ISSN 0798 1015

logo

Vol. 38 (Nº 09) Año 2017. Pág. 24

A Satisfação do Trabalhador Rural: uma relação entre a assistência técnica e a gestão da propriedade e uma implicação na sucessão das unidades familiares

Rural worker satisfaction: a relation between technical support and property management and an implication in the succession of family units

Jaqueline Silva NASCIMENTO 1; Luciana Virginia Mario BERNARDO 2; Gleicy Jardi BEZERRA 3; Erlaine BINOTTO 4

Recibido: 08/09/16 • Aprobado: 29/09/2016


Conteúdo

1. Introdução

2. A gestão da propriedade familiar evidenciando a necessidade de práticas de assistência técnica

3. A sucessão na propriedade: a influência familiar condicionada à satisfação no trabalho

4. Metodologia

5. Resultados e discussões

6. Considerações finais

Referências


RESUMO:

O presente trabalho tem como objetivo identificar a relação entre a assistência técnica, a gestão da propriedade rural, a satisfação do trabalho no campo e a sucessão familiar na perspectiva do produtor. Para isso, realizou-se, no mês de julho de 2014, em Juti, no estado do Mato Grosso do Sul, a aplicação de questionário a 30 produtores rurais pertencentes a diversos municípios dessa unidade da federação. A análise dos dados foram processada e tabuladas no software SPSS. Independentemente de o produtor estar satisfeito ou não com a vida na propriedade, ele gostaria que seus sucessores prosseguissem as atividades na propriedade.
Palavras-chave: Agricultura familiar; Gestão da propriedade; Assistência Técnica

ABSTRACT:

This study aims identify the relation among technical support, rural property management, field workers satisfaction and the family succession under the farmer perspective. To achieve that, in July 2014, in Juti, Mato Grosso do Sul, a questionnaire was applied to 30 rural workers from different cities of this state. The analysis of the data were processed and tabled on SPSS software. Independently on the farmer being or not satisfied with his life on the property, he would like his successors to go on with these activities.
Keywords: Family farming; Property management; Technical support.

1. Introdução

A agricultura familiar é um segmento produtivo que possui vários significados, devendo ser entendida principalmente por três aspectos: (i) como trabalho familiar, como fator de estruturação da família no processo de organização social, além de (iii) transmitir conhecimentos e experiências culturais agroecológicas para parcela significativa da população nacional (Brasil, 2014; Savoldi & Cunha, 2010).

No Brasil, ao longo dos últimos anos, a agricultura familiar ganhou importância social, econômica e política, apresentando participação na geração de emprego e na produção de alimentos. Além de a sua produção ser destinada à subsistência pessoal e familiar, os produtores também comercializam parte da produção (Finatto & Salamini, 2008).

Assim, a agricultura familiar viabiliza a permanência do agricultor familiar na sua propriedade, promovendo o desenvolvimento e garantido a maximização da qualidade de vida (Altieri, 2002). Também promove o desenvolvimento econômico e social, melhorando as condições de vida da população, contribuindo para a redução das desigualdades sociais, gerando renda e redução do êxodo rural, dentre outros fatores positivos promovidos pelo segmento (Rosa, 2013), (Figueiredo & Freitas, 2015).

Diante disto, cabe perceber que, se exige a viabilidade das atividades dos agricultores e reconhecimento de desempenho, isso tem um custo prévio, ou seja, a viabilidade e o desempenho dependem de um conjunto de fatores e de agentes que realmente formem um sistema integrado ou harmônico. Olhando sob esse ponto de vista, isso desloca a análise para variados fatores dessa cadeia produtiva, pois passa a envolve aspectos sociais, aspectos econômicos e aspectos ambientais. Dizendo em outros termos, a análise se direciona para a qualidade de vida no campo e requer um enfoque sistêmico (Carneiro, 2013).

Nesse contexto, a assistência técnica e a extensão rural na agricultura familiar possuem um papel fundamental como forma de organização da gestão na propriedade, pois os extencionistas possuem o objetivo da prestação de serviços a diferentes perfis de agropecuaristas, tendo a pretensão de atender a pequenos e a médios agricultores buscando o desenvolvimento rural e de agricultura de modo sustentável e asseguram uma produção qualificada de alimentos e melhores condições de vida para a população rural (Wanderley, 2013), (Rosa, 2013), (Carneiro, 2013).

Sabe-se que, dentre os inúmeros fatores que alavancam o sucesso de uma organização ou unidades de produção agropecuárias, considera-se o instrumento de gestão como um dos principais (Breitenbach; Guidini & Bundchen, 2014). Assim, Callado e Callado (2011) afirmam que a gestão das propriedades rurais se constitui num tipo administração que possui um papel primordial na propriedade, pois é mediante o uso dessa ferramenta que se obtém a otimização dos lucros.

