ISSN 0798 1015

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Vol. 38 (Nº 11) Año 2017. Pág. 19

Operação de «Carro Pipa» para convivência com a seca e o desperdício de água potável no Semiárido Paraibano

"Water Trucks" operation for association with drought and drinking water wastage in Semiarid Paraiba zone

Joaci dos Santos CERQUEIRA 1; Helder Neves de ALBUQUERQUE 2; Francisco de Assis Salviano de SOUSA 3

Recibido:02/09/16 • Aprobado: 29/09/2016


Conteúdo

1. Introdução

2. Material e Métodos

3. Resultados e discussão

4. Conclusões

Referências


RESUMO:

Objetivou quantificar o desperdício de água decorrente do processo de abastecimento da operação “carros-pipa” realizada pelo Exército Brasileiro, na unidade CAGEPA/Gravatá, no município de Queimadas-PB, avaliando também, o valor social da perda, através da determinação do número de pessoas que poderiam ser beneficiadas com água desperdiçada. Tratou-se de um trabalho de campo, descritivo de caráter exploratório, com abordagem quali-quantitativa, desenvolvido no período de abril/2014 a janeiro/2016. A água desperdiçada durante os abastecimentos seria suficiente para abastecer toda a população do município de Barra de São Miguel-PB, por 18 dias ininterruptos, evidenciando o desperdício e a falta de gestão.
Palavras-Chave: Água, Desperdício, Indústria da Seca e Problema social.

ABSTRACT:

Aimed to quantify water waste resulting from the operation supply process "water trucks" conducted by the Brazilian Army in CAGEPA/Gravatá unit in the town of Queimadas-PB, assessing also the social value of the loss by determining the number of people who could benefit from waste water. This was a field work, descriptive exploratory, with qualitative and quantitative approach, developed from April/2014 to January/2016. The wasted water during the supply would be enough to supply the entire population of the municipality of Barra de São Miguel-PB for 18 uninterrupted days, highlighting the waste and lack of management.
Keywords: Water, Wastage, Industry Drought and social problem.

1. Introdução

A problemática das secas no Nordeste brasileiro não é apenas uma questão de falta de água, mas sim, um fenômeno físico-social amplamente complexa. Nesta região, o desequilíbrio de poder entre os setores sociais, deixa milhões de famílias de sertanejos vulneráveis as secas e fome subsequente. A seca é a resultante vetorial de variáveis cósmicas, geográficas, humanas e culturais como pluviosidade, geomorfologia do terreno, edafismo local, densidade demográfica e grau de adaptação dos humanos ao meio social. Os efeitos de uma grande seca dependem da capacidade política, do potencial econômico, do valor moral e até de um fervor religioso da comunidade exposta ao flagelo climático (Sobrinho, 1983; Alves, Souza, Nascimento, 2009; Buckley, 2010).

No Brasil, a história das secas no Nordeste, séculos XIX e XX, evidenciou a inclemência do clima e, ainda, revelou o descaso, perante a população, da região nos momentos de enfrentar o flagelo, marcados pelo desespero, incúria governamental, corrupção, luta, mas também pela solidariedade (Villa, 2000; Lima, 2005). Autoridades e governos de todos as esferas, que tinham o dever de amenizar a situação da população que sofre sob os efeitos da seca, parecem mais preocupados em tirar proveito, o que reflete a hipocrisia em face da gravidade do problema por parte de setores importantes da sociedade brasileira.

Nesse contexto, torna-se imprescindível o uso de tecnologias que objetivam facilitar o processo de convivência das populações locais com o semiárido, a exemplo das cisternas, que são utilizadas para armazenar a água captada das chuvas, e também os por carros-pipa, que transportam as águas potáveis destinadas ao consumo humano (Amorim, Porto, 2003; Cirilo, 2008).

