ISSN 0798 1015

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Vol. 38 (Nº 18) Año 2017. Pág. 24

As mudanças climáticas e a produção agropecuária: percepção dos produtores rurais da região da Zona da Mata Mineira, Brasil

Climate change and agricultural production: farmers’ perception in the region of Zona da Mata Mineira, Brazil

Eliana Boaventura Bernardes Moura ALVES 1; Laércio Antônio Gonçalves JACOVINE 2; Gumercindo Souza LIMA 3; Gínia Cezar BONTEMPO 4; Carlos Moreira Miquelino Eleto TORRES 5

Recibido: 27/10/16 • Aprobado: 25/11/2016


Conteúdo

1. Introdução

2. Material e Métodos

3. Resultados e Discussão

4. Conclusões

Agradecimentos

Referências Bibliográficas


RESUMO:

Objetivou-se avaliar a percepção dos produtores rurais da região da Zona da Mata Mineira, Brasil, acerca das mudanças climáticas, bem como a respeito das causas e consequências dessas alterações relacionadas à sua produção agropecuária. A amostra foi composta por 86 produtores e as informações obtidas por meio de entrevista estruturada. 94% dos entrevistados percebem as mudanças no clima, porém apenas 53% afirmaram que as atividades praticadas têm contribuído para as alterações climáticas. Isso demonstra o desconhecimento dos produtores acerca da contribuição da agropecuária sobre a problemática e indica a necessidade de melhorar a eficiência da extensão rural no país.
Palavras-chave: Atividades rurais, gases de efeito estufa, percepção ambiental

ABSTRACT:

This study aimed to evaluate the farmers’ perception the region of Zona da Mata Mineira, Brazil, about climate change and also about the causes and consequences of these changes related to their agricultural production. The sample consisted of 86 farmers and information obtained through a structured interview. 94% of the interviewees recognize the changes in climate, but only 53% declared that the activities practiced in their properties have contributed to climate change. This demonstrates the lack of knowledge of the farmers about agriculture's contribution on the issue and indicates the need to improve the efficiency of rural extension in the country.
Keywords: Rural activities, greenhouse gases, environmental perception

1. Introdução

As mudanças climáticas, bem como suas consequências, já são uma realidade que afeta diretamente a vida das pessoas, além de impactar o equilíbrio dos recursos naturais e as atividades econômicas. Considerando que esse é um dos problemas mais relevantes da atualidade, o assunto vem ocupando cada vez mais espaço nas inquietações da sociedade (CGEE, 2010).

A agropecuária está intimamente interligada às mudanças climáticas, seja do ponto de vista das causas, já que esse setor é uma das principais fontes de emissão de Gases de Efeito Estufa (GEE) do Brasil, como também do ponto de vista das consequências, devido às perdas de produtividade causadas pelas alterações no clima. Assim, é de suma importância a contribuição dos produtores rurais, seja em relação a práticas mais efetivas que possam ser implementadas para melhorar o balanço de carbono das atividades rurais, seja também em relação à implementação de alternativas que auxiliem na adaptação desses produtores às mudanças climáticas.

A percepção dos produtores rurais é extremamente sensível às mudanças climáticas e suas propriedades podem fornecer exemplos relevantes de adaptação às alterações do clima, uma vez que os sistemas agrícolas são altamente dependentes das condições climáticas vigentes (Pires et al., 2014). Existe, contudo, dúvida se os produtores rurais conhecem a relação entre as mudanças climáticas e o aumento da emissão de GEE provenientes da produção agropecuária. Além disso, é preciso saber se eles conhecem igualmente as consequências dessas mudanças sobre sua produção.

Verifica-se, assim, a necessidade de analisar a percepção dos produtores rurais acerca das mudanças climáticas, bem como o conhecimento deles sobre as causas e consequências dessas alterações. Para Pires et al. (2014), face à necessidade de mudanças frente às dificuldades locais, a investigação da percepção ambiental dos produtores rurais é crucial e possibilita o desenvolvimento de estratégias de ação.

