Espacios. Vol. 37 (Nº 17) Año 2016. Pág. 3

A gestão da propriedade intelectual em ambiente de inovação aberta

The management of intellectual property in an open innovation environment

Herlandí de Souza ANDRADE 1; Ligia Maria Soto URBINA 2; Jeffeson GOMES 3; Andrea de Oliveira Netto FOLLADOR 4; Vanessa Cristhina Gatto CHIMENDES 5

Recibido: 22/02/16 • Aprobado: 21/03/2016


Conteúdo

1. Introdução

2. Gestão da propriedade intelectual em um contexto de inovação aberta

3. A aplicação dos conceitos de inovação aberta no Centro de Competência em Manufatura do ITA

4. Considerações Finais

Referências


RESUMO:

Este trabalho aborda questões relativas à gestão da Propriedade Intelectual (PI) resultante da Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em ambiente de inovação aberta, ou seja, aquelas resultantes da interação entre as Instituições Científicas e Tecnológicas (ICT) com as empresas. Inovação aberta é um modelo no qual uma organização utiliza fontes externas em seus processos de inovação. O modelo de inovação aberta difere do modelo fechado por viabilizar o sucesso da organização não apenas com ideias originadas dentro das fronteiras da organização, mas também vinculado as ideias vindas de fora. Quando se trata de P&D em ambiente de inovação aberta, onde a colaboração é intensa, a divisão da PI não é uma tarefa fácil, por isso, é importante realizar uma adequada gestão, para permitir a apropriação das tecnologias criadas. Para desenvolver o trabalho foi realizada uma pesquisa-ação no Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT) do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial e um estudo de caso no Centro de Competência em Manufatura do Instituto Tecnológico de Aeronáutica. Com esta pesquisa foi possível propor ao NIT o desenvolvimento de um processo para a busca de tecnologias criadas nas ICT e não apropriadas, dando ao NIT maior proatividade e aproximando-o das equipes de P&D da ICT.
Palavras-chave: inovação aberta, pesquisa e desenvolvimento, propriedade intelectual, proteção de tecnologias, núcleo de inovação tecnológica.

ABSTRACT:

This task approaches issues related to the management of Intellectual Property (IP) as a result of the Research and Development (R&D) in an Open Innovation (OI) environment, which means the ones resulting from interaction among Scientific and Technological Institutions (STI) with companies. The OI model is different from the closed model because it encourages the success of the organization, not just with ideas came from inside of the organization, but, also, with the ones that are outside. When the subject is R&D in an OI environment, where there is an intense cooperation, the IP division is not an easy work, that´s why it is important to have an effective management, then, it will be allowed to get the new technologies. In order to develop this task, an action-research was done in the Technological Licensing Office (TLO) from the Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial, and a case study in the Instituto Tecnológico de Aeronáutica, both organization in Brazil. With this research, it was possible to suggest to TLO the development of a process to search technologies created at STI and not suitable, giving the TLO better proactivity and getting it close to the R&D teams in STI.
Key words: open innovation, research and development, intellectual property, technology protection, technological licensing office.

1. Introdução

O desenvolvimento da ciência e da tecnologia é de fundamental importância para a resolução de problemas apresentados pelas nações, pois "a ciência busca explorar fronteiras desconhecidas através da curiosidade, disciplina e criatividade para preencher o espaço aberto e as necessidades da sociedade" (Chimendes, 2011, p. 219; 223). Para a autora, a pesquisa cientifica faz parte da cultura de uma nação, que considera, sobretudo, a necessidade de aprender a utilizar o conhecimento, e enfoca que "caso contrário, o desejo de modernização e de aumento da competitividade da nação ficará simplesmente na retórica".

Neste sentido, Zaninelli (2012), Vitoreli (2010), Guidelli e Bresciani (2008), Lopes (2008), Tigre (2006), Canongia, Santos, Zackiewicz (2004) e Schumpeter (1939) afirmam que a inovação tecnológica consiste em uma ferramenta essencial para mover a economia, aumentar a produtividade, a competitividade e as vantagens sustentáveis das organizações, garantindo assim a sua sobrevivência em um mercado que se encontra em constante mudança, assim como para alavancar o desenvolvimento econômico de países ou regiões.

