ISSN 0798 1015

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Vol. 39 (Nº 33) Ano 2018 • Página 5

A instituição regulatória setorial e os arranjos contratuais em alianças para pesquisa clínica de medicamentos experimentais no Brasil

Sectorial regulatory institution and contractual arrangements in alliances for clinical trials of experimental drugs in Brazil

Ji Yoon Lee SANCHES 1; Walter BATAGLIA 2

Recebido: 15/03/2018 • Aprovado: 25/04/2018


Conteúdo

1. Introdução

2. Metodologia

3. Resultados

4. Conclusões

Referências bibliográficas


RESUMO:

Este estudo buscou investigar como funcionam as alianças firmadas entre indústrias farmacêuticas e Clinical Research Organizations para a gestão de pesquisas clínicas (estudos de novos medicamentos conduzidos em humanos) no Brasil, considerando que particularidades da regulação setorial brasileira a definem como um sistema ineficaz e moroso, desencorajando investimentos no setor. Adotou-se metodologia exploratória qualitativa, em estudo de casos múltiplos. Os resultados evidenciaram que a ineficiencia do sistema regulatório requer a adoção de mecanismos complementares de coordenação para garantia das transações.
Palavras-Chiave: Regulação setorial, aliança estratégica, arranjos contratuais, mecanismos de coordenação.

ABSTRACT:

This study aimed to investigate how alliances set between pharmaceutical companies and Clinical Research Organizations to manage clinical trials (study of new drugs conducted in humans) work in Brazil, regarding that particularities of Brazilian sectoral regulation define it as an ineffective and lengthy system, discouraging investments in this industry. Exploratory qualitative methodology was adopted, in multiple case study. The results showed that the inefficiency of the regulatory system requires the adoption of complementary coordination mechanisms to guarantee the transactions.
Keywords: Sectoral regulation, strategic alliances, contractual arrangements, coordination mechanisms.

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1. Introdução

No âmbito da indústria farmacêutica, um dos principais fatores que asseguram a competitividade é o investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D) de novos medicamentos.

Durante o século XX, as empresas farmacêuticas exerciam por si mesmas a atividade de P&D no modelo verticalmente integrado, empregando suas próprias estruturas e competências para realização da pesquisa clínica (Gomes, Pimentel, Landim, & Pieroni, 2012). Pesquisa clínica é a pesquisa conduzida em seres humanos para averiguar e   comprovar a segurança, a eficácia e os possíveis efeitos adversos de novos medicamentos (BRASIL, 2015; Pieroni, Capanema, Souza Neto, Souza & Silva, 2009).

Contudo, tem-se observado, nos últimos anos, como uma alternativa aos altos custos envolvidos para desenvolver e introduzir novas drogas no mercado e diante de exigências técnicas e regulatórias cada vez mais rigorosas, um crescente movimento de offshoring dessa atividade a empresas especializadas chamadas de Contract Research Organizations (CROs), via um modelo organizacional de alianças estratégicas (Gomes et al., 2012).

Acompanha esse movimento a internacionalização, sobretudo em direção aos países emergentes da Ásia, Leste Europeu e América Latina, em razão da necessidade de realização de testes multicêntricos (executados em diversos países) somada às vantagens competitivas decorrentes das facilidades de captação de pacientes e tamanho do mercado interno desses países (Gomes et al., 2012).

Especificamente no Brasil, os trâmites exigidos pela regulação junto às instâncias éticas e reguladoras tornam os procedimentos da pesquisa clínica longos e custosos (Zucchetti & Morrone, 2012). Assim, a despeito de ser um polo atraente para pesquisas clínicas representando um dos cinco maiores mercados farmacêuticos do mundo, o Brasil é considerado um país com qualidade regulatória insatisfatória, lenta e burocrática (Duarte, Resende, Murahovschi & Vasconcelos, 2015). Contudo, a contínua expansão do setor de pesquisa clínica no país (Gomes et al., 2012) induz a que as transações com as CROs para essa atividade devem funcionar de alguma forma, superando as deficiências institucionais. A explicação pode residir nos arranjos contratuais e extracontratuais adotados pelas partes.