O acesso à água na região semiárida para fins produtivos sempre esteve muito vinculado à propriedade da terra e, a população carente, manteve-se, ao longo dos anos, circunscrita ao atendimento de água para consumo humano, quer seja, nos períodos de seca, através de carros pipa e perfuração de poços ou, de forma mais permanente, com a construção de pequenas barragens, adutoras e cisternas (Garjulli, 2003; Luna et al., 2012).

Os Ministérios da Integração Nacional e da Defesa vêm conduzindo o Programa Emergencial de Distribuição de Água Potável para o consumo humano no semiárido nordestino. Em 2008, 116 municípios paraibanos foram declarados em estado de emergência pela seca. O ingresso do município no programa faz-se pela declaração de estado de emergência ou de calamidade pública reconhecida pelo Governo Estadual e pelo Ministério da Integração Nacional (BRASIL, 2008). Tal Operação, distribui água potável por meio de carro-pipa para a população situada nas regiões afetadas pela seca ou estiagem, especialmente no Semiárido nordestino e norte de Minas Gerais. A ação é uma parceria do Ministério da Integração Nacional, por meio da Secretaria Nacional de Defesa Civil, com o Exército Brasileiro.

A execução desse Programa, inclui contratação, seleção, fiscalização e pagamento dos pipeiros, sendo de responsabilidade do Comando de Operações Terrestres do Exército Brasileiro (Coter). A operação pipa é uma ação subsidiária de vulto, com alcance social inquestionável, emprego considerável de recursos financeiros, de pessoal e de material, onde cada pessoa tem direito a 20 litros de água limpa por dia (BRASIL, 2008). Contudo, esta quantidade de água diverge da recomendada pela UNESCO (2009), que propõe que uma pessoa deve ter, no mínimo, 50 litros de água limpa por dia para a sua sobrevivência.

Sendo assim, o estudo objetivou quantificar o desperdício de água decorrente do processo de abastecimento de carros-pipa da operação realizada pelo Exército Brasileiro, exclusivamente na unidade CAGEPA/Gravatá, no município de Queimadas-PB, avaliando também, o valor social da perda, através da determinação do número de pessoas que poderiam ser beneficiadas com água desperdiçada.

2. Material e Métodos

O estudo foi realizado na Estação do Gravatá da Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (CAGEPA), localizada no município de Queimadas-PB. Tratou-se de um trabalho de campo, descritivo de caráter exploratório, com abordagem quali-quantitativa.

A unidade da CAGEPA de Gravatá localiza-se a 10,5 km a oeste da sede do município de Queimadas-PB (Figura 1), na comunidade rural de Caixa D’água, latitude e longitude 7º23’3.72”S e 35º58’31.33”O, respectivamente, cuja altitude média é 460m, ficando as proximidades da PB-148 (Queimadas, 2010; Arcgis, 2014, Google Earth, 2015).

A Estação de Tratamento de Água (ETA) CAGEPA/Gravatá faz parte do sistema de abastecimento do município de Campina Grande-PB, tem a capacidade de tratamento de até 1,5 m³/s e recebe, em média, 1,3 m³/s de água bruta da Estação CAGEPA/Boqueirão-PB. A ETA Gravatá possui onze filtros rápidos, com uma área total de 475 m² e uma taxa de filtração máxima de 300 m³/m²/dia, filtrando em média 142.500 m³/dia. A taxa de filtração hoje em operação é de 176 m³/m²/dia, que corresponde a 83.600 m³/dia (Albuquerque, 2007).

Esta estação é equipada por um posto de abastecimento dos carros pipas, onde se abastece a maioria dos carros pipas destinados ao Cariri paraibano, sejam os da operação pipa conduzida pelo Exército Brasileiro, das prefeituras e também dos particulares. O abastecimento dos carros-pipa é realizado através de duas 2 (duas) torneiras (bicas), cujos diâmetros são de 100 milímetros, instaladas no local. O enchimento dá-se pelo acionamento manual (abertura e fechamento) dos registros e o deslocamento da água através da tubulação, dá-se por ação de gravidade.