Os estudos de percepção em relação às mudanças no clima, ainda que envolvam um processo complexo e sujeito à expressão de subjetividade, são importantes porque ajudam a compreender os comportamentos e os graus de precaução nas ações dos indivíduos diante das variações climáticas. Seria difícil, ou pouco consequente, construir programas de desenvolvimento e estratégias de adaptação às mudanças climáticas sem investigar as diferentes percepções dos atores sociais envolvidos. Dessa forma, perceber que alguma coisa está acontecendo é condição necessária para que se adotem medidas preventivas antecipatórias. Portanto, estudos de percepção podem ser ferramentas úteis em programas de desenvolvimento rural que consideram a necessidade de desenhar estratégias de adaptação às mudanças climáticas (Bonatti et al., 2011).

Diante disso, é necessário gerar mais conhecimento acerca da percepção do produtor rural quanto às mudanças climáticas e quanto às causas e consequências dessas alterações relacionadas à sua produção agropecuária. Dessa forma, torna-se possível a geração de entendimento sobre quais alternativas o produtor rural pode desenvolver para diminuir as suas emissões de GEE e se adaptar às mudanças do clima. Assim, objetivou-se avaliar a percepção dos produtores rurais da região da Zona da Mata Mineira, Brasil, acerca das alterações climáticas, bem como a respeito das causas e consequências dessas alterações relacionadas à sua produção agropecuária.

2. Material e Métodos

2.1 Descrição da área de estudo

O estudo foi realizado durante a 84ª Semana do Fazendeiro, entre os dias 14 a 20 de setembro de 2013, no município de Viçosa, em Minas Gerais.

A Semana do Fazendeiro é um evento de extensão que ocorre anualmente desde 1929. A extensão juntamente com o ensino e a pesquisa formam a base indissociável da filosofia de trabalho da Universidade Federal de Viçosa (UFV). Dessa forma, todos os anos, produtores e empresários rurais e seus familiares, de todas as regiões do Brasil, frequentam a Universidade durante o evento (Semana do Fazendeiro, 2016).

2.2 Tipo de pesquisa e levantamento dos dados

O estudo em questão foi conduzido por meio da pesquisa social, que segundo Gil (2008) pode ser descrita como a técnica que possibilita a obtenção de informações inéditas no campo da realidade social, a partir da utilização da metodologia científica.

De acordo com o objetivo da pesquisa, o presente trabalho caracteriza-se como sendo uma pesquisa descritiva. As pesquisas desse tipo visam, principalmente, a descrição das características de determinada população/fenômeno ou a existência de relações entre variáveis. Algumas pesquisas descritivas, além de identificarem a existência de relações entre variáveis, visam determinar a natureza dessa relação (Gil, 2008).

Durante a Semana do Fazendeiro, foi estruturado um estande técnico institucional para o Projeto Carbono Zero. No estande, ocorreu o atendimento a produtores rurais e demais visitantes com interesse em conhecer e trocar informações acerca das mudanças climáticas e demais questionamentos relacionados às questões ambientais. Além disso, os produtores tinham a possibilidade de realizar, por meio de um sistema, o cálculo do balanço de carbono de suas propriedades.

As informações requeridas foram obtidas a partir do levantamento em campo, no qual a busca de informações se dá pelo questionamento direto de pessoas envolvidas com o fenômeno que se deseja estudar (Gil, 2008). Essa interrogação foi feita por meio de entrevista estruturada. Segundo Boni e Quaresma (2005), a entrevista a fim de obter informações sobre um dado tema científico é a técnica mais empregada no processo de trabalho de campo.

A fim de verificar a percepção dos produtores rurais quanto às mudanças climáticas e demais caracterizações pretendidas, foi empregado o uso de um roteiro.

As informações obtidas a partir do roteiro referem-se à percepção do produtor em relação às mudanças climáticas; às evidências observadas sobre como as mudanças climáticas estão afetando as atividades praticadas na propriedade; à verificação sobre o conhecimento de que as atividades desenvolvidas emitem gases que afetam a concentração de GEE na atmosfera; à indicação de quais medidas podem ser adotadas para minimização da emissão desses gases; e à importância das florestas na estocagem de carbono e compensação das emissões.

A amostra constou de todos os 94 produtores que realizaram o cadastro no estande do Projeto Carbono Zero durante a 84ª Semana do Fazendeiro. No presente estudo, foi adotada a amostragem por acessibilidade. Segundo Gil (2008), esse tipo de amostragem é empregada em estudos exploratórios e parte-se do pressuposto que os elementos aos quais se tem acesso podem representar o universo.