Sabe-se que a organização econômica é configurada de acordo com o ambiente institucional, composto por regras jurídicas, políticas e sociais. As instituições formais e informais baseiam os processos econômicos e delimitam as regras de produção, trocas e distribuição (North, 1990). O formato das instituições impacta na incerteza do meio em que os agentes estão inseridos e, no nível das organizações, afeta as formas de governança em razão das variações dos custos de transação na gestão dos riscos (Williamson, 2000).

Nesse contexto, os agentes escolhem estrategicamente os arranjos contratuais mais apropriados levando em consideração instituições, direitos, mecanismos de salvaguardas e formas de solução de disputas eficazes (Williamson, 2000; Zylbersztajn & Sztajn, 2005).

Sendo praticamente ficção um sistema legal que funcione perfeitamente com baixo custo, muito da gestão dos contratos é cuidado diretamente pelas partes, por meio de controle privado (Williamson, 2000). Diante disso, a necessidade de se manter um relacionamento estável e duradouro, mediante medidas adaptativas contínuas entre as partes, passa a ser uma questão relevante, sendo que os arranjos mais apropriados devem considerar a mitigação dos custos da transação afetados pela racionalidade limitada e comportamento oportunista das partes. Esse raciocínio aponta para a relevância dos contratos relacionais, característica das alianças (Ménard, 2006).

A análise de alguns estudos feitos em vários segmentos de atividade empresarial permite identificar a prática de mecanismos além do contrato no sentido de complementar a coordenação das transações, denotando o esforço dos agentes na busca por maior segurança e eficiência contra as deficiências contratuais e institucionais. Todos esses arranjos, quer em forma de cláusulas contratuais, quer em forma de mecanismos complementares aos contratos, foram referidos neste trabalho simplesmente como arranjos contratuais, em expressão a todas as práticas que visam a coordenar a relação.

Quanto às insituições, o presente trabalho faz o recorte na regulação setorial como foco de abordagem do ambiente institucional formal.

Ante tais premissas, o presente estudo teve por objetivo investigar a relação entre o formato do sistema regulatório setorial brasileiro e os tipos de arranjos contratuais praticados nas alianças firmadas entre as indústrias farmacêuticas e as CROs.

Além dessa introdução, o artigo referencia teóricamente sobre as instituições e regulação, arranjos contratuais e aliança estratégica, sob a ótica da Nova Economia Institucional (NEI) e Economia dos Custos de Transação (ECT). Segue-se com breve relato de alguns estudos em outros setores que permitem identificar a adoção de mecanismos complementares de coordenação de transações nas alianças. Após, feito um retrato do segmento de pesquisas clínicas do setor farmacêutico para contextualização, a estrutura segue com a descrição da metodología e discussão dos resultados, encerrando-se com as considerações finais.

1.1. Instituições e regulação

As instituições são abordadas no presente trabalho de acordo com os fundamentos da NEI.

Segundo a NEI, os agentes buscam interesses próprios, comportam-se com astúcia e revelam incompleta ou distorcidamente as informações. Isso acaba gerando custos para que as partes projetem as salvaguardas necessárias contra os riscos do oportunismo, em busca de fontes de informação e de segurança (Williamson, 1975, 1985). North (1990) deixa claro que são essas as premissas que justificariam a existência das instituições sociais, políticas e econômicas, às quais incumbe justamente prover incentivos ou limitações que organizam o ambiente para a realização das transações diminuindo o custo das interações e gerando eficiências econômicas (North, 1991).

Assim, conceitualmente, as instituições compreendem o conjunto de restrições construído para estruturar as interações sociais, políticas e econômicas. A importância de se compreender o ambiente institucional em que os agentes estão inseridos baseia-se no fato de que o ambiente influencia o comportamento dos agentes, limitando as suas possíveis escolhas e ações (North, 1990). Com efeito, o sistema legal é considerado um instrumento para a organização da vida na sociedade, que estabelece regras para reduzir a incerteza sobre as atividades das organizações pela padronização de práticas. Elas representam as codificações das expectativas e preferências da sociedade com relação ao poder e autonomia dos agentes (Holmes, Miller, Hitt & Salmador, 2013). No nível das organizações, a análise do tipo de atividade das organizações de um determinado setor leva à necessidade de averiguar as normas específicas a que se sujeitam, a regulação setorial.