A coleta de dados foi realizada no período de novembro de 2015 a janeiro de 2016 e contemplou dados primários, obtidos no momento da visita e, dados secundários, obtidos de fontes diversas, referentes ao período entre abril/2014 e janeiro/2016.

A população foi composta pelos carros-pipa cadastrados no Programa de Abastecimento de Água do Governo Federal (Exército Brasileiro/Operação Pipa) abastecidos pela CAGEPA/Gravatá, os quais são responsáveis pelo abastecimento de alguns municípios paraibanos, como, Santa Cecília, Riacho de Santo Antônio, Gado Bravo, Barra São Miguel, Barra Santana, Alcantil e Boqueirão. A amostra, foi selecionada de forma aleatória pelo método não probabilístico, tendo como critério, a conveniência, foi constituída por 21 (vinte e um) carros-pipa, sendo 13 (treze) abastecidos pela bica nº 1 e os 8 (oito) pela bica nº 2.

Os valores relacionados à variável tempo, foram obtidos pela média de três cronômetros digitais. Foi realizado registro de imagens através da câmara digital FUJIFILM Fine PIX S2800HD. Os dados foram tabulados e analisados ao final do período da coleta com o auxílio dos programas Microsoft Excel 2016 e demonstrados por meio de tabelas.

Para obter dados mais precisos em relação à quantidade, em projetos relacionados aos recursos hídricos, foi imprescindível o cálculo da vazão, em particular, para quantificar os desperdícios de água de um dado sistema. Utilizou-se a Equação 1, para calcular a vazão estimada de cada uma das torneiras, doravante denominadas bicas, destinadas ao enchimento dos carros-pipa.

Para calcular a vazão média estimada, exclusivamente relacionado ao abastecimento dos carros-pipa, utilizou-se a Equação 2.

Cabe ressaltar que o tempo de abastecimento sofreu variações em função da variação da vazão das bicas decorrente da utilização de apenas uma ou das duas bicas simultaneamente e, possivelmente, da diferente disposição da tubulação que condiciona a velocidade do líquido em seu interior. Ambas as bicas são abastecidas a partir de um único reservatório e a água é conduzida pela tubulação por gravidade.

Diante da situação acima exposta, torna-se oportuno frisar que, para minimizar as distorções dos resultados, o valor da vazão média utilizada para cálculo do volume total de água desperdiçada (Vtd) é resultado da média ponderada das vazões de cada uma das bicas, levando-se em conta o número de carros-pipa abastecidos em cada uma delas, conforme Equação 2.

O cálculo da quantidade de água desperdiçada no processo de enchimento dos carros-pipa foi realizado a partir da aplicação da equação 3.

Dessa forma, o volume total de água desperdiçado (Vtd) foi determinado pelo produto entre o volume médio estimado de água desperdiçado por carro-pipa abastecido e o número total de carros-pipa abastecidos no período de estudo, conforme equação 4.

Levando em conta que, além de determinar a quantidade de água desperdiçada no processo de abastecimento dos carros-pipa, vinculados à operação conduzida pelo Exército Brasileiro, foi também objetivo do estudo determinar o número de pessoas que poderiam ser beneficiadas com a água desperdiçada. Com esse objetivo, para efeito de cálculo, utilizou-se o parâmetro de disponibilidade de água limpa determinada pela própria Operação Pipa conduzida pelo Exército Brasileiro, sendo, 20 litros/pessoa/dia, doravante tratado como uma constante identificada pela letra D.

Assim, o número de potenciais beneficiários foi determinado a partir da equação 5.

