atualizados os dados das famílias quanto ao cumprimento das condicionalidades e para isto, os gestores municipais recebem apoio técnico e capacitação dos Ministérios da Educação (MEC) e da Saúde (MS), que consolidam as informações sobre a frequência escolar e o acompanhamento médico respectivamente. O não cumprimento das contrapartidas pelas famílias pode ocasionar advertência, bloqueio e até a suspensão do benefício e seu posterior cancelamento, na quinta ocorrência de descumprimento (TAVARES et al., 2009).

A Lei que cria o PBF define como conceito de família e renda familiar mensal:

I - família, a unidade nuclear, eventualmente ampliada por outros indivíduos que com ela possuam laços de parentesco ou de afinidade, que forme um grupo doméstico, vivendo sob o mesmo teto e que se mantém pela contribuição de seus membros;

III – renda familiar mensal, a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pela totalidade dos membros da família, excluindo-se os rendimentos concedidos por programas oficiais de transferência de renda, nos termos do regulamento (BRASIL, 2004).

Sendo assim, o Programa Bolsa Família é considerado um programa de transferência direta de renda com condicionalidades, que atende famílias pobres, ou seja, aquelas com renda mensal per capita entre R$ 77,01 e R$ 154 e extremamente pobres, aquelas com renda mensal per capita de até R$ 77 (valores atualizados pela quinta e última vez em junho de 2014).  Desta forma, o programa possui vários tipos de benefícios, que variam em valores e que são utilizados para compor a parcela mensal que cada família beneficiária recebe. O valor final do benefício depende do perfil da família registrado no CadÚnico. Entre as informações consideradas, estão: a renda mensal por pessoa, o número de integrantes, o total de crianças e adolescentes de até 17 anos, além da existência de gestantes e nutrizes.

Os benefícios abaixo especificados foram estabelecidos pela lei 10.836 de 9 de janeiro de 2004 e a última atualização dos valores foi feita através do decreto 8.232 de 1º de maio de 2014: a) Benefício Básico (BB) de R$ 77, concedido apenas às famílias em situação de extrema pobreza (renda mensal per capita menor ou igual a R$ 77,00), mesmo quando não há crianças, adolescentes ou jovens; b) Benefício Variável (BV) à criança ou adolescente de R$ 35, concedido às famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, com crianças ou adolescentes de 0 a 15 anos de idade, com pagamento mensal no valor de R$ 35 por criança ou adolescente na família; c) Benefício Variável (BV) à Gestante de R$ 35, concedido às famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, que tenham gestantes em sua composição, com pagamento de nove parcelas consecutivas, a contar da data do início do pagamento do benefício, desde que a gestação tenha sido identificada até o nono mês. A identificação da gravidez é realizada no Sistema Bolsa Família na Saúde já que o CadÚnico não permite identificar as gestantes; d) Benefício Variável (BV) à Nutriz de R$ 35, concedido às famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, que tenham crianças com idade entre 0 e 6 meses em sua composição, com pagamento de seis parcelas mensais consecutivas, a contar da data do início do pagamento do benefício, desde que a criança tenha sido identificada no CadÚnico até o sexto mês de vida.

Os benefícios variáveis acima descritos eram limitados a três por família, porém, a partir de junho de 2011, através da MP 535, convertida posteriormente na Lei 12.512, esse limite foi ampliado para cinco por família, desde que todos os integrantes da família estejam registrados no CadÚnico.

e) Benefício Variável Vinculado ao Adolescente (BVVA) de R$ 42, criado posteriormente, em dezembro de 2007, pela MP 411, é concedido às famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, que tenham adolescentes entre 16 e 17 anos, porém limitado a dois benefícios por família, pagos regularmente até o mês de dezembro do ano de aniversário de 18 anos do adolescente;

f) Benefício para Superação da Extrema Pobreza (BSEP), calculado caso a caso, é transferido às famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família que continuem em situação de extrema pobreza (renda mensal per capita de até R$ 77), mesmo após o recebimento dos outros benefícios. Ele é calculado para garantir que as famílias ultrapassem o limite de renda da extrema pobreza. O pagamento do BSEP passou por três fases: a primeira começou no mês de maio de 2012 com a MP 570 para famílias com crianças de até seis anos. Em novembro de 2012, através da MP 590, o BSEP passou a atender famílias com crianças e adolescentes de até 15 anos. E em fevereiro de 2013, o Decreto 7.931 ampliou a cobertura para todas as famílias beneficiárias do PBF que mesmo recebendo outros benefícios do programa permaneçam em situação de extrema pobreza.

O recebimento dos benefícios é condicionado ao cumprimento das seguintes contrapartidas comportamentais nas áreas de saúde e educação: realização de exames pré-natal para as gestantes; acompanhamento médico periódico para atualização de vacinas e manutenção de peso e altura adequados para crianças de 0 a 6 anos; matrícula regular e frequência escolar mínima de 85% para as crianças de 7 a 15 anos e de 75% para os adolescentes de 16 a 17 anos.