Com o objetivo de promover a inovação tecnológica, atualmente, no Brasil, estão sendo realizados esforços, que incluem incentivos fiscais, financiamentos de projetos e interações entre o setor público e privado, além do desenvolvimento de mecanismos legais que permitam a transferência de tecnologia, e por consequência, o desenvolvimento econômico. Luengo e Obeso (2013), Anttiroiko (2009) e Etzkowitz e Leydesdorff (1997) enfatizam que um elemento essencial para o desenvolvimento econômico é o relacionamento entre empresas, Instituições Científicas e Tecnológicas (ICT) e governo, o qual se daria por meio de uma abordagem denominada tríplice hélice, que é direcionada para políticas de inovação, que incluem as questões relativas à Propriedade Intelectual (PI). Na tríplice hélice, para Lemos (2008), as ICT contribuem com a geração do conhecimento científico e a formação de recursos humanos. As empresas transformam os conhecimentos em bens para a sociedade, gerando, por meio das necessidades do processo produtivo, novas demandas científicas. A interação entre ICT e empresa permite a criação de um círculo virtuoso de troca de conhecimento científico e tecnológico, capaz de gerar o desenvolvimento socioeconômico. O governo é o responsável pela regulamentação, fiscalização e elaboração de políticas de apoio à interação entre esses atores. Gunasekara (2006) indica que nessa abordagem a ICT é um importante elo para o desenvolvimento econômico, pois envolve a geração e a capitalização do conhecimento, o que inclui as tecnologias.

O objetivo deste trabalho é descrever sobre a interação entre as ICT e as empresas, tomando como base as atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), em um contexto de inovação aberta, e, de forma particular, considera as questões relativas à gestão da PI, realizada por um Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT).

Para o desenvolvimento deste trabalho, foi realizada uma pesquisa-ação no Núcleo de Inovação Tecnológica do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (NIT/DCTA), sendo complementado por um estudo de caso no Centro de Competência em Manufatura (CCM), do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), que consiste em um ambiente multidisciplinar que desenvolve pesquisas e soluções voltadas para o desenvolvimento da indústria.

No contexto da inovação aberta, Chimendes (2011) relata que é muito importante e estratégico aumentar o número de pesquisadores nas empresas, como preconiza a Lei da Inovação, no entanto, segundo a autora o relatório da UNESCO sobre ciência, de 2010, mostra que no Brasil apenas 38% dos pesquisadores estão no setor privado, isto é, 1,30 pesquisadores para cada mil componentes da força de trabalho, contra 5,53 na Espanha e 9,17 na Coréia do Sul. Neste mesmo sentido, Vieira, Santos e Pereira (2006) descrevem que grandes empresas enfrentam dificuldades para sustentar o desenvolvimento de inovações. Isso decorre dos elevados custos e riscos de desenvolvimento. Esses dois aspectos descritos, apenas como exemplos, reforçam ainda mais a necessidade da interação ICT-Empresa. Esta interação, no que diz respeito às atividades de P&D, é uma questão considerada como relevante no Brasil, já que, as atividades inovadoras possuem características diferenciadas, que exige cada vez mais, a colaboração entre diferentes grupos de especialistas e que são sempre cercadas de grande incerteza em relação aos seus resultados comerciais. Também é considerada relevante, pois, conforme Chimendes (2011), traduzir os resultados da produção científica em inovações tecnológicas gera riqueza para a sociedade e para a nação.

2. Gestão da propriedade intelectual em um contexto de inovação aberta

Considerando as questões sobre inovação aberta, que incluem e interação ICT-Empresa, é de fundamental importância que o sistema de PI constitua um marco referencial para as transações que envolvam compartilhamento da informação e do conhecimento, assim como a conjugação de esforços para gerar a inovação. O sistema de PI, é, portanto, o pilar que sustenta o próprio processo de inovação aberta, de maneira a construir e a manter um ambiente favorável à inovação que ofereça informação e conhecimento, promova e proteja os investimentos.