As oito primeiras entrevistas foram utilizadas como pré-teste. Realizado no primeiro dia do evento, esse pré-teste tem o intuito de corrigir falhas e desentendimentos em relação às perguntas do roteiro. Desse modo, esses dados não foram incluídos na análise final e, portanto, o roteiro readequado foi utilizado em 86 produtores rurais, que constituíram a amostra válida.

2.3 Análise e interpretação dos dados

Após a obtenção dos dados necessários, foi realizada a análise qualitativa e quantitativa dos dados, de forma a construir o diagnóstico acerca da percepção dos produtores rurais.

Uma das vantagens provenientes da entrevista estruturada é a possibilidade de se realizar uma análise estatística dos dados, já que as respostas são padronizadas (Gil, 2008). Dessa forma, por meio da estatística descritiva, foi possível descrever e sintetizar as características do estudo em questão.

Os recursos proporcionados pela estatística descritiva permitem que o pesquisador descreva os dados ou, mais precisamente, caracterize isoladamente o comportamento de cada uma das variáveis no conjunto das observações (Gil, 2008). A apresentação dos dados foi feita a partir de métodos gráficos (figura e tabela) e de métodos numéricos (medidas de posição e dispersão).

3. Resultados e Discussão

Com base nas respostas dos 86 produtores rurais, é apresentada a seguir uma descrição do perfil desses participantes, bem como de suas propriedades rurais e, em seguida, uma análise da percepção deles acerca das mudanças climáticas.

3.1 Descrição do perfil dos participantes e das propriedades rurais

A análise constituiu-se de 51% dos entrevistados do gênero masculino. No geral, os entrevistados possuíam idade variando entre 20 e 74 anos e idade média de 47 anos. A faixa etária entre 50 e 64 anos foi a mais representativa, constituindo 42% da totalidade de participantes (Tabela 1).

Tabela 1 – Frequência de produtores entrevistados no estande do Carbono
Zero em 2013 em função da faixa etária em que se enquadram

Faixa etária (anos)

Frequência (%)

20 - 34

23

35 - 49

23

50 - 64

42

65 - 74

9

Não informado

3

Com relação ao grau de escolaridade, grande parte do universo pesquisado (79%) possuía, no mínimo, o Ensino Médio completo, sendo, respectivamente, 40% com Ensino Médio completo, 30% com Ensino Superior completo e 9% com algum tipo de Pós-graduação completa. Além disso, verificou-se que somente 6% dos produtores não concluíram seus estudos, concentrando-se, portanto, na modalidade Ensino Fundamental incompleto (Figura 1).

Figura 1 – Nível de escolaridade dos produtores rurais entrevistados no
estande do Carbono Zero durante a 84ª Semana do Fazendeiro.

No estudo de Pires et al. (2014), também realizado com produtores rurais durante a Semana do Fazendeiro, verificou-se que 41,4% dos entrevistados afirmaram ter Ensino Superior. De acordo com um trabalho publicado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE, 2012), com base no Censo Agropecuário realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os produtores rurais têm escolaridade concentrada em Ensino Fundamental incompleto (81,4%). Dessa forma, percebe-se que a Semana do Fazendeiro, de forma particular o estande do Projeto Carbono Zero, atende um público diferenciado quanto ao nível de escolaridade de seus participantes.

Em relação ao local de moradia, 65% moravam na própria propriedade rural, e 35% eram proprietários rurais, porém moravam na cidade. A área média das propriedades rurais é de 41,5 há e, em 84% dos casos, os produtores afirmaram que havia alguma área florestal em sua propriedade, sendo a área média das florestas de 13,5 ha.

Em 37% das propriedades, a principal atividade praticada estava relacionada aos cultivos agrícolas; em segundo lugar, com 36%, a criação de animais. Em somente 1% das propriedades, a floresta era a principal atividade praticada. Alguns produtores destacaram outras atividades principais praticadas na propriedade: apicultura, lazer, floricultura e piscicultura (Figura 2).

Figura 2 – Principais atividades praticadas nas propriedades rurais cadastradas
no estande do Carbono Zero durante a Semana do Fazendeiro de 2013.