Na definição da OECD (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) a regulação consiste no conjunto de leis, ordens e regras de sujeição emitidas por todos os níveis de governo, regras emitidas por órgãos não governamentais ou auto regulatórias a quem o governo delegou poderes regulatórios (OECD, 1997). Pela regulação o Estado objetiva impedir que certos comportamentos variem além dos limites predefinidos pela sociedade, visando a assegurar o adequado funcionamento do mercado e alcançar a máxima eficiência na busca pelo bem-estar social (Silva, 2006; Placha, 2010).

Interessante observar que, paradoxalmente, a própria atividade regulatória pode vir a se tornar um risco para a inovação, ao investimento e à eficiência econômica, quando está desatualizada ou mal projetada para atingir os objetivos visados (OCDE, 1997).

Segundo o relatório do Worldwide Governance Indicators elaborado pelo Banco Mundial, o Brasil apresenta uma qualidade regulatória insatisfatória. A qualidade regulatória detecta as percepções da habilidade do governo de elaborar e executar políticas e regulações que permitem e promovem o desenvolvimento do setor privado (WORLD BANK GROUP, 2015). Com um índice bastante distante de países como Alemanha, Canadá, EUA, Hong Kong, Reino Unido e Chile, o percentil do Brasil encontra-se muito próximo ao dos países considerados pouco desenvolvidos, como Gana, Jamaica, Namíbia e Ruanda. Diante do que essa dimensão busca medir, extrai-se a figura de um governo deficiente e ineficaz na habilidade de regular os setores da economia para promover o seu desenvolvimento.

É esse o ambiente institucional legal e regulatório que precisa ser considerado para a análise das transações econômicas realizadas no Brasil entre os agentes desse setor. Que tipo de arranjos são contratual e extracontratualmente adotados nas alianças para coordená-las em face das deficiências institucionais da regulação setorial no Brasil?

 

1.2. Economia dos custos de transação e arranjos contratuais

A ECT parte da premissa de que os agentes são racionalmente limitados e não podem prever e formular todas as possíveis respostas contratuais diante das eventualidades imprevisíveis (Barney & Hesterly, 2004). O comportamento oportunista (Williamson, 1985) e a “manipulação estratégica da informação ou falseamento das intenções” (Williamson, 1975, p.26) provocam um custo para a transação decorrente de todo um preparo e cautela pelo agente para se resguardar dos possíveis danos (Barney & Hesterly, 2004).

Logo, pressupõe-se que os agentes escolhem estrategicamente o arranjo contratual em função da eficiência, preferindo-se os arranjos que oferecem incentivos e mecanismos de solução de disputas mais eficientes. O desenho do contrato é feito em função do formato das regras legais, capacidade de coerção das cortes e mecanismos privados de garantia.

Nesse contexto, o custo de transação é afetado por três dimensões: (i) a especificidade dos ativos,  considerada fator crítico que eleva o custo de transação à medida que aumenta os riscos da contratação entre as partes, por favorecer o comportamento oportunista (Williamson, 1985); (ii) a incerteza, inerente à própria e natural incompletude dos contratos em razão da racionalidade limitada (Williamson, 1985) e que eleva os custos de negociação, policiamento e de solução de disputas; e (iii) a frequência com que a transação ocorre, pois transações recorrentes possibilitam a aquisição de conhecimento mútuo entre os agentes, viabilizando o desenvolvimento de uma relação de confiança e formação de reputação recíproca entre as partes (Farina, Azevedo &  Saes, 1997).

Com base na visão precursora de Coase de que firma e mercado são alternativas de governança e a escolha por uma delas é feita principalmente com base no custo de transação, a ECT tem focado basicamente na exploração da disponibilidade das alternativas de governança que reduzam os custos da transação, com foco nos contratos, estimulando investimentos mais eficientes ex ante e execução mais eficiente ex post (Williamson, 2000).

Nesse contexto, entre o mercado e a hierarquia estão justamente as formas híbridas, referentes a transações que lidam com certos investimentos específicos e dependência mútua, mas em nível menor do que a integração vertical. Dentre os diversos modelos híbridos estão as alianças estratégicas (Ménard, 2004; 2006). Ménard (2004) salienta que nesse tipo de governança, na medida em que as partes vão se conhecendo, vão também recorrendo aos mecanismos informais como reputação, confiança, compartilhamento de informações e ajuda mútua para resolver os distúrbios.