3. Resultados e discussão

3.1 Capacidade volumétrica dos carros-pipa e tempos de abastecimento e desperdício

Na tabela 1, é possível visualizar, a distribuição das capacidades volumétricas dos carros-pipa, assim como o “lapso” de tempo necessário ao seu abastecimento completo e o respectivo tempo no qual a água é desperdiçada. Para efeito do presente estudo, entende-se por tempo de desperdício o tempo transcorrido entre o enchimento total do carro-pipa e a interrupção completa do fluxo de água pela bica a partir do desligamento manual da torneira de corte que a controla (Figura 2).

De acordo com a Tabela 1, percebe-se que durante o abastecimento, dos 21 carros pipas com capacidade média de 8.071 litros, foi gasto um tempo médio de aproximadamente 514 segundos e o tempo médio de desperdício (período que cada Pipeiro deixa a bica aberta perdendo água) foi de 10 segundos.

3.2 Vazões médias

Para calcular as vazões médias, observou-se os dados constantes da Tabela 1, onde calculou-se as vazões estimadas das bicas 1 e 2, denominadas Q1 e Q2, respectivamente, assim como a vazão média estimada (Qt), conforme a seguir:

i) Vazão estimada na bica 1 (Q1)

ii) Vazão estimada na bica 2 (Q2)

iii) Vazão média estimada (Qt)

O conhecimento do parâmetro Qt, é evidenciado devido à importância que tem em estudos relacionados com os recursos hídricos, particularmente quando se quer calcular o desperdício de água de qualquer sistema. Com esse valor fica demonstrada que no posto de abastecimento da CAGEPA, em média, em cada segundo os carros-pipa são abastecidos com a vazão de 15,72 litros de água por bica.

3.3 Volume médio estimado do desperdício de água por carro-pipa abastecido (Vd)

O volume médio (Vd) encontrado é de 157,2 litros que é a quantidade de água que durante o processo de abastecimento dos carros pipas no posto da CAGEPA cada pipeiro desperdiça. É um volume de água que deixa de ser aproveitado pelas populações dos diferentes municípios que são abrangidos pela Operação Carro Pipa do Exército.

3.4 Volume total estimado de água desperdiçado no período de estudo (Vtd)

Para que seja calculado o volume total estimado de água desperdiçado (Vtd), na forma da equação 4, se faz necessário recorrer aos dados referentes ao número de carradas de água abastecidas. De acordo com a Tabela 2, foram abastecidos 19.226 carros-pipa de abril de 2014 a novembro de 2015.

Na Tabela 3, estão dispostos o número de pessoas que são atendidas pelo programa de distribuição de água, sob responsabilidade do Exército Brasileiro. Destaca-se que, mesmo o Exército Brasileiro, determinando em seu Programa de Distribuição de Água por Carros-pipa, que o limite de acesso a água ser de 20 litros por pessoa, observa-se que na prática não ocorre. Todos os municípios tiveram consumo superior, destaque para Barra de São Miguel-PB, que possui um consumo de (743 litros/dia), muito acima do que anuncia o Programa de Distribuição de Água do Exército Brasileiro e, o município de Alcantil-PB possui o menor índice dentre eles, com (249 litros/dia).

Contudo, ressalta-se que nas áreas urbanas, com acesso à água advinda das instalações hidráulicas em residência, têm um consumo muito superior ao previsto pela Organização Mundial da Saúde ano atendimento de suas necessidades básicas. O consumo médio mundial nas cidades é de 200 l/hab./dia (Villar, Ribeiro, 2012).

Nesse sentido é possível aferir que a distribuição da quantidade de carros pipa por município está diretamente relacionada com o número de habitantes do município. Quanto maior o número de habitantes, maior o número de carros pipa de água. Entretanto, no caso do município de Santa Cecília-PB, tal comportamento não foi observado, uma vez que o município possui 6.480 habitantes, sendo 4.790 a população rural (IBGE, 2010) e somente recebeu 1.938 carradas de água, enquanto que os municípios de Barra de São Miguel e Alcantil com populações menores inclusive, a população rural, receberam 2.812 e 2.530 carradas de água no mesmo período, respectivamente. Tal fato justifica-se, pelo número de cisternas cadastradas nestes dois municípios serem maiores.