De acordo com Medeiros, Brito e Soares (2007), a exigência de condicionalidades, contrapartidas ou co-responsabilidades das famílias, tem os seguintes objetivos: incentivar as famílias a realizar investimentos em capital humano, mesmo que essas exigências já sejam feitas pela lei e moralmente cobradas pela sociedade; incentivar a demanda por serviços sociais como saúde e educação, além de ampliar o acesso da população mais pobre a direitos sociais básicos, incentivando expansões e melhorias na oferta desses serviços.

A seguir o quadro 3 demonstra exemplos de valores de benefícios pagos às famílias pertencentes ao PBF, a depender da situação e composição de cada uma delas, e compara a situação entre os anos 2004 e 2014.

QUADRO 1 – Valores dos benefícios do PBF

Ano

Critério de Elegibilidade

BB

Ocorrência de gestantes, nutrizes e crianças/      adolescentes de 0 à 15 anos

BV

Ocorrência de adolescentes de 16 à 17 anos

BVVA

Ocorrência de pessoas na família

BSEP*

Benefício Total

Situação das famílias

Renda familiar mensal per capita

2004

Pobreza

Entre R$ 50 e R$ 100

R$ 0

1 membro

R$ 15

1 membro

R$ 0

2 membros

R$ 0

R$ 15

2 membros

R$ 0

3 membros

R$ 0

R$ 0

2 membros

R$ 30

1 membro

R$ 0

3 membros

R$ 0

R$ 30

2 membros

R$ 0

4 membros

R$ 0

R$ 0

3 membros

R$ 45

1 membro

R$ 0

4 membros

R$ 0

R$ 45

2 membros

R$ 0

5 membros

R$ 0

Extrema Pobreza

Até R$ 50

R$ 50

1 membro

R$ 15

1 membro

R$ 0

2 membros

R$ 0

R$ 65

2 membros

R$ 0

3 membros

R$ 0

R$ 50

2 membros

R$ 30

1 membro

R$ 0

3 membros

R$ 0

R$ 80

2 membros

R$ 0

4 membros

R$ 0

R$ 50

3 membros

R$ 45

1 membro

R$ 0

4 membros

R$ 0

R$ 95

2 membros

R$ 0

5 membros

R$ 0

2014

Pobreza

Entre R$ 77 e R$ 154

R$ 0

1 membro

R$ 35

1 membro

R$ 42

2 membros

R$ 0

R$ 77

2 membros

R$ 84

3 membros

R$ 0

R$ 119

R$ 0

2 membros

R$ 70

1 membro

R$ 42

3 membros

R$ 0

R$ 112

2 membros

R$ 84

4 membros

R$ 0

R$ 154

R$ 0

3 membros

R$ 105

1 membro

R$ 42

4 membros

R$ 0

R$ 147

2 membros

R$ 84

5 membros

R$ 0

R$ 189

R$ 0

4 membros

R$ 140

1 membro

R$ 42

5 membros

R$ 0

R$ 182

2 membros

R$ 84

6 membros

R$ 0

R$ 224

R$ 0

5 membros

R$ 175

1 membro

R$ 42

6 membros

R$ 0

R$ 217

2 membros

R$ 84

7 membros

R$ 0

R$ 259

Extrema Pobreza

Até R$ 77

R$ 77

1 membro

R$ 35

1 membro

R$ 42

2 membros

R$ 0

R$ 154

2 membros

R$ 84

3 membros

R$ 35

R$ 231

R$ 77

2 membros

R$ 70

1 membro

R$ 42

3 membros

R$ 42

R$ 231

2 membros

R$ 84

4 membros

R$ 77

R$ 308

R$ 77

3 membros

R$ 105

1 membro

R$ 42

4 membros

R$ 84

R$ 308

2 membros

R$ 84

5 membros

R$ 119

R$ 385

R$ 77

4 membros

R$ 140

1 membro

R$ 42

5 membros

R$ 126

R$ 385

2 membros

R$ 84

6 membros

R$ 161

R$ 462

R$ 77

5 membros

R$ 175

1 membro

R$ 42

6 membros

R$ 168

R$ 462

2 membros

R$ 84

7 membros

R$ 203

R$ 539

Fonte: Elaboração própria

*No intuito de simplificar os cálculos, os valores do benefício para superação da extrema pobreza foram calculados considerando que as famílias beneficiárias não tivessem nenhuma outra renda além da renda do programa bolsa família, caso contrário os valores do BSEP seriam menores ou chegariam a não existir dependendo do valor das outras rendas. Para exemplificar segue abaixo um cálculo de benefício para uma família de três pessoas, com um adolescente de 15 anos e renda mensal per capita, antes dos benefícios, de R$ 20,00:

Ao entrar no PBF, esta família recebe o benefício básico, no valor de R$ 77,00, e um benefício variável, no valor de R$ 35,00, totalizando R$ 112,00, portanto, a renda per capita que antes era de R$ 20,00, agora passa a ser de R$ 57,33 (R$ 20,00 + R$ 37,33 (R$ 112,00/3)). Porém, como essa ampliação ainda não possibilita a saída da família da situação de extrema pobreza, o BSEP deve ser calculado considerando a diferença entre R$ 77,01 (valor que ultrapassa a linha da extrema pobreza) e R$ 57,33 por pessoa, ou seja, R$ 19,68 por pessoa, que multiplicado por três, totaliza R$ 59,04 para a família. Considerando que este benefício é calculado em intervalo cujo valor seja múltiplo de R$ 2,00, o valor do BSEP será arredondado para R$ 60,00 e o valor total do benefício do PBF será de R$ 172,00 e não mais R$ 112,00, elevando a renda per capita mensal da família para R$ 77,33.