É com esse entendimento que o presente artigo apresenta uma análise da agricultura familiar tendo em vista qualificar as perspectivas de vida dos produtores. Nesse contexto, objetiva-se identificar se a relação entre a existência de assistência técnica e práticas da gestão da propriedade pode auxiliar na constituição da satisfação do trabalho no campo e, consequentemente, no processo de sucessão da propriedade.

2. A gestão da propriedade familiar evidenciando a necessidade de práticas de assistência técnica

Historicamente, porém, no Brasil ocorria a conotação de que o segmento da agricultura familiar era um setor de atraso, marginalizado (Aquino & Teixeira, 2005), visto apenas como unidade produtiva de subsistência de que apenas os excedentes eram comercializados em mercados locais (Guanziroli, Buainain & Sabbato, 2012). Em âmbito mundial, no entanto, essa realidade é diferente, pois, segundo relatos da Food and Agriculture Organization ─ FAO (2014), a segurança alimentar mundial depende, em grande parte, da agricultura familiar de pequenos produtores. Esse entendimento tem alterado, nas últimas décadas, a caracterização oficial e o tratamento público que a agricultura vem recebendo em solo nacional.

A partir dos indicadores da FAO, pode-se afirmar que a principal questão que assola as sociedades e os órgãos governamentais nos diversos continentes é como alimentar uma população em crescimento acelerado, principalmente em países em desenvolvimento. Uma saída para tal questionamento é representada por dois modelos: um está baseada em estruturas de produção individual, o outro é um modelo baseado em sistema coletivo de trabalho e meios de produção (Tomiasso et al., 2007).

Os agricultores familiares, além de praticarem uma produção para a sua subsistência, também agregam valor a essa produção e comercializem seus produtos. Tendo em vista que a comercialização com a venda de produtos alimentícios no mercado visa auferir lucro (Zhou et al., 2013), então esse processo é indispensável na agricultura familiar para a sustentabilidade das famílias rurais e o desenvolvimento econômico dos países (Muriithi, 2013).

Se, no entanto, se tratar de unidades agrícolas abandonadas a iniciativas aleatórias, sem entrosamento comunitário e sem planejamento coletivo, tais empreendimentos não vão conseguir atingir os seus objetivos (Fernandes, 2004). Assim, porém, ao relacionar a ciência da gestão da propriedade rural com a agricultura familiar, no tocante às práticas adotadas para viabilizar uma produção moderna, que, por exemplo, reduza custos e despesas, as dificuldades nem sempre estarão relacionadas às técnicas ou às ferramentas e ao valor de investimento. De um lado, há aspectos que podem ser considerados empecilhos no contexto, mas que são solucionáveis se vinculados à disponibilidade de assistência técnica ao grupo. De outro lado, a qualificação profissional deve ser oferecida aos agricultores, em especial sobre as práticas de gestão da propriedade e, consequentemente, da produção (Batalha et al., 2005).

Entende-se, portanto, que, uma vez solucionada a questão da assistência técnica, um outro fator é essencial na atividade profissional do produtor familiar. Trata-se das orientações técnicas para o manejo da propriedade, sendo esse o âmbito das políticas governamentais rurais. Essas políticas, porém, ao serem colocadas em prática, apresentam empecilhos como: quantitativo de produtores que recebem a assessoria técnica e a maioria delas não evidencia a qualidade do serviço prestado (Sassi & Brandalise, 2008).

Um exemplo positivo de assistência técnica e extensão rural, que possibilitou impor uma qualidade diferencial à produção, refere-se ao leite produzido nas propriedades do município de Sales de Oliveira – SP. Assim, o resultado implicou: (i) melhoria na qualidade dos produtos, (ii) aumento da produção e (iii) retorno financeiro mais consistente. Isso explicita o impacto positivo da assistência em diferentes aspectos dessa produção, sabendo-se que esse tipo de assistência pode ser aplicado a diferentes produções e com resultados possivelmente semelhantes aos encontrados nesse mencionado estudo (Gonçalves et al., 2014).

Outro aspecto a ser considerado neste contexto trata-se do acesso a financiamentos como, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – Pronaf. Em algumas situações, a exigência feita refere-se a projetos técnicos das ações que determinados grupos de produtores familiares pretendem desenvolver. Há nesses casos, uma dependência do produtor para com, a assistência e seu acesso aos recursos financeiros, necessários ao desenvolvimento da propriedade (Brumer & Spanevello, 2012).