A partir da aplicação na equação 4 do Vd calculado acima e das quantidades de carradas abastecidas constantes da Tabela 2, obtive-se o volume total estimado de água desperdiçada no período de estudo (Vtd), que equivale aproximadamente 2.451,8 m3, conforme visualiza-se nas Tabelas 4 e 5.

Percebe-se (Tabela 4) que nos meses de novembro de 2014, setembro e novembro de 2015 houve o maior volume de abastecimento e, consequentemente, de desperdício de água durante o processo de abastecimento, representando cerca de 220, 216 e 234m3 de água desperdiçada, respectivamente. Já os meses de menor desperdício foram abril, junho e setembro de 2014, com um volume desperdiçado de 79, 72 e 98 m3, aproximadamente. Cabe ressaltar que nos meses de julho e outubro de 2014 não foram registrados abastecimentos, dentro do programa conduzido pelo Exército.

Na tabela 5, está ilustrada a quantidade de água recebida por cada município e o correspondente volume desperdiçado, além do volume geral do desperdício durante o abastecimento dos carros pipas no período estudado. Assim, destacam-se os municípios de Barra de Santana e Gado Bravo beneficiados com o maior número de carradas de água (5.365 e 4.823, respectivamente) e Riacho de Santo António e Boqueirão com o menor número de carradas (626 e 1.132, respectivamente).

Ainda analisando a Tabela 5, foi possível aferir a dimensão do desperdício relacionado ao programa emergencial de abastecimento de água através de carros-pipa conduzido pelo Exército Brasileiro que é da ordem de 1,948%, equivalendo a 3.022 m3 de água. É oportuno referir que as perdas decorrentes do transporte não foram aqui analisadas pelo fato de terem sido considerados insignificantes.

A quantidade foi considerada desperdiçada, porque não foi utilizada para abastecimento da população, para uso doméstico e também porque esta água desperdiçada tomou a direção do solo formando um autêntico lamaçal, pela mistura da água ao solo. Isto é sustentado pelo conceito de desperdício hídrico, que segundo Oliveira (2002) é contabilizado quando a água disponível em um sistema hidráulico é perdida antes de ser utilizada para uma atividade fim ou, ainda, quando se utiliza para uma atividade fim de forma excessiva.

Segundo o PROSAB (2009), o termo desperdício relacionado aos sistemas de abastecimento, corresponde estritamente às perdas evitáveis decorrentes de negligência do usuário desprovido de consciência ambiental. No Brasil o índice médio de perdas na distribuição de água é da ordem de 45,1%, enquanto que no Estado da Paraíba, através da CAGEPA, referido índice chega a assustadores 49,7% (SNIS, 2007).

Para Hespanhol (2008), se tratando de gestão de recursos hídricos, especialmente na área urbana, deve-se abandonar princípios ortodoxos ultrapassados. Devendo surgir um novo paradigma, baseado na conservação e reuso de água, para minimizar os custos e os impactos ambientais associados a novos projetos. A conservação deve ser promovida por meio de programas de gestão adequada da demanda e de educação ambiental e, o reuso direcionado à gestão da oferta, buscando fontes alternativas de suprimento, incluindo água recuperada, águas pluviais e água subterrânea, complementada mediante a recarga artificial de aquíferos.

A preocupação com a falta crônica de água, não se restringe apenas ao semiárido nordestino, se estende a muitas das regiões metropolitanas brasileiras. Embora o Brasil disponha de uma significativa porcentagem dos recursos hídricos mundiais, muitas regiões convivem com recursos hídricos da ordem de duzentos metros cúbicos por habitante por ano, gerando condições críticas de abastecimento e conflitos no uso da água (Hespanhol, 2008).