Para Amadei e Torkomian (2009), o fortalecimento das políticas relacionadas à PI em uma ICT impacta diretamente as atividades de proteção das tecnologias, ao mesmo tempo que viabiliza a transferência das tecnologias para o setor produtivo. Ainda, tomando por base Bérard (2014), Toledo et. al. (2011) e Tigre e Marques (2009), o sistema de PI é um mecanismo legal que busca garantir a proteção da tecnologia, a inovação e, por consequência, o desenvolvimento econômico, diante dos riscos e dificuldades enfrentados pelos inovadores, como descrito anteriormente.

A Lei 10.973, denominada como Lei da Inovação, conforme Brasil (2004), requer que as ICT disponham de NIT, para gerir as políticas de inovação, que incluem as questões relativas à PI. Considerando Najmaei (2014), Santos e Torkomian (2013) e Tigre e Marques (2009), para fazer uma gestão estratégia da PI de forma a promover a inovação, que é um importante instrumento de estímulo à inovação tecnológica, é necessário realizar uma interpretação cuidadosa e abrangente do ambiente onde a organização e a tecnologia irão atuar.

Assim, em um ambiente de inovação aberta, que conforme Chesbrough et. al. (2006), a interação ICT-empresa é constante e faz uso intencional dos fluxos internos e externos de conhecimento para acelerar os processos de geração de tecnologia, o NIT deveria ter uma atuação mais próxima aos pesquisadores e a outras pessoas que atuam neste ambiente, para potencializar a proteção e a promoção da transferência das tecnologias de uso dual ali desenvolvidas.

Dervitsiotis (2010) e Laursen e Salter (2006) relatam que em um cenário de economia global a maioria das organizações estão prestando cada vez mais atenção em novas tecnologias com potencial para a inovação, visto que a inovação é considerada como o motor essencial da competitividade.

A Lei 10.973, conforme Brasil (2004), indica que inovação é a introdução de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo ou social que resulte em novos produtos, processos ou serviços. Ainda, o Manual de Oslo, de acordo com OCDE (2004), indica que inovação é a implementação de um bem ou serviço novo ou significativamente melhorado, ou um processo ou um novo método de marketing, ou um novo método organizacional nas práticas de negócios, na organização, no local de trabalho ou nas relações externas, sendo que a inovação pode ocorrer dentro da empresa ou pode envolver a aquisição de bens, serviços ou conhecimento de fontes externas. Nesse mesmo contexto, Freeman (1982) cita que a inovação se trata de um termo que vem do latim innovare, que significa fazer algo novo, e o processo da inovação se dá ao tornar oportunidades em novas ideias, colocando estas em prática.

Para Corder e Salles-Filho (2004), a inovação, entendida em seu sentido mais amplo, contempla várias etapas que vão desde as atividades de P&D até a comercialização, e que se processam nas mais diversas formas de organizações dos setores público e privado, ou por meio da cooperação entre ambas. Esta última forma de atuação, isto é, a parceria público-privada, tem sido alvo frequente das políticas dos governos, voltadas ao incentivo da atividade de P&D, uma das mais complexas no processo inovativo, devido à intensidade cada vez maior de conhecimentos tácitos e complexos envolvidos em sua execução. A Lei da Inovação tem como um de seus propósitos o estímulo a esse tipo de atividade.

Existem diversos mecanismos que podem ser utilizados para promover a inovação, contudo no contexto deste estudo, serão abordados aqueles relacionados aos processos de P&D colaborativos, ICT-empresa, e em especial, as questões relativas à gestão da propriedade intelectual.

2.1 A P&D em ambiente de inovação aberta

Considerando Mundim et al. (2002), em uma empresa, a P&D é um dos processos mais complexos e que se relaciona com praticamente todas as demais funções de uma organização. Para desenvolver uma nova tecnologia são necessárias informações e habilidades de membros de todas as áreas funcionais, caracterizando-se como uma atividade, em princípio, multidisciplinar. Contudo, as empresas, nem sempre possuem todas essas informações ou habilidades, ou mesmo, muitos dos profissionais envolvidos neste processo possuem apenas visões parciais do todo, devido às especificidades de suas áreas de atuação, as quais podem ser classificadas como especialistas ou generalistas. No primeiro caso, os especialistas possuem uma ampla experiência em uma área técnica, mas mantêm pouco contato com os aspectos organizacionais e do negócio, por outro lado, gerentes que possuem um conhecimento integrado do negócio, não conhecem profundamente os aspectos tecnológicos do produto. Assim, é possível notar que as empresas não reúnem todas as competências necessárias para a execução das atividades de P&D. Isso faz com que o processo de P&D seja moroso ou não avance rumo aos resultados desejados.