Atualmente uma família que não tenha nenhuma renda e que pela sua composição tenha o direito de receber o máximo dos benefícios acima citados deveria receber o valor de R$ 336,00, sendo R$ 77,00 do benefício básico, R$ 175,00 referente a cinco benefícios variáveis de R$ 35,00 cada e R$ 84,00 de dois benefícios variáveis vinculados ao adolescente de R$ 42,00 cada. Porém, como para receber os sete benefícios variáveis acima, a família deve ser formada por pelo menos sete pessoas e os R$ 336,00 divididos por sete não alcançam os R$ 77,00 de renda por pessoa, nesse caso haveria ainda um benefício para superação da extrema pobreza no valor de R$ 203,00, ou seja, essa família de sete pessoas receberia um benefício total de R$ 539,00 por mês.

Os valores dos benefícios, assim como os valores de renda per capita que definem a situação das famílias, foram atualizados com o tempo, conforme o quadro 4 abaixo:

QUADRO 2 – Atualização dos valores do PBF

Legislação

RDPC Máxima – Pobreza

RDPC Máxima - Extrema Pobreza

BB

BV

BVVA

MP 132/2003

R$ 100

R$ 50

R$ 50

R$ 15

-

Decreto 5.749/2006

R$ 120

R$ 60

R$ 50

R$ 15

-

Decreto 6.157/2007

R$ 120

R$ 60

R$ 58

R$ 18

-

MP 411/2007

R$ 120

R$ 60

R$ 58

R$ 18

R$ 30

Decreto 6.491/2008

R$ 120

R$ 60

R$ 62

R$ 20

R$ 30

Decreto 6.824/2009

R$ 137

R$ 69

R$ 62

R$ 20

R$ 30

Decreto 6.917/2009

R$ 140

R$ 70

R$ 68

R$ 22

R$ 33

Decreto 7.447/2011

R$ 140

R$ 70

R$ 70

R$ 32

R$ 38

Decreto 8.232/2014

R$ 154

R$ 77

R$ 77

R$ 35

R$ 42

Fonte: Elaboração própria

Além de entender que os valores recebidos pelas famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família podem variar, é importante saber que o CadÚnico é um banco de dados mais amplo que dá acesso a outros programas e políticas sociais do Governo Federal, como o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – PRONATEC,  a Tarifa Social de Energia, o Minha Casa, Minha Vida, a Carteira do Idoso e o Programa Cisternas e não apenas ao PBF. Assim, nem todas as famílias cadastradas são beneficiárias do Bolsa Família (IBGE, 2013).

O Cadastro Único fornece informações completas sobre cada uma das famílias registradas, atualizadas no máximo a cada dois anos, permitindo saber quem são, onde moram, o perfil educacional de cada um dos seus membros, seu perfil de trabalho e renda, as principais despesas, as características da construção dos domicílios, se há acesso a serviços como os de eletricidade, saneamento e coleta de lixo, se a família faz parte de grupos tradicionais ou específicos, se há situações de trabalho infantil, entre outras informações. Os dados são coletados e atualizados pela rede do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) nos municípios, a mesma que realiza o trabalho socioassistencial junto às famílias. Isso faz do Cadastro Único um instrumento que possibilita o acompanhamento das famílias extremamente pobres de maneira próxima, individualizada e a qualquer tempo (FALCÃO E COSTA, 2014).

  . Os benefícios do Programa Bolsa Família são pagos mensalmente, por meio de cartão magnético bancário fornecido pela Caixa Econômica Federal, com a Identificação Social – NIS, de uso do Governo Federal, e preferencialmente à mulher (BRASIL, 2004).

  . De acordo com Moreira et al. (2012), o PBF pode ocasionar diminuição das desigualdades de gênero, bem como efeitos no empoderamento e na autonomia feminina, uma vez que as transferências concedem à mulher a responsabilidade de garantir a melhor aplicação dos recursos e o controle no atendimento às condicionalidades, exigidas para a manutenção do benefício.

A escolha das mulheres para serem as responsáveis legais e "recebedoras" do benefício do PBF tem como base a ideia de buscar uma igualdade entre homens e mulheres, tendo em vista a redução da dependência econômica das mulheres, assim como aumentar a possibilidade de que as crianças recebam o benefício e tenham mais estabilidade (SANT'ANA, 2007).

3. Método

O método utilizado nesta dissertação parte da elaboração de um modelo econométrico para explicar a variação da pobreza nos municípios brasileiros no período entre 2004 e 2012. Em um modelo econométrico parte-se do princípio que as regiões influenciam-se mutuamente, de forma que não se pode considerar que somente características exógenas expliquem o comportamento da variável dependente, mas também deve-se levar em consideração os valores assumidos nas regiões vizinhas, por esta variável dependente e pelas características exógenas observadas.