Sob tal perspectiva, tem-se que inevitavelmente a escolha da estrutura de governança adequada considera o ambiente institucional formal em que os agentes estão inseridos, pois os de acordo com ele os arranjos contratuais acabam sendo desenhados (Figura 1).

 

Figura 1
Instituições formais e os arranjos contratuais

Fonte: Adaptado de Williamson (2000, p.597)

1.3. Aliança estratégica

Alianças são definidas como relacionamento cooperativo entre dois ou mais parceiros que, sob o compromisso de alcançar um objetivo comum, unem as suas capacidades e recursos e coordenam as suas atividades (Teece, 1992). A cooperação pode envolver ações de troca, compartilhamento ou codesenvolvimento, contribuindo as partes com investimento, tecnologia ou ativos específicos (Gulati & Singh, 1998).  

Helfat, Finkelstein, Mitchell, Peteraf, Singh, Teede & Winter (2007) mencionam que as causas das parcerias entre empresas, como as rápidas mudanças do ambiente associadas às pressões da globalização, alterações na regulação e fatores tecnológicos, estimulam as empresas a buscarem acesso a competências complementares. As alianças também encontram fundamento na percepção de que o desempenho por meio do mútuo auxílio é melhor do que a atuação isolada, sendo mais estratégico às organizações tentar o alcance dos objetivos por meio da cooperação com outras organizações ao invés de competir com elas (Child, Faulkner & Tallman, 2005).

Para a lente da ECT, os arranjos cooperativos são vistos como um método de redução de custos e meio de alcançar maior eficiência, permitindo explorar economias de escala, administrar incertezas, fortalecer ou compor negócios, acessar novos mercados, desenvolver novos produtos ou serviços, acessar mais rapidamente tecnologias alheias, aprendizagem eficiente, e compartilhar riscos (Barney & Hesterly, 2004; Child et al., 2005).

Ménard (2006) destaca a dimensão relacional nas formas híbridas, marcada pelos contratos relacionais, ou seja, contratos incompletos cujas lacunas vão sendo completadas durante a sua execução, baseadas na reciprocidade e mútua dependência entre as partes.

Gulati e Singh (1998), mencionam que os mecanismos de governança minimizam os custos advindos do oportunismo dos parceiros, limitando certos comportamentos ou garantindo compensações em caso de descumprimento do acordo. Helfat et al. (2007) asseveram que uma governança efetiva é em que, além dos contratos formais, há salvaguardas informais na proteção dos interesses contra o oportunismo, tais como confiança e reputação. Logo, uma governança efetiva seria aquela que envolve a escolha mista de salvaguardas formais e informais para governar a relação.

Seguindo esse raciocínio, tem-se que o contrato por si só não é suficiente para resguardar os interesses das partes, necessitando as partes recorrerem a outros mecanismos que complementem a proteção desejada, no sentido de mitigação dos riscos advindos da incerteza comportamental dos agentes e do ambiente institucional.

1.4. Mecanismos complementares de coordenação da transação nas alianças

Embora os contratos desempenhem papel fundamental na coordenação das partes de uma aliança (Ménard, 2002; 2004), eles não configuram instrumentos suficientes para assegurar a transação contra os riscos do oportunismo e das falhas do ambiente institucional. Nesse sentido, Ménard (2002), reconhecendo a inevitável incompletude dos contratos, sugere que mecanismos complementares são necessários para a coordenação das alianças. A análise de alguns estudos em segmentos diversos permite identificar o comportamento das organizações na adoção de mecanismos complementares aos contratos para proteção de interesses e coordenar a transação junto aos seus parceiros comerciais.

No setor agroindustrial, estudo de Almeida e Zylbersztajn (2012) sobre contratos de crédito agrícola, identificam os mecanismos adotados pelos agentes para redução da assimetria informacional e do risco moral. A utilização de filtros de seleção por meio de uma avaliação rigorosa do perfil do tomador, com base em informações públicas e privadas, análise da boa capacidade de pagamento e bons scores de crédito, relação de confiança, reputação no mercado e rede social, são alguns exemplos citados pelos autores.