Também, de acordo com Kohl e Zonatto (2011), o ciclo de vida dos produtos estabelece a importância da inovação. Pois todo produto tem um ciclo de vida (introdução, crescimento, maturidade e declínio) e o processo de inovação e renovação tem que ser cíclico. Entretanto, para cada ciclo, as variáveis são outras, seja porque existem concorrentes no mercado, seja pela mudança do próprio mercado ou pela existência de novas tecnologias. Isso implica em altos investimentos e expõem as empresas a riscos, pois ao iniciar um projeto, não é possível garantir que os resultados finais almejados serão alcançados. No que diz respeito aos investimentos das empresas em P&D, Melo (2009) e Corder e Salles-Filho (2006) descrevem que esta é uma questão de grande importância, e que, inclusive, implica em ações governamentais.

Desta forma, as organizações, de todos os segmentos e portes, são motivadas à buscar alternativas para promover a inovação. Uma destas alternativas diz respeito à possibilidade de interação entre ICT e empresas, para as atividades de P&D. Esta parceria entre ICT e empresa permite reduzir o montante do investimento das organizações nos projetos de pesquisa e desenvolvimento, ao mesmo tempo em que reduz e compartilha os riscos de fracasso do referido projeto, além de encurtar os prazos. Esta parceria também beneficia a ICT, pois permite a aplicação dos resultados de sua pesquisa conceitual, de maneira que possam desenvolver ainda mais o conhecimento, e, ainda, obtenham recursos para subsidiar os seus projetos de pesquisa, por meio das empresas. Contudo, os projetos de P&D cooperativos não se tratam de uma terceirização da atividade de P&D e sim o compartilhamento de conhecimento, de competências e recursos entre as ICT e as empresas.

Nesse sentido, Ferro (2010), Rio (2009) e Santos e Romeiro (2007) indicam que o processo de inovação é cada vez mais colaborativo, articulando a criação de redes de pesquisa e integrando as ICT e empresas e Matias-Pereira e Kruglianskas (2005) descrevem que em uma economia sólida, a inovação tecnológica deve ser resultado de um ambiente que produz ciência de ponta e da influência direta e indireta do setor produtivo. Este processo de colaboração entre ICT-Empresa é denominado de inovação aberta.

Para Grieco (2012) e Chesbrough (2003a), a inovação aberta é um modelo no qual uma organização utiliza fontes externas em seus processos de inovação, sendo agrupadas em diferentes modalidades, dependendo do grau de envolvimento com parceiros externos, fornecedores e clientes. A inovação aberta exige um ambiente franco, de comunicação aberta, e de confiança mútua. As técnicas de inovação aberta são similares às práticas de redes, como no caso do acesso a fontes externas de cooperação, do estabelecimento de relacionamentos externos, da abertura nas relações, da aprendizagem e compartilhamento, entre outros. As redes de relacionamento podem ser consideradas como a chave de acesso ao conhecimento oriundo de ambientes externos à organização. Segundo Pinheiro (2012) e Enkel, Gassmann e Chesbrough (2009), a inovação aberta parte de um processo de abertura de mentalidade, sendo que a criação de uma cultura que valorize competências e conhecimento externo é essencial para sua prática.

Para Pinheiro (2012), Van der Meer (2007) e Chesbrough (2003b), o modelo de inovação aberta difere do modelo fechado por viabilizar o sucesso da organização não apenas com ideias originadas dentro das fronteiras da organização, mas também vinculado as ideias fora das suas fronteiras. Ainda, para Grieco (2012), a inovação aberta requer coordenação e sincronização de processos ao longo dos diferentes departamentos e de diferentes empresas. Isto é necessário para que se possa levar uma ideia do plano da abstração ao de um produto tangível. Estabelecer colaboração interna e externa sólida é um elemento indispensável para a inovação aberta. E, de acordo com estes princípios, expande-se a ideia de inovação para a implementação de novas ideias, internas ou externas, gerando valor.