Com vistas a estimar o efeito do Programa Bolsa Família sobre a pobreza do Brasil, foi elaborado um painel de dados cuja amostra é de 3.700 municípios brasileiros. Não foi possível explicar totalmente o que influencia a pobreza de todos os indivíduos. De acordo com a literatura, verifica-se que a pobreza pode ser influenciada por fatores objetivos e subjetivos. As medidas objetivas como taxa de emprego, educação, recebimento de transferências de renda, insegurança e acesso a serviços básicos, podem ser levadas em consideração por serem indicadores concretos, que podem ser representados numericamente. Por outro lado, são definidos os fatores subjetivos que influenciam a noção de pobreza de cada indivíduo, o que na concepção de funcionamento proposta por Sen (1992) incluiriam fatores como possuir autorrespeito e ser capaz de participar da vida da comunidade, por exemplo. O indivíduo poderia se considerar pobre por não ter como viver do modo que valoriza, e o que cada um valoriza varia de região para região, dependendo de aspectos religiosos, da idade, da raça, etc.

Sendo assim, define-se que a pobreza em seu aspecto multidimensional só poderia ser totalmente mensurada com base em informações colhidas diretamente de cada indivíduo o que, levaria a uma medida de pobreza individual, não necessariamente representativa da pobreza da população. Por isso, optou-se pelo método de efeitos fixos, que permite controlar os componentes não observados, além de eliminar o viés das variáveis observáveis relevantes omitidas, que não variam com o transcorrer do tempo de análise.

Com intuito de atingir o objetivo principal desta dissertação, que é medir o efeito causal do Programa Bolsa Família (PBF) sobre a pobreza (P), o modelo empírico com dados em diferenças, e efeitos não observados, pode ser especificado como:

  1. Omissão da variável relevante correlacionada com log PBF e X. Este problema é solucionado nesta dissertação por meio das variáveis de controle: X = [CRESC, ANALF, SANEA, ENERG, CRIME, EMP, MORT, N, S, NE, CO, WP, WlogPBF, WCRESC, WSANEA, WENERG]. Dentro do conjunto de variáveis explicativas consta a WP, a defasagem espacial da variável dependente. Esta variável está correlacionada com o termo de erro aleatório, por conta da endogeneidade espacial. Esse problema é tratado utilizando-se as defasagens espaciais das variáveis explicativas como instrumento para a defasagem espacial da variável dependente (neste caso, a WP).
  2. Características não observadas dos municípios da amostra. O método de efeitos fixos é baseado na hipótese de que as características não observadas idiossincráticas dos municípios estão correlacionadas com as variáveis explicativas. Para remover os efeitos fixos, foi utilizado o método das Primeiras Diferenças como o componente não observável e constante, α, que desaparece nas primeiras diferenças. Na diferenciação, perde-se um período e, neste caso, passa-se a ter uma cross section (WOOLDRIDGE, 2011). Todos os modelos foram estimados com os dados em primeiras diferenças.
  3. Dependência espacial. Tal como o problema da existência dos efeitos fixos, a dependência espacial tem o potencial de enviesar as estimativas quando não tratada. Neste estudo a dependência espacial é tratada por meio da estimação de modelos que consideram as defasagens espaciais das variáveis e do termo de erro.
  4. Endogeneidade da variável logPBF. Nas regiões brasileiras onde o índice de pobreza é elevado, o governo teria uma tendência de expandir o Programa Bolsa Família, ofuscando assim o efeito causal do mesmo sobre a pobreza. Nesse caso, haveria causalidade simultânea entre PBF e pobreza, com o PBF reduzindo a pobreza e a pobreza aumentando o PBF. A solução adotada é usar um instrumento para logPBF. O instrumento escolhido foi o público alvo potencial do PBF, ou seja, a proporção da população jovem (ate 18 anos) sobre a população total da região (variável JOVEM). Este instrumento é adequado, pois atende as duas condições necessárias para validade de um instrumento, que são:

a) propriedade de relevância - elevada correlação entre logPBF e JOVEM, ou seja, Corr (JOVEM, logPBF) ≠ 0;

b) propriedade da exogeneidade - correlação nula entre JOVEM e ο termo de erro, ou seja, Corr (JOVEM, ε) = 0.

A proporção de jovens sobre a população total não depende da decisão do Governo Federal, que procura expandir o PBF nas regiões de maior pobreza e não nas regiões com maior população jovem (publico alvo potencial do programa). Portanto, JOVEM não está correlacionado com o termo de erro da regressão.

O que se propõe aqui é a adoção do procedimento de especificação geral do modelo econométrico-espacial:

  1. Estima-se o modelo por MQO, sem nenhuma defasagem espacial, mas com os efeitos fixos removidos;
  2. Os resíduos são checados para a presença de dependência espacial;
  3. Caso haja evidências de auto-correlação espacial, estimam-se os modelos SAR, SEM, SAC, SDM, SDEM e SLX. O melhor modelo será aquele que não apresentar evidências de auto-correlação espacial em seus resíduos e apresentar melhor qualidade do ajuste da regressão, medida nesta dissertação pelo pseudo-R², que é a correlação ao quadrado entre os valores ajustados pelo modelo e os valores observados.