3. A sucessão na propriedade: a influência familiar condicionada à satisfação no trabalho

As unidades familiares podem influenciar os jovens na tomada de decisão da escolha profissional. A partir das informações apresentadas por esse grupo ao indivíduo, com relação a valores, tradições, características, entre outros aspectos vinculados a profissões e ao universo contextualizado ao trabalho, os jovens da área rural fazem comparações com diferentes contextos em que possam vir a inserir-se no seu futuro (Pocinho et al., 2012).

Esse apoio sobre a decisão está, porém, vinculado com a expectativa que o grupo familiar cria com relação ao evento, podendo ser considerado como uma das principais influências no momento de escolha, pois esse apoio contribui indiretamente, através da formação pessoal dada anteriormente ao momento, e diretamente, indicando, por exemplo, uma valoração para as diferentes profissões (Santos, 2005).

O modo como essas famílias repreendem ou incentivam o comportamento dos indivíduos em sua fase infantojuvenil poderá influenciar o modo como interpretam seu contexto, possibilitando determinar seus interesses ou hábitos (Soares, 2002). Sendo assim, poderá criar alguma situação de influência na decisão da profissão, considerando ainda as possibilidades de sequenciamento da escolha feita pelos pais ou de algum indivíduo considerado ícone ou modelo naquele ambiente rural (Fernandes et al, 2011).

Denota-se ainda o papel materno nessa escolha. Trata-se de um papel de destaque no contexto, exercendo muita influência (Mello, 2011). Então, o certo é que nem sempre essa influência é positiva para a permanência na atividade rural. Se a influência vem envolvida num determinado contexto de insegurança, pode ser que esse indivíduo não faça a melhor escolha segunda seu próprio juízo, senão que o faça por obrigação diante das determinações familiares (Monteiro & Basso, 2005).

Esse contexto da influência familiar indefere do entorno social ao qual está vinculado esse grupo, bem como poderá haver interferências das gerações de diferentes tempos, o que pode gerar conflitos devido a características de formação desses indivíduos, de serem diferentes e correspondentes as suas gerações (Coutrim et al., 2011).

Ao se tratar sobre o assunto satisfação no trabalho, deve-se entender que esse conceito está relacionado ao ambiente, às condições oferecidas e às atividades desenvolvidas pelos indivíduos. Essas todas são condições implicadas entre si a nível emocional e a soma delas determina se há grau suficiente de satisfação, podendo tal âmbito existencial estar relacionado com a qualidade da gestão praticada e influenciar o quantitativo produzido (Cadamuro et al., 2013; Fischer et al., 2015).

Há uma constância de a satisfação poder ser representada pelo nível de motivação dos trabalhadores, quando esta indica ações ou está vinculada ao estado emocional do indivíduo. Podendo ser representada por dois aspectos opositores, que indicam a satisfação ou insatisfação (Martinez & Paraguay, 2003). Essa questão, quando relacionada ao trabalho, pode estar vinculada à saúde e ao bem-estar dos trabalhadores, desse modo não podendo ser ignorada (Carrillo et al., 2013).

As instituições precisam compreender o papel de seus colaboradores como indivíduos com características individuais que constituem o seu Capital Humano e auxiliam no alcance de metas e resultados estabelecidos. Desse modo, a valorização desses indivíduos deve ocorrer dentro das organizações e estas precisam auxiliá-los no êxito de suas atividades, possibilitando a satisfação de ambos no contexto (Azevedo & Medeiros, 2012).

Diante disso, pode contribuir para o desenvolvimento de melhorias no ambiente organizacional, pois quando correlacionados os diferentes fatores, como aspectos psicossociais ao trabalho, proporciona a motivação dos integrantes do ambiente.  Esses fatores podem ser exemplificados a partir das oportunidades profissionais dentro da instituição, remuneração, elementos necessários ao desenvolvimento de tarefas e ações no trabalho, entre outros, que poderão colaborar na qualidade de vida relacionada ao contexto trabalhista (Caires, 2010).

Nesse sentido, observa-se que existe uma diversidade de condicionantes no ambiente profissional que poderão auxiliar nos sentimentos de satisfação dos colaboradores para com seu emprego e esses sentimentos trazem implicações sobre a saúde e a integridade não somente dos trabalhadores, mas também sobre o gerenciamento da propriedade rural. Acrescentam-se, a essas considerações, os fatores individuais desses funcionários, que podem, sim, influenciar o ambiente para bem ou não. Desse modo, as interferências dos gestores nesse contexto devem objetivar o alcance da integração do ambiente e da saúde do grupo (Marqueze & Moreno, 2005), (Marçal et al., 2013).