3.2 Percepção dos produtores rurais acerca das mudanças climáticas

Ao considerar que a percepção em relação às alterações climáticas pode abranger diferentes aspectos, buscou-se verificar a visão dos produtores rurais acerca da existência das mudanças climáticas e a percepção a respeito das causas e consequências dessas alterações relacionadas à sua produção agropecuária. Assim, os produtores rurais foram questionados sobre a sua percepção frente às mudanças climáticas. Nesse sentido, 94% dos entrevistados responderam que percebiam a mudança no clima ao longo de suas vidas. Pires et al. (2014) também constataram que a maior parte dos produtores entrevistados (cerca de 90%) têm conhecimento das discussões sobre mudanças no clima, ou seja, já ouviu falar e, ou, discutiu sobre as mudanças climáticas e o seu impacto sobre o agronegócio. Hoffmann (2011), verificando a percepção de atores rurais no Rio Grande do Sul, observou que 76% dos entrevistados verificaram mudanças no clima na região.

Bonatti et al. (2011) conduziram um estudo de caso em Anchieta, Santa Catarina, sobre a percepção das mudanças climáticas de diferentes atores sociais no meio rural. De acordo com os autores da pesquisa, para a maioria dos entrevistados as mudanças climáticas representam um problema ambiental. Pitton (2009) desenvolveu um estudo, na cidade de Rio Claro, São Paulo, em que um dos objetivos foi verificar se, na visão social, estão ocorrendo ou não alterações climáticas e como a população concebe essas alterações. Nesse sentido, a autora do estudo observou que, entre os respondentes que residiam na área rural, apenas 5% acreditavam que as alterações do clima constituíam um processo natural e 65% achavam que as alterações do clima já apresentam perigos à sociedade. No estudo realizado por Andrade e Miccolis (2012), os moradores entrevistados do Núcleo Rural da Microbacia do Córrego do Urubu, Distrito Federal, também se mostraram bastante preocupados com problemas ambientais globais. Esses autores afirmaram que, de fato, a percepção dos riscos de mudança climática está no imaginário da população entrevistada que vivia nas chácaras.

A Figura 3 mostra a percepção dos produtores rurais com relação às perdas, associadas às mudanças do clima, que eles foram capazes de perceber nos cultivos agrícolas e na produção animal. Verificou-se que a diminuição da produção nos cultivos agrícolas é mais perceptível aos produtores rurais do que as perdas advindas da produção animal. Assim, 74% dos entrevistados afirmaram ter sofrido perdas de produção nas culturas agrícolas, enquanto somente 41% relataram ter essa mesma percepção quando indagados sobre a produção animal.

Figura 3 – Percepção dos produtores com relação às perdas de produção nos
cultivos agrícolas e nos animais em razão da mudança do clima.

Pires et al. (2014) observaram que as perdas na lavoura e perdas relacionadas às pastagens foram aquelas mais citadas pelos produtores ao avaliarem os impactos sobre a produção decorrentes de alterações na temperatura e na precipitação nos últimos cinco anos.

Bonatti et al. (2011) afirmaram que a perda de produção agrícola foi apontada como influência negativa das mudanças climáticas no cotidiano da maior parte dos atores sociais do meio rural entrevistados em sua pesquisa. Lima (2012) afirmou que a agricultura é uma atividade extremamente dependente de fatores climáticos (temperatura, pluviosidade, umidade do solo e radiação solar), dessa forma, alterações desses fatores certamente incidiriam na produtividade e manejo das culturas agrícolas.

No presente estudo, diversos produtores explicitaram a opinião deles quanto ao que tenha ocasionado essas perdas de produção nos cultivos agrícolas e que esteja relacionado à mudança no clima, sendo os fatores mais abordados: o aumento das ondas de calor e da quantidade de pragas; a instabilidade dos períodos de seca e chuva; e o maior ressecamento do solo. Os produtores também destacaram alguns indícios que os levaram a ter essa percepção, sendo eles: “desenvolvimento incorreto da espiga de milho”; “abertura dos botões do café precocemente”; “as plantas dão flores, mas não chegam a virar frutos”; “o calor seca as pontas das flores de café”; entre outros.