Entretanto, esta interação é complexa, visto que ocorrem em um cenário em que os agentes responsáveis por programas de pesquisa e os responsáveis pelos processos de inovação, nas ICT e nas empresas, trabalham com condições, metodologias, tempos, preocupações e objetivos diferentes. Assim, Benedetti e Torkomian (2011) apontam que o desenvolvimento da cooperação entre ICT e empresa sofre com questões burocráticas que permeiam a ICT, gerando entraves para a aproximação de empresas que tem orientação para o mercado, contudo, Matias-Pereira (2011) indica que é essencial gerar estímulos para que essa cooperação ocorra.

O Manual Europeu de Diretrizes para Pesquisa Colaborativa, de acordo com o Responsible Partnering (2013), apresenta um resumo das diretrizes para pesquisa em ambiente de inovação aberta, destinadas às empresas, ICT e governos:

  1. Desenvolver uma visão estratégica de como as atividades de P&D colaborativa e transferência de tecnologia vão auxiliar as partes a atingir seus objetivos;
  2. Definir as políticas, comunicá-las e garantir compreensão e alinhamento;
  3. Alinhar, com transparência, os interesses e as expectativas dos vários parceiros envolvidos;
  4. Usar práticas consolidadas e adotá-las como práticas-padrão;
  5. Disponibilizar apoio profissional de alta qualidade para a gestão da pesquisa colaborativa e da transferência de tecnologia;
  6. Desenvolver programas e ambientes de aprendizagem para que as equipes adquiram habilidades inerentes à inovação aberta (gestão de projetos, empreendedorismo, desenvolvimento de negócios, gestão da propriedade intelectual, etc.);
  7. Realizar uma gestão da propriedade intelectual eficaz, que facilite a criação de valor, num contexto de inovação aberta, maximize o potencial de comercialização e incentive futuros investimentos em pesquisa;
  8. Abordar a inovação de maneira interdisciplinar, incluindo a inovação no modelo de negócios, no design, etc.; e,
  9. Incentivar a pesquisa avançada, a educação e treinamento de alta qualidade e a criação de NIT com profissionais competentes nas ICT.

Para Grieco (2012), a captura de conhecimento externo, por meio da qual são estabelecidos fluxos entre as empresas para alcançarem novos mercados, tornam-se mais eficientes com a formação de redes de conhecimento. A inovação aberta inclui o uso, pelas empresas, de fontes de inovação externas e a habilidade de monetizar suas inovações, sem ter que construir soluções internas. Há vantagens em se buscar tecnologias externas, entretanto, há, também, perigos em ignorá-las em favor da própria tecnologia.

Para Costa, Porto e Feldhaus (2010), é relevante frisar que a interação ICT-empresa não é uma solução mágica para as dificuldades e desafios da ICT e das empresas; tampouco é um processo fácil, sem resistências e antagonismos. O que se pode observar é que, a despeito de todas as dificuldades inerentes ao processo de cooperação tecnológica, é possível compatibilizar os interesses e as necessidades do setor acadêmico e os do setor empresarial, mediante a adoção de práticas gerenciais flexíveis, eficientes e eficazes. Nesse sentido, as atividades acadêmicas e empresariais podem, e têm de ser compatíveis; no contexto atual, a ICT não pode deixar de participar ativamente do processo de desenvolvimento econômico e social, como provedora de conhecimentos e de profissionais preparados para enfrentar a nova realidade; por outro lado, o segmento empresarial também precisa participar das discussões tecnocientíficas da atualidade, para fomentar o aprendizado organizacional e corroborar o desenvolvimento econômico-social do país. Em outras palavras, a cooperação ICT-empresa é uma grande propulsora da competitividade tecnológica.

Para Garnica e Torkomian (2009; 2005), existem vários mecanismos disponíveis que viabilizam a cooperação ICT-Empresa. Entre esses mecanismos, a gestão de tecnologia e da inovação na ICT, assume um papel central na maximização de oportunidades de cooperação e, também, para o melhor aproveitamento dos conhecimentos científicos e tecnológicos disponíveis na ICT ou gerados por meio desta interação, tornando a ação da ICT mais presente e efetiva. Em outras palavras, para obter sucesso nessa relação, deve haver uma boa gestão desta atividade, o que inclui a gestão das questões relativas à propriedade intelectual.