4. Metodologia

O estudo foi realizado no mês de julho de 2014, durante a 10ª Feira de Sementes Nativas e Crioulas e de Produtos Agroecológicos e o 3º Seminário sobre o Uso e Conservação do Cerrado do Sul de Mato Grosso do Sul, realizada em Juti/MS, no Salão da Paróquia Santa Luzia, tendo envolvido estudantes, pesquisadores, profissionais da área, agricultores familiares, assentados, quilombolas e indígenas. O evento foi realizado pela Associação de Produtores Orgânicos de Mato Grosso do Sul ─ APOMS; Comissão Pastoral da Terra ─ CPT; Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Oeste ─ EMBRAPA; Instituto Cerrado Guarani e Universidade Federal da Grande Dourados ─ UFGD.

Foram aplicados questionários individualmente com 30 agricultores pertencentes aos municípios de Corumbá, São Gabriel do Oeste, Ponta Porã, Itaquiraí, Nova Andradina, Mundo Novo, Bodoquena, Ladário, Terenos, Novo Horizonte do Sul, Amambai, Dourados, Juti, Bandeirantes e Nioaqui, localizados todos em Mato Grosso do Sul.

O questionário contemplou questões abertas e fechadas, o que possibilitou as questões que não estavam previstas, mas que foram úteis durante a pesquisa (Richardson, 1999), com o intuito de conhecer a estrutura produtiva da agricultura familiar, ou sejam questões tais como anseios e perspectivas puderam também receber informações da parte dos pesquisados.

As informações coletadas foram organizadas, processadas eletronicamente utilizando-se o software Statistical Package for the Social Sciences ─ SPSS (Martinez & Ferreira, 2007).

5. Resultados e discussões

5.1 Considerações sobre a Agricultura Familiar, Assistência Técnica e a Gestão da Propriedade

A coleta das informações tende a relacionar as práticas desenvolvidas na agricultura familiar com a perspectiva observada pela FAO (2014), tendo em vista que a assistência técnica está inserida em 56,7% das propriedades pesquisadas. Essa presença da assistência técnica, de certo modo, subsidia as práticas desenvolvidas nessas unidades, proporcionando que estejam inclusas em um contexto mais favorável à produção, por terem acesso ao conhecimento relativo às novas tecnologias, por exemplo, desenvolvidas para distanciar este grupo do apontamento feito por Aquino e Teixeira (2005), no que se refere à marginalização do setor.

Detectou-se, porém, um percentual preocupante de proprietários pesquisados carentes dessa assistência, em um total de 43,3%. Fica evidenciado que essa realidade carece de um grande esforço de implantação de assistência para fazer a agricultura familiar avançar nos municípios e respectivas cidades dos/as quais esses/as indivíduos/famílias fazem parte. Nesse caso, as indicações feitas por Sassi e Brandalise (2008) tornam-se pertinentes ao evidenciarem a necessidade da assistência para qualificar as propriedades ─ assistência porém não acessível a todos.

Identificadas essas peculiaridades da assistência técnica, a gestão da agricultura familiar entra em campo para relacionar as atividades com a produção de conhecimento, em especial quando conexa aos estudos aplicados que envolvem a questão ambiental, a questão social e a questão econômica, introduzindo uma abordagem sistêmica indispensável à interdisciplinaridade, sendo a falta da prática e do diálogo interdisciplinar um obstáculo para a agricultura familiar. (Carvalho & Silva, 2013).

É importante considerar que a agregação de valor, assunto bem estudado por Zhou et al. (2013) e Muriithi (2013), está vinculada com um manejo diferenciado da propriedade, para assim possibilitar uma produção orgânica de frutas, de legumes e de verduras, além de outros produtos derivados da produção rural.

Com base nos dados coletados, a maioria dos entrevistados informou que utilizam caldas fitoterápicas, compostagem, adubação verde, irrigação das culturas, quebra-vento, máquinas agrícolas, etc., tudo isso compreendido como sendo recursos tecnológicos dessa produção familiar.

Denota-se o exposto por Batalha et al. (2005) sobre a necessidade de as propriedades familiares desenvolverem práticas de gestão. Na Tabela 01, estão indicados fatores que os participantes selecionaram como dificuldades para a execução da prática agrícola familiar.

Tabela 1. Dificuldades encontradas para as práticas de gestão na propriedade

Variáveis Selecionadas

Frequência relativa (%)

Não constatam dificuldades

23,3

Tempo

20,0

Controle de entradas e saídas

10,0

Práticas não relacionadas ao cotidiano

10,0

Curso de capacitação

6,7

Material

6,7

Compromisso e investimento

3,3

Conhecimento sobre o assunto

3,3

Controle geral das ações

3,3

Acompanhamento técnico

3,3

Profissional capacitado

3,3

Iniciará as atividades de gestão posteriormente devido à capacitação

3,3

Considera um extenso processo

3,3

Fonte: Dados da pesquisa, 2014.