3.1. Dados

Com vistas à definição do cálculo da pobreza, primeiramente estabeleceu-se o critério para a linha de pobreza. Neste estudo a linha de pobreza adotada se baseia na linha de renda considerada para enquadramento no Programa Bolsa Família. Para mensurar a pobreza, a medida escolhida foi o índice de pobreza definido por Sen (1974). A construção do índice de Sen (P) depende do cálculo da proporção de pessoas pobres em relação à população total (H), da intensidade de pobreza (I) e do coeficiente de Gini da renda das pessoas situadas abaixo da linha de pobreza (Gp).

Após o cálculo da proporção de pessoas pobres, foi construída a variável H, que representa a variação da proporção de pobres entre os dois anos a definir. A intensidade da pobreza representa a defasagem da renda per capita dos pobres em relação à linha de pobreza. Foi calculada a renda média das pessoas pobres para cada município e, então, a distância em relação à linha de pobreza adotada para cada ano. A variável I é a diferença da intensidade da pobreza entre 2012 e 2004. A desigualdade de renda entre as pessoas pobres, variável Gp, também foi calculada a partir dos microdados do IBGE 2004 e 2012. Consiste na fórmula usual do Coeficiente de Gini, abrangendo apenas as pessoas cuja renda domiciliar per capita situa-se abaixo da linha de pobreza.

Visto que alguns estudos apontam maiores efeitos de programas de transferência de renda sobre a indigência (SOARES et al., 2010), foi definido também um Índice de Sen considerando apenas as pessoas abaixo da linha de indigência para testar tal hipótese (P_ind).  Para o cálculo do índice de indigência, foram calculados a defasagem da renda per capita dos indigentes em relação à linha de indigência (I_ind) e o coeficiente de Gini entre as pessoas indigentes (Gind).

Para medir o efeito do Programa Bolsa Família sobre a pobreza e a indigência dos municípios brasileiros, foi utilizada a variável (PBF) que considera o valor total dos benefícios pagos no ano em relação à população total do município. A fonte dos dados é o Ministério do Desenvolvimento Social. Como o objetivo principal do Programa é reduzir a pobreza no Brasil, assim, espera-se sinal negativo para o coeficiente da variável representativa do PBF.

Além da transferência direta de renda, que visa o alívio imediato da pobreza, o PBF atua ainda por meio das condicionalidades, que reforçam o acesso a direitos sociais básicos nas áreas de educação, saúde e assistência social; e dos programas complementares, que tem o intuito de promover oportunidades e condições para superar a pobreza de forma sustentável.

Embora o enquadramento das famílias no PBF seja feito segundo um critério unidimensional de pobreza (renda), as condicionalidades e os programas complementares atuam no aspecto multidimensional da pobreza, o que esta de acordo com a abordagem proposta por Sen (1992; 2000).

Para captar o efeito do crescimento econômico sobre a pobreza, foi incluída a variável CRESC, variação do PIB per capita entre 2012 e 2004. O crescimento econômico pode aliviar a pobreza por intermédio da expansão das oportunidades de emprego, do aumento do salário real pago aos trabalhadores e da melhoria nos padrões de vida. Assim, espera-se que uma elevação no crescimento do PIB per capita reflita em redução da pobreza.

Para medir o impacto do emprego sobre a pobreza, foi construída a variável EMP, com base nos dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), representando o percentual de trabalhadores com vínculo formal sobre o total de habitantes do município. O emprego proporciona renda aos indivíduos e pode reduzir as privações dos mesmos, por isso, espera-se sinal negativo para o coeficiente dessa variável.

A variável ANALF representa a taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais de idade, com base nos dados da PNAD e procura captar a influência da educação sobre a pobreza. O analfabetismo limita as capacidades de funcionamento dos indivíduos. Por isso, espera-se sinal positivo para o coeficiente dessa variável: quanto maior a taxa de analfabetismo, maior deve ser a pobreza. A teoria do crescimento endógeno propõe um modelo em que o capital humano de cada trabalhador depende apenas de seus anos de estudo, e à medida que o indivíduo adquire capital humano, sua habilidade para adquirir capital humano adicional aumenta. A educação desenvolve habilidades e conhecimentos, amplia a produtividade e, consequentemente, eleva o nível salarial, ou seja, a educação aumenta a probabilidade de sucesso econômico das crianças, ou pelo menos amplia o horizonte de opções para escolhas futuras.

A variável SANEA considera a proporção de domicílios particulares permanentes com saneamento adequado, com base nos dados da PNAD. Pelo conceito do IBGE, é tomado como adequado o domicílio com rede geral de abastecimento de água, rede geral de esgoto e coleta de lixo. Para medir a qualidade habitacional, além da variável representativa do saneamento, foi inserida a variável ENERG, percentual de pessoas que vivem em domicílios com energia elétrica, com base nos dados da PNAD. De acordo com a constituição de 1988, o acesso à energia elétrica é considerado um serviço público essencial. A falta de saneamento adequado ou de acesso à energia elétrica caracteriza a pobreza por privação de serviços essenciais. Espera-se sinal negativo para o coeficiente dessas variáveis.

O impacto da insegurança sobre a pobreza foi levantado por meio da utilização da taxa de homicídios por 100 mil habitantes, representada pela variável CRIME. Os dados originais são provenientes do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Departamento de Informática do SUS (DATASUS). A carência de segurança também é uma forma de pobreza, sendo assim, quanto maior a insegurança, maior deve ser a pobreza.