Mecanismos complementares de coordenação também estão presentes no setor de tecnologia. Em pesquisa sobre o relacionamento entre empresas desenvolvedoras de software e empresas de consultoria de implementação de softwares empresariais, Rocha e Bataglia (2015) abordam um mecanismo privado de resolução de conflitos baseado na escalação hierárquica. Conflitos que surgem vão sendo gradativamente alocados para instâncias hierárquicas superiores, até chegar, por exemplo, à presidência. Se nessa instância também não se atingir um consenso, o assunto é levado para uma escalação ainda maior, envolvendo lideranças globais de ambas as empresas, que são multinacionais. E, à medida que a escalação acontece, formam-se comitês de resolução do conflito com a participação de integrantes de ambas as empresas.

Comitês de natureza similar também podem ser identificados nas alianças do setor farmacêutico. Os chamados comitês diretivos (steering committees) ou comitês de gestão (management committees) são constituídos por integrantes de ambas as partes para exercerem um controle administrativo conjunto nas alianças, como uma interface de coordenação adaptativa para gestão e fiscalização do desenvolvimento de produtos, tomada de decisões estratégicas, resolução de conflitos e impasses que vão surgindo durante o relacionamento entre as partes (Smith, 2005; Reuer & Devarakonda, 2016).

No mercado de distribuição de combustíveis também há evidências de adoção de mecanismos de coordenação que vão além dos contratos, presentes nas estruturas de governança, como ferramentas de redução da incerteza. Sendo uma das maiores preocupações das empresas distribuidoras a adulteração do combustível pelos postos na revenda, Soares e Saes (2015) identificaram as medidas de controle adotadas pelas distribuidoras: realização de visitas frequentes aos postos e monitoramento constante de qualidade, da fidelidade dos postos e do desempenho, tendo a distribuidora acesso aos dados fiscais dos postos com a movimentação de produtos e controle de notas fiscais.

Em sentido similar, práticas de monitoramento com base em parâmetros de desempenho predefinidos, auditorias dos registros do parceiro, bem como procedimentos pré-contratuais para uma seleção criteriosa de parceiros com base em reputação, confiança e códigos de conduta informais também podem ser identificadas nas alianças do setor de Biotecnologia, Tecnologia e Varejo (Anderson, Christ, Dekker & Sedatole, 2014), bem como nas do setor de editoras de livros (Grafton & Mundy, 2017) e também no setor específico de tecnologia de impressões (Faems, Janssens, Madhok & Looy, 2005).

Diante desses exemplos de mecanismos de coordenação da transação, instiga-se um estudo similar para o setor objeto do presente estudo. Como são os arranjos contratuais nas alianças firmadas entre as indústrias farmacêuticas e as CROs para pesquisa clínica? De que forma são afetados pelas características da regulação? Há mecanismos complementares de coordenação para garantia e efetividade da transação?

1.5. O setor farmacêutico e o segmento de pesquisa clínica

O mercado farmacêutico representa um dos setores mais expressivos no mundo. O investimento mundial anual em P&D de novos medicamentos gira em torno de US$ 120 bilhões de dólares (INTERFARMA, 2014). O processo de desenvolvimento de uma única nova droga custa cerca de US$ 2,6 bilhões, contra o custo médio de US$ 1 bilhão na década anterior (PhRMA, 2015), o que demonstra um salto de investimentos feitos nessa atividade.

Conforme já se mencionou, com a tendência de internacionalização os principais destinos das pesquisas clínicas vêm se deslocando para os países emergentes (Hujistee & Schipper, 2011), cujas principais vantagens competitivas relacionam-se à facilidade na captação de pacientes e ao menor custo do teste por paciente. Gomes et al. (2012) atribuem esses fatores sobretudo à fragilidade dos sistemas de saúde desses países, que acaba limitando o acesso da população a tratamentos mais específicos e tornando-os mais interessados em participar de testes de novas drogas.

Somando-se às pressões técnicas para buscar tratamentos de doenças mais complexas e multissintomáticas, as farmacêuticas encontraram no offshoring de P&D uma forma mais prática e menos custosa de competir no mercado de novas drogas (Gomes et al., 2012).