No que se refere às perdas em relação à produção animal, atribuídas às mudanças climáticas, os fatores abordados pelos produtores entrevistados foram basicamente os mesmos relacionados às perdas em relação aos cultivos agrícolas, como: extremos de temperatura; tempo mais seco; e diminuição da disponibilidade de água. Alguns indícios dessa percepção foram abordados pelos produtores rurais: perda de peso dos animais; diminuição da produção do leite; e aumento da mortalidade de animais. Diversos produtores relacionaram esses fatores e indícios à redução da quantidade e qualidade da pastagem e de outras culturas (como o milho), diminuindo a disponibilidade de alimento aos animais.

Entretanto, 20% dos produtores rurais afirmaram que não observaram perdas nos cultivos agrícolas devido às alterações climáticas, e alguns dos argumentos levantados foram: a irrigação dos plantios; a utilização de técnicas agroecológicas adequadas; o emprego de tecnologias mais avançadas, aumentando a produção; a presença de árvores no meio das culturas, fazendo com que a produtividade se mantivesse; entre outros. Esses argumentos podem ser considerados indícios de medidas de adaptação às mudanças climáticas que os produtores estão adotando.

No que se refere à produção animal, 45% dos produtores rurais afirmaram que não observaram perdas devido às alterações climáticas. Um ponto interessante abordado por Lima (2012) é que, no Brasil, os aumentos percebidos com relação aos produtos animais são, na maior parte dos casos, em razão do aumento do número de animais e não da produtividade em si. A autora salientou que isso ocorre devido à baixa qualidade nutricional da forragem que a maioria dos produtores utiliza na alimentação dos animais.

Nas Figuras 4 e 5, é possível verificar a percepção dos produtores rurais com relação ao tipo de alteração sofrida em diferentes parâmetros, que esteja associada à mudança do clima.

No caso da situação apresentada na Figura 4, predomina a opinião dos produtores de que houve redução na quantidade de chuva (72% dos entrevistados) e do crescimento das plantas (50% dos entrevistados), em razão das mudanças climáticas. No entanto, prevalece a opinião de que houve aumento da temperatura para 84% dos entrevistados, do período de seca para 80% deles e da quantidade de pragas na lavoura para 50% dos produtores amostrados.

Figura 4 – Percepção dos produtores rurais considerando a quantidade de chuva, as alterações
de temperatura, o período de seca, a quantidade de pragas na lavoura e o crescimento das plantas.

Pires et al. (2014) verificaram que a que a percepção é mais elevada quando se trata de alterações nos padrões de precipitação. Segundo os autores, a elevação da temperatura e, principalmente, as alterações na precipitação estão associadas à constatação dos entrevistados de que o clima está sofrendo modificações. Os entrevistados no estudo de Hoffmann (2011) apontaram o aquecimento como a principal consequência da mudança no clima, além da intensificação de eventos extremos como secas, chuvas intensas e geadas.

Com relação à Figura 5, a percepção predominante dos produtores rurais é de que houve atraso na época de realização do preparo do terreno para 49% dos entrevistados, de plantio para 53% e de florescimento para 42%. Somente para o caso da época de colheita que prevalece a percepção de não alteração ao longo do tempo (41% dos produtores), seguida da opinião de que a colheita também atrasou (38% dos produtores).

Figura 5 – Percepção dos produtores rurais considerando as épocas de preparo
do terreno, de plantio, de florescimento e de colheita.

Segundo Magistro et al. (2001), as mudanças climáticas manifestam-se geralmente com alterações de precipitação, temperatura e com a observação das respostas dos cultivos agrícolas nas condições prevalentes. Pires et al. (2014) constataram que alterações nas datas de plantação e colheita, uso de irrigação ou plantação direta na palha são medidas adaptativas já empregadas pelos agricultores frente às mudanças no clima.

No trabalho de Pitton (2009), considerando que os eventos extremos do clima estão veiculados como indicadores de alterações climáticas, os participantes foram indagados se esses eventos têm ocorrido com maior frequência nos últimos anos. Assim, a autora verificou que 95% dos respondentes da área rural acreditavam que os eventos extremos têm sido mais frequentes, e 65% salientaram que as chuvas vêm diminuindo nos últimos anos. Outro ponto percebido por esses entrevistados foi com relação à maior frequência dos períodos de longa estiagem.