A variável MORT representa a variação da taxa de mortalidade infantil, sendo calculada como o número de óbitos de menores de um ano em relação ao total de nascidos vivos. Os dados para o cálculo foram obtidos no DATASUS, para os anos de 2004 e 2012. Essa variável é uma medida de qualidade de saúde, refletindo o funcionamento de estar livre de mortes prematuras (SEN, 1992). Os dados referentes à mortalidade podem ser utilizados para avaliar os programas de saúde e assistência social adotados e identificar aspectos vitais da privação econômica na sociedade (SEN, 1993). Espera-se relação positiva entre a mortalidade infantil e a medida de pobreza.

4. Resultados

A Tabela 1 (parte 1) apresenta os resultados dos modelos estimados para captar o efeito dos benefícios do Programa Bolsa Família sobre a pobreza entre os anos de 2004 e 2012. Na primeira coluna estão as estimações por MQO utilizando dados agrupados (POLS). Em seguida é apresentada a estimação por MQO após a remoção dos efeitos fixos (PD). Nota-se que a estimação com dados agrupados (POLS) indica que o PBF teria impacto positivo sobre a pobreza. Entretanto, quando os efeitos fixos são removidos o sinal do coeficiente da variável representativa do PBF se altera, deixando de ser significativo.

Na Tabela 1 (parte 2), foram apresentados os resultados do modelo SDM (HAC e END) que indicaram que, após o controle dos efeitos fixos, da dependência espacial, da heterocedasticidade e da endogeneidade, a variação no valor dos benefícios do Programa Bolsa Família foi importante para retirar as pessoas da situação de indigência. Porém, o coeficiente continua apresentando um valor muito pequeno: um aumento em 1% no valor do benefício provoca uma redução de apenas 0,00039% na indigência.

Percebe-se ainda que os coeficientes das variáveis MORT, EMP, SANEA e ENERG, deixam de ser significativos para explicar a pobreza. Há alteração também nos coeficientes das variáveis dummy incluídas para as regiões Norte e Centro-Oeste, confirmando a importância do controle dos efeitos fixos.

Pelos testes de Koenker-Basset e White, há indicação de heterocedasticidade. Não há evidência de problemas de multicolinearidade no modelo. Entretanto, há sinais de que os erros estejam auto-correlacionados espacialmente tanto pelo multiplicador de Moran quanto pelos multiplicadores de Lagrange, que são estatisticamente significativos. O teste de Multiplicador de Lagrange (ML) da defasagem espacial apresenta maiores valores que o teste na versão do erro, indicando que o melhor modelo deveria considerar a defasagem espacial. Como o processo de identificação apontou auto-correlação espacial, tanto no modelo com dados agrupados (POLS), quanto no modelo após a remoção de efeitos fixos (PD), se a estimação for feita por MQO, o estimador será enviesado e inconsistente.

Em seguida foram estimados os modelos SAR, SEM, SAC, SDM, SDEM e SLX a fim de controlar os efeitos fixos em conjunto com o controle da dependência espacial. Em todos os modelos estimados, os testes nos resíduos indicaram a persistência da dependência espacial e da heterocedasticidade. Para tratar a heterocedasticidade, os modelos foram novamente estimados com a utilização dos estimadores HAC e KP-HET.

O estimador KP-HET corrige a heterocedasticidade e o estimador HAC corrige a heterocedasticidade e a dependência espacial em conjunto. Mesmo tratando a heterocedasticidade, a dependência espacial permaneceu nos modelos SEM, SAC e SDEM, indicando que esta não era induzida pela heterocedasticidade. Assim, apenas os modelos SAR e SDM não apresentaram evidências de auto-correlação espacial, dado que o estimador HAC elimina a auto-correlação e a heterocedasticidade.

Tabela 1 – Resultados Econométricos

Parte 1

Parte 2 - Efeito Fixo

POLS

PD

SDM(HAC)

SDM(END)

POLS

PD

SDM(HAC)

SDM(END)

CONSTANTE

0,08950***

-0,01243***

-0,00321

0,0001219

0.0789***

(-0.25689)***

-0,00042

0.0583**

(+0.00324)

(+0.00143)

(+0.00256)

(+0.00135)

(+0.00324)

(+0.00123)

(+0.00125)

(+0.00436)

LogPBF

0,01940***

-0,00368

-0,0046

-0,00294

0,0164***

0,00368

-0,0075

(-0,00039)**

(+0.00144)

(+0.00343)

(+0.00273)

(+0.0031)

(+0.00104)

(+0.00173)

(+0.00213)

(+0.0011)

CRESC

0,00003

0,00007

-0,00006

-0,00010***

0.00008***

0,00006

-0,00005

-0,00010***

(+0.00003)

(+0.00005)

(+0.00007)

(+0.00008)

(+0.00002)

(+0.00004)

(+0.00007)

(+0.00004)

ANALF

0,00360***

0,00280***

0,00247***

0,00213***

0,00168***

0,00188***

0,00110***

0,00070***

(+0.00008)

(+0.00037)

(+0.00007)

(+0.00029)

(+0.00006)