A falta de recursos hídricos e o aumento dos conflitos pelo uso da água geraram a emergência da conservação e do tratamento e reuso, como componentes formais da gestão de recursos hídricos. Os benefícios inerentes à utilização de água recuperada para usos benéficos, ao contrário de disposição ou descarga, incluem preservação de fontes de qualidade elevada, proteção ambiental e benefícios econômicos e sociais (Asano, Burton, Leverenz, Tsuchihashi, & Tchobanoglous, 2007).

3.5 Potenciais beneficiários não atendidos em virtude do desperdício

Não obstante, segundo Marques e Gasparini (2002) todo sistema de produção e distribuição de água pelo simples fato de existir, está sujeito a perdas.

A fim de analisar a quantidade de beneficiários que poderiam ser contemplados com a água desperdiçada, levando em consideração o critério do Programa de Distribuição de Água do Exército Brasileiro, aplicou-se a equação 5, para obter o número total de potenciais beneficiários que poderiam ser atendidos, conforme a seguir:

Em relação aos cálculos da Equação 5, fica evidenciado que durante o período de referência o volume total desperdiçado foi de 3.022.327 litros de água, suficiente para beneficiar cerca 151.116 pessoas por um dia ou 5.037 pessoas por um mês, levando-se em conta o parâmetro de 20 litros/pessoa/dia estabelecido para a operação de abastecimento por carros-pipa conduzidos pelo Exército Brasileiro.

Com o desperdício do recurso natural água potável, as pessoas ficam privadas desse recurso, ainda mais dessa água de fonte confiável. Por conseguinte, faz com que muitas pessoas consumam água de qualidade duvidosa, o que pode trazer problemas de sanitários graves, que incluí a saúde (Giatti, Cutolo, 2012). A água bruta por si só apresenta várias impurezas, entre elas, as substâncias inofensivas e substâncias tóxicas, bactérias e vírus que trazem prejuízos econômicos e para a saúde da população (Figueirêdo, 2004).

De acordo com a legislação pertinente sobre o transporte e comercialização de água potável através de caminhões-pipa, estabelece que toda empresa fornecedora, transportadora e/ou distribuidora de água potável através de caminhões-pipa devem cadastrar-se junto à autoridade sanitária competente e que deverão manter registros à disposição da autoridade sanitária sobre a origem da água comercializada, bem como no seu destino, contendo dados como, volume, data e local de sua captação e identificação do veículo transportador. Ainda, que a água distribuída deverá ser submetida às análises laboratoriais (Tabela 6) que comprovem sua potabilidade (BRASIL, 1999).

De acordo com a Resolução SS- 48, D.O.E (1999) o teor de cloro residual livre é de no mínimo de 0,2 mg/ L, que deverá ser mantido durante todo o período de transporte da água. Cada caminhão-pipa deverá possuir um certificado de vistoria expedido pela autoridade sanitária competente, onde verificará a conformidade dos seguintes itens: tanque construído de material anticorrosivo, não tóxico e que não altere a qualidade da água; os dizeres “AGUA POTÁVEL” e o nome da empresa, endereço e telefone deverão constar no exterior do tanque, em tamanho visível; indicador de nível de água, bocal de alimentação provido de tampa hermeticamente fechada e sistema de drenagem que permita o total escoamento da água contida em seu interior; kit para determinação do pH e dosagem de cloro; e a mangueira utilizada para transferir água do caminhão-pipa para o reservatório do usuário dotada de proteção nas extremidades de contato com a água.

A resolução ainda determina, que os tanques dos caminhões-pipa deverão ser desinfetados sempre que houver mudança na origem da água e, obrigatoriamente, a cada seis meses e, que para a desinfecção dos tanques, as concentrações de cloro e tempo de contato, deve obedecer o prescrito na tabela 7.

Os reservatórios de acumulação mantidos pela empresa ou sua fornecedora deverão estar protegidos contra infiltração e inundação, providos de bocais protegidos por telas resistentes em sua parte superior, de modo a possibilitar a ventilação sem contaminação. Os reservatórios serão obrigatoriamente lavados e desinfetados semestralmente.