Menezes et al. (2011) objetivaram investigar a percepção sobre as mudanças climáticas de uma comunidade rural do município de Ibimirim, no Pernambuco. No trabalho, procurou-se identificar se esses autores tinham algum conhecimento sobre o assunto e a percepção deles no que se refere aos efeitos das mudanças climáticas sobre suas produções. Dos entrevistados, 57,6% acreditavam que os verões estão mais quentes, e 73% responderam que está cada vez chovendo menos nas épocas de chuva. Além disso, 48,5% afirmaram que a colheita não estava em bom momento, principalmente por causa da falta de chuvas, e 82,6% disseram que já houve grande perda da colheita, em razão da longa estiagem.

Na Figura 6 é possível verificar a percepção dos produtores rurais acerca da contribuição das atividades agropecuárias praticadas em suas propriedades com relação às mudanças climáticas.

Figura 6 – Percepção dos produtores sobre a relação entre as atividades desenvolvidas
em suas propriedades e a contribuição para as mudanças climáticas.

Para 52% dos produtores rurais, as atividades praticadas em suas propriedades contribuem para as mudanças climáticas. Entre as diversas justificativas apresentadas, tem-se: a emissão pelo plantio de culturas agrícolas e pelo gado; a degradação do terreno; a ausência de floresta na propriedade; a prática de queimadas; o uso de combustíveis fósseis no maquinário; a utilização de agrotóxicos; e a falta de proteção e manejo do solo.

Grande parcela dos produtores rurais acreditava, entretanto, que as atividades desenvolvidas em suas propriedades não contribuem para as mudanças climáticas. Dos 47% dos produtores, alguns justificaram suas respostas com os seguintes argumentos: promove a prática da reciclagem dos resíduos; utiliza adubos naturais; possui muitas nascentes na propriedade e baixo consumo de água; evita o uso de agrotóxicos; evita a realização de queimadas; preserva a floresta; e contribui com o reflorestamento. Questões como essas demonstram alguns cuidados que os produtores possuem e que, realmente, contribuem para a minimização da problemática. Contudo, não permitem afirmar que suas propriedades rurais não contribuem para a elevação da quantidade de GEE emitida para a atmosfera e, portanto, demonstram que parte desses produtores desconhece que sua produção agropecuária está associada às mudanças climáticas.

No estudo de Pitton (2009), também foi possível verificar a consciência dos respondentes sobre a responsabilidade individual no processo das alterações climáticas. Essa autora observou que, entre os entrevistados da área rural, 60% dos respondentes se sentiam responsáveis, enquanto os demais acreditavam que seus hábitos não comprometiam o clima. Além disso, ao serem questionados sobre a tomada individual de medidas no sentido de diminuir os impactos de sua vida no clima, 55% admitiram que não adotavam hábitos menos impactantes, ou seja, não faziam tentativas de diminuir seus impactos no clima.

Para promover programas e iniciativas de conscientização da população sobre as mudanças do clima, é necessário que exista a percepção das pessoas sobre o tema, de forma a auxiliar nas futuras ações (Menezes, 2011). O fato de o produtor ter visão crítica acerca dessas alterações possibilita que ele programe ações, de forma a diminuir suas emissões de GEE e também de implementar alternativas de adaptação às mudanças do clima.

Em relação à adoção de estratégias adaptativas, Pires et al. (2014) verificaram que apenas 24% dos agricultores têm alterado as suas práticas agrícolas para lidar com os impactos das mudanças climáticas. Os autores atribuíram esse fato ao baixo acesso ao crédito, informações e assistência técnica, entre outras dificuldades, que comprometem a capacidade adaptativa dos agricultores.

Nesse âmbito, além de identificar a percepção atual sobre as mudanças climáticas, a universidade possui papel crucial no sentido de trocar informações com os produtores rurais sobre a relação entre a sua produção agropecuária e as causas e consequências das alterações climáticas e também acerca de medidas alternativas de redução das emissões e de adaptação às mudanças do clima. Andrade e Miccolis (2012) verificaram o grau de confiança do Núcleo Rural entrevistado, em diversas fontes de informações sobre mudanças climáticas, demonstrando a importância das universidades no que se refere à sua interação com a sociedade. Esses autores observaram que os participantes possuíam pouca confiança em informações oriundas de partidos políticos, mas que demonstravam muita confiança em informações que chegam por meio do Ministério do Meio Ambiente, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, da família e de amigos, da igreja e, principalmente, das informações que chegam por meio das universidades. No âmbito do Ministério da Educação, uma forma de realizar esse tipo de ação é por meio do Programa de Extensão Universitária (PROEXT), instituído pelo Decreto nº 6.495, de 30 de junho de 2008, destinado a apoiar instituições públicas de educação superior no desenvolvimento de projetos de extensão universitária, com vistas a ampliar sua interação com a sociedade (Brasil, 2008).