(+0.00015)

(+0.00027)

(+0.00030)

SANEA

-0,00031***

0,00002

0,00008*

0,00011**

(-0,00022)***

0,00004

0,00005*

0,00001**

(+0.00002)

(+0.00003)

(+0.00005)

(+0.00005)

(+0.00001)

(+0.00002)

(+0.00001)

(+0.00003)

ENERG

-0,00068***

-0,000064

0,00009

0,00019

(-0,00077)***

(-0,00047)***

(-0,00007)

0,00013

0,00003

0,00004

0,00014

0,00013

0,00002

0,00004

0,00009

0,0001

CRIME

-0,00032***

-0,00008*

-0,00009

-0,00003

(-0,00017)***

(-0,00002)

0,00001

0,00002

(+0.00001)

(+0.00002)

(+0.00002)

(+0.00002)

(+0.00001)

(+0.00001)

(+0.00001)

(+0.00001)

EMP

-0,00033**

-0,00001

0,00006

0,00008

(-0,00011)***

-0,00002

0,00004

0,00006

(+0.00004)

(+0.00008)

(+0.00006)

(+0.00007)

(+0.00004)

(+0.00005)

(+0.00003)

(+0.00008)

MORT

0,00001***

0,00001

0,00001

0,00001

0,00001***

0,00001

0,00001

0,00001

(+0.00001)

(+0.00001)

(+0.00001)

(+0.00001)

(+0.00001)

(+0.00001)

(+0.00001)

(+0.00001)

N

-0,00425**

0,01679***

0,00932***

0,00473**

(-0,00082)**

0,01119***

0,00722***

0,0173**

(+0.0016)

(+0.00205)

(+0.00323)

(+0.00218)

(+0.00122)

(+0.00105)

(+0.00243)

(+0.00528)

S

-0,00455**

-0,00001

-0,00074

-0,00078

(-0,00155)

0,0005

-0,00024

(-0.00378)*

(+0.00114)

(+0.00134)

(+0.00172)

(+0.00091)

(+0.00018)

(+0.00114)

(+0.00122)

(+0.00191)

NE

-0,00552***

-0,00647**

-0,000237

0,00238

(-0,00442)*

(-0,01647)***

(-0.00247)

0.01035*

(+0.00132)

(+0.00144)

(+0.00267)

(+0.00173)

(+0.00032)

(+0.00144)

(+0.00254)

(+0.00173)

CO

-0,02750***

0,007815***

0,00457***

0,00272*

-0,02750***

0,007815***

0,00457***

0,00572*

(+0.00155)

(+0.00186)

(+0.00164)

(+0.00112)

(+0.00155)

(+0.00186)

(+0.00164)

(+0.00112)

W_P

0,56857***

0,87985***

0,50057***

0,60085***

(+0.09312)

(+0.05655)

(+0.09300)

(+0.09234)

W_LogPBF

0,00354

(+0.00371)

W_CRESC

0,00006*

0,00002

0,00004***

0,00002

(+0.00004)

(+0.00004)

(+0.00002)

(+0.00004)

W_SANEA

-0,00003***

-0,00007*

-0,00003***

-0,00007*

(+0.00004)

(+0.00004)

(+0.00004)

(+0.00004)

W_ENERG

-0,00032***

-0,00015

(-0,00002)

(-0.00001)

(+0.00003)

(+0.00009)

(+0.00003)

(+0.00009)

0,6560

0,0989

0,1675

0,1553

0,632

0,1857

0,24048

0,18321

DepEspacial

Sim

Sim

Não

Não

Sim

Sim

Não

Não

Hausman(p-valor)

0,0000***

0

Fonte: Elaboração Própria a partir de dados da pesquisa.
Notas: ***, ** e * representam nível de significância respectivamente de 99%, 95% e 90%.

O modelo que apresentou o melhor grau de ajustamento, medido pelo pseudo- R² foi o modelo espacial SDM. Este modelo mostrou que a variável dependente nas regiões vizinhas apresenta interação, assim, a variação da pobreza em um município influencia e é influenciada pela variação da pobreza no município vizinho. Os resultados deste modelo são apresentados na coluna SDM (HAC). Após tratar os efeitos fixos, a dependência espacial e a heterocedasticidade, o último passo foi tratar a endogeneidade.

O instrumento utilizado para a variável PBF foi o percentual de jovens (com idade até 18 anos) em relação à população total. O teste de Durbin-Wu-Hausman confirmou a hipótese de que há endogeneidade entre PBF e a pobreza (P). A estatística F do primeiro estágio da estimação indica que o instrumento é válido. Ao se controlar a endogeneidade, o coeficiente da variável CRESC que não era significativo no modelo SDM (HAC) passa a ser, ao passo que o coeficiente da variável dummy para o Nordeste muda de sinal, reforçando a importância dos controles adotados nesta dissertação.

Os resultados do modelo com controle dos efeitos fixos, dependência espacial, heterocedasticidade e endogeneidade, representado na Tabela 1 como SDM (HAC e END), indicam que o Programa Bolsa Família tem relação inversa com a pobreza, entretanto, o coeficiente da variação no valor dos benefícios do PBF não é significativo para explicar as variações da pobreza no período considerado.