Dos itens elencados, 23,3% dos pesquisados consideraram não ter dificuldades para o desenvolvimento da gestão. As indicações com maiores percentuais referem-se à questão de tempo empenhado para o desenvolvimento das práticas relacionadas, conforme indicado por 20% dos pesquisados. Sequencialmente, as dificuldades, com percentual de 10% cada, referem-se ao controle de entradas e saídas e ao fato de a gestão não fazer parte de seu cotidiano até o presente momento. Ambas podem significar uma mudança de atitude desses indivíduos para o alcance da gestão da propriedade. Denota-se que 23,3% dos pesquisados relacionam a dificuldade em realizar a gestão à falta desse conhecimento administrativo.

Na Tabela 2, diante do questionamento sobre as melhorias da agricultura familiar para o Mato Grosso do Sul, os respondentes puderam optar por mais de uma alternativa dentre as dispostas. O intuito era evidenciar a percepção sobre o que é necessário para melhorar a agricultura familiar do estado.

Tabela 2. A Percepção dos Produtores sobre as melhorias da Agricultura Familiar do Estado de MS.

Variáveis Selecionadas

Frequência absoluta

Políticas públicas

11

Créditos

3

União dos produtores

3

Cooperativas e associações

2

Capacitação

2

ATER

2

Planejamento

1

Assistência técnica

1

Implantação dos projetos

1

Regulamentação das propriedades

1

Técnicas agrícolas e manejo

1

Equipamentos

1

Tecnologia

1

Valorização e fortalecimento da agricultura familiar

1

Divulgação dos meios de produção

1

Aumento do preço da produção

1

Fonte: Dados da pesquisa, 2014.

No tocante à confiança do grupo nas ações desenvolvidas pelo governo, 11 dos respondentes indicaram a necessidade de mais políticas públicas para o setor, isso seguido dos créditos rurais. Outra ação governamental cobrada é a necessidade de organizar mecanismos de união dos produtores de cada setor, considerando essa união indispensável para qualificar as atividades das propriedades de cada localidade.

Observa-se que, mesmo existindo a disponibilidade, por meio dos créditos, dos recursos financeiros necessários, não existe, porém, a prática da assistência técnica para todos, como acima evidenciado. Inclusive, a percepção da maioria dos produtores não indica a assistência técnica como um fato de melhoria para a agricultura familiar. Essa percepção generalizada, de que a assistência técnica é indiferente, contraria as considerações feitas por Brumer e Spanevello (2012), que a consideram tão importante que preceituam só conceder crédito onde a assistência estiver sendo praticada.

O Quadro 1, a seguir, permite visualizar as informações sobre as dificuldades das práticas de gestão com a assistência técnica.

Quadro 1. Correlação da dificuldade de o agricultor realizar a gestão da propriedade e se ele recebe algum tipo de assistência técnica.

Dificuldades da Gestão da Propriedade

Recebe algum tipo de assistência técnica?

Sim

Não

Não apresenta dificuldades

5

2

Controle de entradas e saídas

1

2

Compromisso e investimento

1

0

Conhecimento sobre o assunto

0

1

Controle geral das ações

0

1

Capacitação

2

0

Acompanhamento técnico

0

1

Práticas não relacionadas ao cotidiano

3

0

Tempo

3

3

Material

0

2

Profissional capacitado

1

0

Iniciará as atividades de gestão posteriormente devido à capacitação em curso

0

1

Considera um extenso processo

1

0

Total

17

13

Fonte: Dados da pesquisa, 2014.

Com base nos relatos, são 17 os produtores que recebem assistência técnica e identificam alguma dificuldade para o desenvolvimento das práticas de gestão da propriedade. Dentre as escolhas das dificuldades, 5 não foram escolhidas, sendo elas: conhecimento sobre o assunto, controle geral das ações, acompanhamento técnico, material e início de atividades de gestão posterior ao momento da pesquisa. Isso indica que uma propriedade pode receber a assistência técnica, mas ainda assim, sentir alguma necessidade com relação aos itens identificados no Quadro 01.

No segundo grupo, composto pelos que não recebem assistência técnica, o destaque está também na dificuldade de empenhar tempo para o desenvolvimento da gestão. Não foram indicadas as opções “compromisso e investimento, “capacitação”, “práticas não relacionadas ao cotidiano”, “profissional capacitado” e “considera um extenso processo”. Nenhum desses itens é coincidente com o primeiro grupo, o que demonstra dificuldades diferentes para ambos os grupos, com exceção do tempo.