2.2 A Gestão da PI

Para Pinheiro (2012) e Jing e Shuang (2011), a gestão da propriedade intelectual pode ser definida como o tipo de gestão que se refere à criação, uso e transferência de recursos intelectuais. Trata do emprego da tomada de decisões, planejamento, organização e controle, inovação e cultivo do conhecimento para criar riqueza e aumentar a competitividade, além de promover o processo de desenvolvimento organizacional. Ávila (2008) descreve que a missão do sistema de propriedade intelectual é favorecer o desenvolvimento econômico e social, promovendo a criação e a circulação do conhecimento e propiciando a sua transformação em valor para as empresas e para os consumidores.

Quando se trata de atividade de P&D em ambiente de inovação aberta, onde a colaboração é intensa, a divisão da propriedade intelectual não é uma tarefa fácil, então, conforme Fitzpatrick e DiLullo (2005), as pesquisas conjuntas com outras organizações devem ser reguladas por meio de acordos contratuais, onde devem ser descritos como as tecnologias serão apropriadas, comercializadas e/ou utilizadas, resguardando, assim, os direitos da PI. Essa definição é importante, pois conforme Mello (2009) e Leal, Souza e Solagna (2014), como todo direito de propriedade, a PI é excludente, isto é, exclui terceiros do uso e fruição do objeto do direito, garantindo a exclusividade e o controle destes ao titular do direito. Entretanto, considerando Jannuzi at. al. (2008), é importante notar que as cláusulas de PI devem ser cautelosamente elaboradas, para permitir a sua adequada proteção e impedir que as patentes sejam mecanismos de bloqueio mercadológico para o parceiro do setor produtivo, ao qual foi realizada a parceria.

O Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT) de uma ICT é o responsável por dar o parecer nas cláusulas de PI dos acordos contratuais realizados, principalmente, em situações caracterizadas, conforme Chesbrough (2007), como de inovação aberta. Assim, o NIT deve realizar uma avaliação minuciosa para identificar ou propor cláusulas que definam, conforme Albiero Berni et al. (2015), a divisão da titularidade da propriedade intelectual das futuras tecnologias a serem desenvolvidas, para que não se torne objeto de disputa futura ou prejudicar a relação entre a ICT e a organização.

Para Costa, Porto e Feldhaus (2010), até que os projetos de P&D cooperativos apropriem as tecnologias geradas, as organizações, tanto as ICT quanto as empresas, enfrentam dificuldades em estabelecer um equilíbrio entre o que deverá ser mantido em sigilo e o que poderá tornar-se público. Assim, para Santos (2011), é importante que o NIT possua ferramentas que sejam capazes de identificar as novas tecnologias criadas, passíveis de apropriação, e promova a tomada de decisão acerca de sua proteção, e consequentemente, sobre a promoção da transferência da tecnologia gerada. A transferência de tecnologia é uma das fases de grande importância no processo de P&D, que, quando bem-sucedida, agrega sentido econômico e social aos recursos disponibilizados pela pesquisa.

Considerando Pinheiro (2012), Kohl e Zonatto (2011), Moreira et. al. (2008) e Garnica e Torkomian (2005) os mecanismos para um relacionamento saudável entre ICT e empresa têm sido amplamente discutidos, contudo os processos de mudança envolvendo a cultura organizacional são graduais, o que pode demandar tempo, e, exige uma atuação contínua e persistente para que se obtenha êxito. Para promover tal mudança, devem ser empregadas ferramentas associadas a uma estrutura clara de comunicação, que deve ser alinhada a mecanismos, métricas, ferramentas e ações estimuladoras à criação de um ambiente propício a inovação.

3. A aplicação dos conceitos de inovação aberta no Centro de Competência em Manufatura do ITA

A descrição deste item é realizada com base na pesquisa-ação realizada no NIT/DCTA e no estudo de caso realizado no ITA/CCM, sendo suportado por informações disponibilizadas sobre o ITA/CCM, conforme CCM (2015) e ITA (2014).

O Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) é uma ICT, fundada em 1950, que atua nas áreas de ciência e tecnologia de interesse aeroespacial. Apresenta uma relevante história de sucesso nos campos do ensino e de P&D no cenário nacional, inclusive, como apoiador da indústria nacional, como pode ser visto com a participação ativa no desenvolvimento do avião Bandeirante, na década de 60, que deu origem à indústria aeronáutica nacional. Ainda, o ITA teve um importante papel para o desenvolvimento do setor aeroespacial e de defesa do país, seja nas atividades de pesquisa, com a criação de importantes ICT (IAE, IEAv e INPE), seja na criação e/ou consolidação do segmento industrial (EMBRAER, AVIBRAS, ORBISAT, SAFRAN, MECTRON, TECSIS, entre outras).

O Centro de Competência em Manufatura (CCM) do ITA pode ser definido como um laboratório ou um ambiente multidisciplinar que desenvolve pesquisas e soluções voltadas para o desenvolvimento da indústria, fomentando a inovação na área de manufatura, como pode ser visto na representação esquemática da Figura 1.


Figura 1: CCM – Um ambiente multidisciplinar de pesquisa e desenvolvimento
Fonte: CCM (2015)

Trata-se de um laboratório que atua com pesquisas para a solução de problemas apresentados pelas empresas, que, por meio de convênios, estabelecem parcerias para a P&D focado para a solução dos problemas. A missão do CCM é desenvolver capital humano, tecnológico e reputação para aplicar os conhecimentos em engenharia no gerenciamento do ciclo de desenvolvimento do produto e otimizar a manufatura de alto desempenho. A sua visão é possibilitar o acesso de toda a indústria de manufatura às novas tecnologias de produção.

O CCM tem como propósito aumentar a competitividade e modernização da indústria de manufatura, atuando com pesquisa aplicada. O Centro já trabalhou em diversos projetos de desenvolvimento de produtos e soluções nas áreas de processos de fabricação, automação, metrologia, manufatura digital e análise estrutural para empresas nacionais e internacionais. A Figura 2 apresenta a quantidade de projetos, com o conceito de inovação aberta, já desenvolvidos pelo CCM.

Figura 2: Quantidade de projetos em parceria com a indústria
Fonte: ITA (2014)

Entre os anos de 2011 e 2013, foram realizados 124 projetos em parceria com empresas, totalizando um aporte financeiro de R$ 55 milhões das indústrias e R$ 18,5 milhões de agências de fomento. No total, foram aproximadamente 100 empresas atendidas nos últimos três anos.

Ainda, os principais setores da indústria beneficiados com estes projetos foram (CCM, 2015):

  1. Indústria Automotiva
    1. Tecnologias rápidas: materiais e desenvolvimento de processos.
    2. Manufatura Digital: otimização do desenho da fábrica, simulação de processos, automação de processos, monitoramento remoto.
  2. Indústria Aeronáutica
    1. Tecnologias rápidas: materiais e desenvolvimento de processos.
    2. Usinagem: Materiais de difícil usinagem (Ni, Ti), corte de alta velocidade (HSC), manufatura auxiliada por computador (CAM).
    3. Automação de processos de fabricação e metrologia.
  3. Aço e Metalurgia
    1. Usinagem: Materiais de difícil usinagem (CGI, ADI), otimização de processos, manufatura auxiliada por computador (CAM).
  4. Energia e Meio Ambiente
    1. Sustentabilidade em processos de manufatura.
    2. Políticas públicas para o desenvolvimento de Pequenas Centrais Hidrelétricas: Desenvolvimento de turbinas, Usinagem de peças complexas (paletas de rotores, compressores de turbinas).
    3. Desenvolvimento de biodiesel: análise tribológica.
    4. Manufatura Digital: otimização do desenho da fábrica, simulação de processos, automação de processos, monitoramento remoto.

1. ITA – Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, SP, Brasil. FATEC – Faculdade de Tecnologia de Guaratinguetá, Guaratinguetá, SP, Brasil. Email: herlandi@hotmail.com
2. ITA – Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, SP, Brasil.
3. ITA – Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, SP, Brasil.

4. ITA – Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, SP, Brasil.

5. FATEC – Faculdade de Tecnologia de Guaratinguetá, Guaratinguetá, SP, Brasil.


Revista Espacios. ISSN 0798 1015
Vol. 37 (Nº 17) Año 2016

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