A relação não significativa encontrada entre o Programa Bolsa Família e pobreza pode ser explicada pelo fato de o PBF adotar uma linha máxima de renda muito baixa para seleção dos beneficiários, deixando de beneficiar muitas famílias que, de fato, vivem em situação de pobreza. Além disso, os valores dos benefícios são baixos, oferecendo poucas possibilidades de superação da pobreza. Outra explicação seria a de que o PBF não é acompanhado de ações que alterem a forma da reprodução e da distribuição da riqueza.

A elevação da intensidade da pobreza é mais um indicativo de que os benefícios não tem sido suficientes para que as famílias superem a linha de pobreza. Quando a variável de interesse é alterada para a indigência, os resultados indicam que, após o controle da dependência espacial, heterocedasticidade e das características não observadas (modelo SDM HAC), o Programa Bolsa Família não teve o efeito de reduzir a indigência, uma vez que o coeficiente encontrado não é significativo.

5. Conclusão

O PBF, ao unificar, em 2003, todos os benefícios sociais existentes no governo federal em um único programa, conseguiu reduzir burocracias, criando mais facilidade no controle dos recursos e trazendo mais transparência ao programa. Porém, o PBF, sozinho, não conseguiu garantir a autonomia dos indivíduos, que mesmo recebendo o benefício, continuam incapazes de superar alguns problemas relacionados à saúde, moradia, trabalho, entre outros que afligem a população mais vulnerável, o que demonstra que, para cumprir o seu objetivo, o programa precisa ser conduzido em conjunto com outras ações.

O presente estudo procurou investigar o impacto do Programa Bolsa Família sobre a redução da pobreza no Brasil no período de 2004 a 2012. Para isso elaborou-se um modelo econométrico e um painel de dados de 3.700 municípios brasileiros, não sendo possível explicar o que influencia a pobreza de todos os brasileiros, optando-se pelo método de efeitos fixos. A estimação com dados agrupados (POLS) indicou que o PBF teria impacto positivo sobre a pobreza, entretanto, ao se remover os efeitos fixos, o sinal do coeficiente da variável representativa do PBF se alterou, deixando de ser significativo.

Os resultados do modelo com controle dos efeitos fixos, dependência espacial, heterocedasticidade e endogeneidade, representado na Tabela 1 como SDM (HAC e END), indicam que o Programa Bolsa Família tem relação inversa com a pobreza, entretanto, o coeficiente da variação no valor de benefícios do PBF não é significativo para explicar as variações da pobreza no período considerado.

A relação não significativa encontrada entre o Programa Bolsa Família e pobreza pode ser explicada pelo fato de o PBF adotar uma linha máxima de renda muito baixa para seleção dos beneficiários, deixando de beneficiar muitas famílias que, de fato, vivem em situação de pobreza. Além disso, os valores dos benefícios são baixos, oferecendo poucas possibilidades de superação da pobreza. Outra explicação seria a de que o PBF não é acompanhado de ações que alterem a forma da reprodução e da distribuição da riqueza.

A elevação da intensidade da pobreza é mais um indicativo de que os benefícios não tem sido suficientes para que as famílias superem a linha de pobreza. Quando a variável de interesse é alterada para a indigência, os resultados indicam que, após o controle da dependência espacial, heterocedasticidade e das características não observadas (modelo SDM (HAC)), o Programa Bolsa Família não teve o efeito de reduzir a indigência, uma vez que o coeficiente encontrado não é significativo.

Sendo assim, os resultados encontrados indicam que o Programa Bolsa família não teve influência significativa para redução da pobreza e da indigência nos municípios brasileiros para o período considerado. Uma possível explicação para o resultado não significativo sobre a pobreza e a indigência é o fato de o programa adotar uma linha máxima de renda muito baixa para seleção dos beneficiários, deixando de fato de beneficiar famílias que vivem em situação alta de vulnerabilidade social, além disso, os valores dos benefícios são muito baixos, oferecendo poucas condições para os indivíduos ultrapassarem a linha de pobreza.

A transferência de renda ocasionada pelo PBF pode permitir que muitas famílias beneficiárias melhorem suas condições de vida, através de alimentação e moradias mais adequadas, aquisição de bens de consumo, entre outros aspectos, porém, apenas a transferência de renda não é suficiente para a realização de uma mudança efetiva nas condições e no modo de vida das famílias que dela necessitam.

A exigência das condicionalidades do PBF é considerada um ponto positivo do programa, porém entende-se que deve haver uma maior preocupação com a qualidade dos serviços de saúde, educação e assistência social oferecidos. Sendo assim, considera-se importante que sejam feitos estudos que abordem os programas complementares, com intuito de superação da pobreza, como aqueles que oferecem treinamentos e capacitações aos indivíduos para sua integração ao mercado de trabalho.

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1. Universidade de Brasília – UnB – Brasil. E-mail: andrelms.unb@gmail.com
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3. Universidade de Brasília – UnB – Brasil. E-mail: marcelodw@unb.br

4. Universidade de Brasília – UnB – Brasil. E-mail: gmcrosano@gmail.com

5. Universidade de Brasília – UnB – Brasil. E-mail: medeiros2002@hotmail.com


Vol. 37 (Nº 14) Año 2016

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