5.2 Indicação de satisfação do trabalhador rural e sua perspectiva futura no que se refere à sucessão familiar

É importante considerar a satisfação dos indivíduos no que tange às suas atividades intituladas como trabalho na sociedade, como apontado por Cadamuro et al. (2013), Martinez e Paraguay (2003) e Carrillo (2013). Segundo esses estudiosos, esse índice de satisfação influencia até mesmo as condições de saúde dos trabalhadores. Dentre o grupo pesquisado, 93,3% dos respondentes se consideraram “satisfeitos” com o seu modo de vida no ambiente rural, o que é uma expressão positiva, se comparada às considerações desses autores.

Especificadamente, “insatisfeito” implica um grupo de 3,3% dos respondentes. A informação pode ser observada no Gráfico 01, assim como, outros percentuais.

 

 Gráfico 1. Nível de satisfação que o produtor tem com relação ao seu modo de vida no campo.

Nesse gráfico, o maior percentual alcançado é de 53,3%, índice no qual está expressado o nível de muita satisfação de muitos produtores com seu modo de vida no campo. Isso pode estar relacionado com a motivação desses produtores e com as características que encontram nesse ambiente de trabalho. Caire (2010), Marqueze e Moreno (2005) e Marçal et al.  (2013) descrevem as características desse ambiente rural e as possibilidades de vida ali existentes, como influenciadoras no julgamento que o trabalhador faz com relação à sua satisfação.

Ampliando as observações, Pocinho et al. (2012) retratam que as famílias podem influenciar os jovens na tomada de decisão com relação à sua futura profissão, pois a descrição das atividades por eles feita poderá indicar a continuidade das gerações futuras no desenvolvimento das profissões, o que também é considerado por Santos (2005).

Desse modo, adicionando-se os percentuais relativos aos níveis de muita satisfação e satisfação, obteve-se um total de 80%, porém sobre a continuidade dos filhos nesse trabalho de produção na propriedade é retratada apenas por 60% dos entrevistados, o que é um número inferior ao nível de satisfação.

O Quadro 02 indica a relação entre os respondentes sobre a satisfação e a sucessão familiar da produção, considerado, neste caso, a filiação.

Quadro 2. Correlação da questão se o produtor está satisfeito com a vida no campo
e a questão de se eles querem que seus filhos deem continuidade na produção da propriedade.

Respondentes

Espera que seus filhos deem continuidade na produção da propriedade?

Sim

Não

Insatisfeito

1

0

Pouco satisfeito

3

2

Satisfeito

6

2

Muito satisfeito

8

8

Total

18

12

Fonte: Dados da pesquisa, 2014.

A correlação estabelecida indica que, mesmo insatisfeito, o produtor tem a intenção de que de seu descendente dê continuidade a suas atividades no campo. Soares (2002) considera, porém, que, se um indivíduo ouve de seus entes próximos considerações negativas sobre o trabalho, ele poderá futuramente considerar essa influência negativa na escolha profissional, isso podendo afastar esse indivíduo daquela atividade que, por diversas vezes, foi motivo de reprovação pelos familiares.

Mesmo entre os produtores que se incluíram entre os muito satisfeitos, ocorreu uma divisão igualitária de expectativas quanto à continuidade ou não das futuras gerações nas atividades rurais. Então há aí a descoberta de um fator social importante, qual seja a necessária atenção coletiva com relação às informações transmitidas às gerações sucessoras na agricultura, sob pena de se tornarem gerações confusos na tomada de decisão quanto a permanecer ou a migrar, como afirmam Monteiro e Basso (2005). É preciso que as futuras gerações possam decidir por razões próprias, em vez de herdarem conceitos negativos do passado.

6. Considerações finais

Os resultados da pesquisa demonstraram que a maioria dos produtores pesquisados recebe assistência técnica e que, no caso dos produtores que recebem assistência, eles não apresentam dificuldades na gestão das suas propriedades. Quando dificuldades aparecem, em especial entre os que não recebem assistência, as principais elencadas pelos pesquisados para fazer a gestão na propriedade foram falta de tempo e controlar entradas e saídas de insumos.

Com relação aos fatores primordiais para melhorar a agricultura familiar sul-mato-grossense, foram apontados três: (i) existência de adequadas políticas públicas, (ii) disponibilidade de créditos compatíveis e (iii) união dos produtores. Eles, no entanto, em geral estão satisfeitos com a vida no campo e querem que seus descendentes continuem com as atividades que estão sendo desenvolvidas.