No estudo de Menezes et al. (2011), verificou-se a baixa percepção da comunidade rural no que tange às mudanças climáticas, suas causas e consequências. Nesse trabalho, ficou evidente a necessidade de estímulos a trabalhos extensionistas, no sentido de trocar conhecimentos com os agricultores, colocando-os a par da situação mundial relacionada às mudanças climáticas, além de apresentar a eles alternativas de prevenção, adaptação e tecnologias simplificadas para pequenos agricultores.

Por outro lado, ainda hoje existem críticas associadas ao modelo extensionista muitas vezes adotados no Brasil. Segundo o estudo de Santos et al. (2016), ainda hoje os extensionistas adotam um modelo de comunicação por meio de persuasão, ignorando os conhecimentos dos agricultores, que são tratados como sujeitos passivos, ou seja, somente recebem de forma mecânica os ensinamentos fornecidos. De acordo com os autores, apesar da evolução já ocorrida em direção a práticas mais sustentáveis na agricultura, o ensino de ciências agrárias promove pouca reflexão sobre os problemas atuais e continua apresentando um caráter mais tecnicista.

Além disso, é necessário salientar que a percepção ambiental sobre as mudanças climáticas é, na maior parte das vezes, uma observação local e nem tanto global, ou seja, é altamente correlacionada com a realidade do produtor e da propriedade rural. Nesse sentido, Andrade e Miccolis (2012) afirmaram que as estratégias de adaptação aos efeitos das mudanças climáticas devem ser elaboradas levando em conta a percepção dos moradores às ameaças que afligem a região como um todo. No entanto, é preciso analisar as especificidades de cada sub-região e, em algumas situações, até de cada propriedade. Dessa forma, é possível desenhar estratégias que de fato diminuam a vulnerabilidade do meio ambiente local e dos envolvidos.

4. Conclusões

A maioria dos produtores rurais (94%) percebem a existência da ocorrência das mudanças climáticas ao longo do tempo.

No que se refere às perdas associadas às mudanças do clima, a diminuição da produção nos cultivos agrícolas é mais perceptível aos produtores rurais do que as perdas advindas da produção animal.

Em decorrência das mudanças no clima, os produtores rurais reconhecem a ocorrência de alterações em certos parâmetros, como o aumento da temperatura, do período de secas, da incidência de pragas e, consequentemente, do atraso nas atividades voltadas para a sua produção agrícola. Isso demonstra que a vivência do homem no campo condiz com as pesquisas científicas sobre o tema.

No tocante às relações de causa e efeito entre as mudanças climáticas e as atividades desenvolvidas nas propriedades rurais, ainda há desconhecimento por parte considerável dos produtores acerca da contribuição da produção agropecuária sobre as alterações no clima e indica a necessidade de melhorar a eficiência da extensão rural no país.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo apoio financeiro.

Referências Bibliográficas

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Tito, M.R.; León, M.C. & Porro R. (2009). Guia para Determinação de Carbono em Pequenas Propriedades Rurais. 1a ed. Belém, Centro Mundial Agroflorestal (ICRAF)/Consórcio Iniciativa Amazônica (IA), 81 p.


1. Doutoranda em Ciência Florestal, Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, Minas Gerais, Brasil. E-mail: eliana.moura@ufv.br

2. Professor do Departamento de Engenharia Florestal, Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, Minas Gerais, Brasil. E-mails: jacovine@ufv.br

3. Professor do Departamento de Engenharia Florestal, Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, Minas Gerais, Brasil. E-mails: gslima@ufv.br

4. Professora do Departamento de Biologia Geral, Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, Minas Gerais, Brasil. E-mail: ginia@ufv.br

5. Professor do Departamento de Engenharia Florestal, Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, Minas Gerais, Brasil. E-mails: carlos.eleto@ufv.br


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 38 (Nº 18) Año 2017

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