O emprego da tecnologia representa um aspecto fundamental a ser levado em consideração quando do uso eficiente da água, o avanço tecnológico tem propiciado a expansão dos recursos disponíveis. Essa variedade de materiais contribui para práticas de preços menores, que por sua vez devem estar atreladas a minimização de custos, que proporciona eficiência no processo produtivo, tornando mais eficiente à utilização dos recursos hídricos (Dantas Neto et al., 2008). Este custo no tratamento de água está diretamente relacionado com a qualidade da água que chega a estação de tratamento (Constantino, Yamamura, 2009).

4. Conclusões

Considerando os dados apresentados mostram-se relevante, pois possibilita revelar valores consideráveis do ponto de vista socioeconômico atrelado ao desperdício da água durante os abastecimentos dos carros-pipas na Estação de Gravatá, município de Queimadas-PB, além de vincular o desconforto aos transeuntes, gerido pela presença de lamaçal e, ainda chamar a atenção de toda a população para a importância de se utilizar a água de forma eficiente, responsável e racional.

Verificou-se que os problemas, que são causados pela distribuição muito irregular das precipitações e da disponibilidade hídrica na região, vêm se somar aos desperdícios, que se continuar pode ter como consequência a falta de água nas casas das populações dos municípios que tem estado continuamente a sofrer com a falta de água;

Em relação ao Programa de abastecimento emergencial de água através de “carros-pipa” conduzido pelo Exército Brasileiro, não está diretamente vinculado com a indisponibilidade hídrica causada pela seca, tendo em vista que foi interrompido em períodos de ausência total de precipitação pluviométrica;

Ademais, a água desperdiçada durante os abastecimentos seria suficiente para abastecer toda a população do município de Barra de São Miguel-PB, por 18 dias ininterruptos, nos parâmetros da operação emergencial conduzida pelo Exército Brasileiro;

Observa-se ainda, que o problema de água na região é muito mais de gerenciamento, do que uma crise real de escassez, o agravamento e a complexidade da escassez de água decorrem de problemas reais não só de disponibilidade hídrica, mas também de um processo de gestão muito ineficiente com consumo excessivo, com alto grau de desperdício, seja por falhas operacionais dos sistemas de abastecimento, seja pelo uso descontrolado por parte dos usuários. Por estes motivos surgem, a necessidade e a urgência de se tomar corretas decisões na aplicação de medidas preventivas e reparadoras, para que se tenha no mínimo a operação do sistema de abastecimento níveis de perdas menores, visando assim prolongar a oferta do recurso natural água, diminuindo assim os impactos sociais e ambientais;

Desta forma, diante de uma oferta de água praticamente fixa, desigualmente distribuída e muitas vezes mal utilizada, em que a demanda tem vindo a crescer já que as necessidades aumentam e também a população vem crescendo, é urgente à adoção de um sistema de gestão eficiente, usando sistemas automatizados de corte no enchimento dos carros pipas no posto de abastecimento da CAGEPA de forma a diminuir o desperdício. É de referir, que com a real situação que se vive no Estado da Paraíba e, particularmente no tocante à recarga do açude Epitácio Pessoa (Boqueirão), que tende e diminuir a cada ano, o racionamento tende a aumentar, o que irá condicionar a disponibilidade de água a Operação Carro Pipa do Exército, podendo até diminuir a disponibilidade da água para cada cidadão.

Referências

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1. Mestre e Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG). cerq2006@gmail.com

2. Biólogo, Doutor em Ciências da Educação. Professor Dr. Instituto Bioeducação (IBEA). Email: helderbiologo@gmail.com

3. Dr. em Meteorologia. Professor do Programa de Pós-Graduação de Tecnologia e Recursos Naturais da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 38 (Nº 11) Año 2017

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