Como sugestão decorrente desta pesquisa indica-se a necessidade de aplicação da pesquisa para um número maior de produtores familiares, podendo-se, com isso, obter a caracterização do estado de Mato Grosso do Sul com relação à temática aqui proposta. Também se percebeu a necessidade do desenvolvimento de atividades por parte de cooperativas, associações e universidades, com relação a capacitações para a aplicação de práticas de gestão no ambiente de produção, de modo a demonstrar as implicações nos resultados financeiros.

Enfim, cabe mencionar também a necessidade de incentivo ao planejamento dos produtores familiares com relação à sucessão na propriedade, ressaltando a valorização das atividades para as futuras gerações, de modo que possam dar continuidade às práticas da agricultura familiar.

Referências

Altieri, M. A. (2002). Agroecologia: as bases científicas para a agricultura alternativa. Guaíba, RS: Agropecuária.

Aquino, J. R.; Teixeira, O. A. (2011) Agricultura familiar, crédito e mediação institucional: a experiência do PRONAF em São Miguel no Nordeste Brasileiro. Cuadernos de Desarrollo Rural, Bogotá, Colômbia, 2 (54).

Azevedo, A. J. D.; Medeiros, M. da P. M. de. (2012). Satisfação no trabalho: um estudo de caso na Procuradoria-Geral de Justiça do Rio Grande do Norte. Scielo, p. 1- 18.

Brasil. (2006). Senado Federal. Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004- 2006/2006/ lei/l11326.htm>. Acesso em: 3 mar. 2014.

Breitenbach, R.; Guidini, D.; Bundchen, A. (2014). Gestão e diversidade das empresas rurais: pequenas contribuições. In: XII Congresso da Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural. Goiânia, GO, 2014. Anais... Goiânia, GO, 2014.

Brumer, A.; Spanevello, R. M. (2012). O papel dos mediadores no acesso das mulheres ao PRONAF Mulher. Revista Anthropológicas, Recife, PE, 23(1).

Cadamuro, C. A. A. (2013). Satisfação no trabalho: um estudo preliminar. Cesumar, p. 1-4.

Callado, A. A. C.; Callado, A. L. C.  CUSTOS: um desafio para a gestão no agronegócio. Disponível em: <http://biblioteca.sebrae.com.br/bte/bte.nsf/7DC55898743CF 66483256F6B00617007/$File/NT000A2306.pdf>. Acesso em: 23 dez. 2014.

CAIRES, J. C. A gestão de pessoas no agronegócio. Agronline, 2010.

Carrilo-García, C.; Ruíz, M. C. S.; Roche, M. E. M.; Garcia, C. I. G. (2013) Influência do gênero e da idade: satisfação no trabalho de profissionais da saúde. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 21(6), p. 1314-1320.

Carneiro, M. J. (2013). Política pública e agricultura familiar: uma leitura do Pronaf. Estudos Sociedade e Agricultura.

Carvalho, J. L. A. S.; Silva, T. T.; (2013). Trabalhando a reciclagem como instrumento interdisciplinar para o despertar dos jovens e gerar renda na educação de jovens e adultos. Revista Brasileira de Educação e Saúde, 2(1), p. 10-14.

Coutrim, R. M. E.; Cunha, M. A.; Assis, C. F.; Aleixo, V. C.; Paula, B. L. S. (2012).  Entre o passado e o presente: a influência geracional nas perspectivas de futuro profissional dos jovens. Revista Educação e Cultura Contemporânea, 9(18), p. 116-134.

Gonçalves, A. C. S.; R. Júnior, L. C.; Fonseca, M. I. (2014). Assistência técnica e extensão rural: um estudo de caso que demonstra sua importância para a melhoria da produção leiteira. Revista Brasileira de Higiene e Sanidade Animal, 8(3).

Guanziroli, Carlos Enrique; Buainain, Antônio Márcio; Di Sabbato, Alberto (2012). Dez anos de evolução da agricultura familiar no Brasil (1996 e 2006). Revista de Economia e Sociologia Rural, 50 (2), p. 351-370.

FAO – Food and Agriculture Organization (2014). Empowerment is key to eradicating hunger. Disponível em: <http://www.fao.org/zhc/detail-events/en/c/214683/ >. Acesso em: 11 mar. 2014.

Fernandes, D. R. (2004). Uma contribuição sobre a construção de indicadores e sua importância para a gestão empresarial. Revista FAE, Curitiba, 7(1), p. 1-18, jan./jun.

Fernandes, B.; Brasilino, C.; Fávero, J.; Túlio, M. (2011). Influências no processo de orientação profissional. Documento Psicologia, p. 1-8.