As CROs oferecem desde ensaios pré-clínicos, análises laboratoriais, assessoria regulatória, pesquisas clínicas até serviços pós-comercialização (Gomes et al., 2012). Com a contratação de CROs, é estimada uma economia de 30% do tempo total dos testes e a vantagem de se ter acesso a fontes externas de conhecimento, o que favorece uma boa taxa de êxito e a identificação mais célere de possíveis insucessos (Gomes et al., 2012).

Hujistee e Schipper (2011) sumarizam as vantagens que motivam a terceirização de P&D junto às CROs: melhoria de desempenho dos investimentos em P&D, redução de custo e tempo no lançamento de novos medicamentos, acesso à capacidade suplementar global, acesso ao conhecimento médico e clínico em áreas terapêuticas específicas, habilidade de deslocar altos custos fixos para custos variáveis, globalização de P&D, acesso ao conhecimento de questões regulatórias dos países de interesse, menor custo com pessoal, acesso a tecnologias inovadoras sem a necessidade de altos investimentos. Tais vantagens caracterizam estratégias de extrema importância para as indústrias do setor, cujo padrão concorrencial é acirrado (Portella, Abreu, Tomokane, Rodrigues & Maccari, 2011).

Nesse cenário, o Brasil representa um dos maiores países no mercado farmacêutico mundial. Com um crescimento anual superior a 20%, em cinco anos passou de 10º para o 6º mercado. O país investe cerca de US$ 140 milhões anuais em pesquisas clínicas (INTERFARMA, 2015) e vem recebendo destaque nos últimos anos como o país com a maior quantidade de pesquisas clínicas da América Latina (CLINICALTRIALS, 2015).

Atualmente, a atividade de pesquisa clínica o Brasil está sujeita às normas do Ministério da Saúde (por meio do Conselho Nacional da Saúde - CNS) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). O CNS é responsável por controlar a execução de políticas de saúde no Brasil, regulamentando as questões éticas da pesquisa clínica no país. A ANVISA formula e executa a regulação sanitária para a condução de pesquisas clínicas, implementando e monitorando os testes em conformidade com as Boas Práticas Clínicas e avaliando critérios metodológicos do protocolo de pesquisa (Gomeset al., 2012).

No Brasil as pesquisas clínicas precisam passar pela aprovação de duas instâncias éticas e uma instância sanitária. São elas, respectivamente: CEP – CONEP – ANVISA. A legislação exige que todas as pesquisas envolvendo seres humanos sejam submetidas à apreciação do sistema CEP-CONEP quanto aos seus aspectos éticos (BRASIL, 2012) e, paralelamente à apreciação da CONEP, deve ocorrer a submissão do protocolo junto à ANVISA, instância de regulação sanitária, para avaliação do mérito metodológico (BRASIL, 2015).

A regulação da pesquisas clínicas no Brasil é criticada pela comunidade médico-industrial como um sistema moroso, de “análise ética ineficiente, anacrônico e eivado de graves distorções” (Duarte et al., 2015, p.31). As críticas ao sistema fundam-se no fato de a avaliação dos protocolos ser redundante, tornando-a pouco ágil (Duarte et al., 2015). Aponta-se, também, o quanto isso prejudica os pacientes interessados e acaba desestimulando o fomento a atividade de P&D no país. Considerando que as pesquisas têm natureza competitiva, um cenário regulatório como o brasileiro afeta negativamente a competitividade no setor (Gomes et al., 2012).

É neste ambiente institucional regulatório que, curiosamente, o segmento de pesquisa clínica vem encontrando expansão no país, como partícipe da tendência de internacionalização e de terceirização. É possível que alguma explicação ou relação se constate nos mecanismos contratuais estabelecidos entre as indústrias farmacêuticas patrocinadoras e as CROs no sentido de suprir as deficiências institucionais, garantindo privadamente as transações de acordo com as premissas da ECT.

2. Metodologia

Para o presente estudo adotou-se a pesquisa qualitativa, descritiva e exploratória, pelo estudo de casos múltiplos (Yin, 2006). Utilizou-se a análise de conteúdo a partir de categorias temáticas definidas a priori (Bardin, 2004).