Fischer, A.; Marini, D.; Filippim, E. S. (2015). Perspectivas de Agricultores Familiares para a Permanência na Atividade Rural; Revista Espacios, Caracas, Venezuela, 37(7), p. 10.

Figueiredo, N. C.; Freitas, A. M. L. (2015). Agricultura Familiar: Um Estudo sobre a Contribuição do Mercado Municipal de Montes Claros-MG para o Trabalho e Renda de Pequenos Produtores, Revista Espacios, Caracas, Venezuela, 37 (1), p. 14.

Finatto, R. A.; Salamini, G. (2008). Agricultura familiar e agroecologia: perfil da produção de base agroecológica do município de Pelotas/RS. Sociedade & Natureza, Uberlândia, 20(2), p. 199-217.

Marçal, C. Z. et al. (2013). Satisfação no trabalho: um estudo de caso numa empresa terceirizada. Revista Científica Eletrônica UNISEB, Ribeirão Preto, SP.

Marqueze, E. C.; Castro M; C. R. de. (2005). Satisfação no trabalho – uma breve revisão (Título em inglês: Job satisfaction – a short review). Política Editorial, 5409(112), p. 69-79.

Martinez, M. C.; Paraguay, A. I. B. B. (2003). Satisfação e saúde no trabalho: aspectos conceituais e metodológicos. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, 6, p. 59-78.

Melo, M. B. P. E. (2011). Escolhas escolares e opções profissionais – entre a família, a escola e os amigos, que papel desempenham os Media? Sociologia da Educação, 2(4).

Monteiro, M. A.; Basso, C. (2012). ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL-AUXILIANDO O PENSAR. Revista de Ciências Humanas, 6(6), p. p. 215-235.

Murithi, B. W. (2013).Does commercialization of smallholder horticulture reduce rural poverty? Evidence based on household panel data from Kenya.

Nepomuceno, R. F.; Witter, G. P. (2010). Influência da família na decisão profissional: opinião de adolescentes. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, 14(1), p. 15-22.

Possinho, M. D.; Correia, A.; Carvalho, R. G.; Silva, C. (2012). Influência do gênero, da família e dos serviços de psicologia e orientação na tomada de decisão de carreira. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 11(2).

Richardson, R. J. (1999). Pesquisa social: métodos e técnicas. 3. ed. São Paulo: Atlas. 200 p.

Rosa, S. L. C. (1999). Agricultura familiar e desenvolvimento local sustentável. In: XXXVII Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural, Foz do Iguaçu, PR, Anais... Foz do Iguaçu, PR.

Santos, L. M. M. dos. (2005). O papel da família e dos pares na escolha profissional. Psicologia em Estudo, 10(1).

Savoldi, A.; Cunha, L. A. (2010). Uma abordagem sobre a agricultura familiar, PRONAF e a modernização da agricultura no sudoeste do Paraná na década de 1970. Revista Geografar, Curitiba, 5(1), p. 25-45, jan./jun.

Sassi, C. R.; Brandalise, L. A. (2008). Proposta de política de assistência técnica agrícola: um desafio a técnicos e agricultores, Escola de Governo.

Soares, D. H. P. (2002). A escolha profissional: dos jovens aos adultos. São Paulo: Summus.

Toniasso, H. R.; Souza, C. C. de; Brum, E.; Figueiredo, R. S. de. (2007) Agricultura familiar e associativismo rural – o caso da Associação Harmonia de agricultura familiar de Mato Grosso do Sul e a sua sustentabilidade. Informe Gepec – 12(2), jul./dez.

Zhou, S.; Minde, I. J.; Mtigwe, B. (2013). Smallholder agricultural commercialization for income growth and poverty alleviation in southern Africa: a review. African Journal of Agricultural Research, 8(22), p. 2599-2608.

Wanderley, M. de N. B. (2013). Agricultura familiar e campesinato: rupturas e continuidade. Estudos Sociedade e Agricultura, 1.


1. Mestre em Agronegócios pela Universidade Federal da Grande Dourados, Dourados, MS. E-mail: jaque24nascimento@hotmail.com

2. Doutoranda em Desenvolvimento Regional e Agronegócios pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Toledo, PR. E-mail: lucianamario@yahoo.com.br

3. Doutoranda em Agronegócios pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS. E-mail: gjardibezerra@gmail.com

4. Professora Titular da Faculdade de Administração, Ciência Contábeis e Economia da Universidade Federal da Grande Dourados, Dourados, MS. E-mail: erlainebinotto@ufgd.edu.br


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 38 (Nº 09) Año 2017

[Índice]

[En caso de encontrar algún error en este website favor enviar email a webmaster]

revistaespacios.com