A coleta de informações para o estudo envolveu, inicialmente, uma fase de pesquisa e análise documental sobre a regulação setorial vigente para pesquisas clínicas no Brasil, junto aos registros normativos do CNS e da ANVISA.

Feita a investigação documental, fez-se a coleta de dados junto às organizações por meio da estratégia de entrevistas semiestruturadas.

Foram entrevistadas ao todo 6 organizações representando diferentes grupos de atores do setor de pesquisa clínica, de modo a viabilizar uma compreensão multifacetada do fenômeno investigado (Godoy, 1995): (i) Grupo 1: 2 indústrias farmacêuticas, sendo uma nacional e uma multinacional;  e  2 CROs, sendo uma nacional e outra global; (ii) Grupo 2: 2 entidades associativas que representam as CROs e pesquisadores clínicos. Os nomes dessas organizações foram omitidos para fins de preservação de suas identidades. Em todas elas foram entrevistados profissionais que lidam diretamente com a gerência ou coordenação de pesquisa clínica.

3. Resultados

3.1. Síntese dos resultados

O Quadro 1 sintetiza as características das organizações entrevistadas.

Relativamente às percepções quanto à regulação setorial, as organizações entrevistadas  expressaram que a regulação brasileira deixa a desejar com relação à competitividade internacional, desestimulando investimentos em pesquisa clínica pelo formato disfuncional, burocrático e, por isso, muitas vezes, ineficaz. Há consenso entre as organizações entrevistadas que as normas carecem de clareza e a sua aplicação, de estabilidade, sendo comum a heterogeneidade de avaliações para projetos e/ou documentos similares

 

Quadro 1
Características das organizações entrevistadas

Fonte: elaborado pelos autores

submetidos à apreciação dos órgãos. Todas mencionaram que as regras são dúbias, passíveis de interpretações diversas e que o ambiente normativo é bastante instável, com exigências não padronizadas, o acomete a eficiência dos órgãos na análise dos protocolos.

O trâmite do processo de aprovação de protocolos ainda continua sendo bastante burocrático e moroso, não obstantes diversas melhorias tenham sido feitas nas reformas normativas mais recentes e na forma de gestão interna dos órgãos.

Relativamente aos atributos da transação da aliança: (i) especificidade de ativos: é comum a contratação de ativo específico humano pelas CROs para atender às demandas da aliança, tendo sido essa a única especificidade identificada nas respostas; (ii) incerteza: todas as organizações afirmaram pela incerteza da transação decorrente da instabilidade e ineficácia do ambiente regulatório, gerando insegurança na continuidade do relacionamento entre os parceiros, apontando para a adoção de mecanismos de coordenação no sentido de mitigar tal incerteza; (iii) frequência: a frequência das transações foi identificada entre as empresas em nível moderado, pois constatou-se ser comum que as indústrias possuam um portfólio amplo de relações com CROs diversas, a fim de minimizar riscos de concentrar os projetos numa única CRO. Mas em todas as respostas dadas pelas empresas, foi considerada como importante catalisador de confiança para a relação. Quanto às características dos contratos, a prática comum é o modelo “contrato guarda-chuva”, com cláusulas mais gerais para a transação de aliança que vão sendo adaptadas conforme necessidade entre as partes. Quando se trata de relacionamento global, existe um master agreement global, aditado por pequenos acordos locais, escritos ou verbais.

Todas as empresas afirmaram que a resolução de conflitos é sempre feita amigavelmente, na base da conversa, valendo-se da flexibilidade e relação de parceria existente entre as partes. Nenhuma delas relatou ter presenciado litígios judiciais, apesar de haver previsão contratual nesse sentido. Quando um conflito afeta o relacionamento em nível global, existe um processo de escalonamento hierárquico interno, até que se cheguem aos diretores internacionais responsáveis pelo contrato para um consenso. Quanto aos mecanismos de coordenação, todas as empresas destacaram diversos, contratuais e complementares, para assegurar a qualidade dos serviços prestados pelas CROs (Quadro 2). 

Quadro 2
Mecanismos de coordenação identificados na pesquisa

Mecanismo de Coordenação

Tipo

Entrega de relatórios periódicos

Contratual

Realização de reuniões de oversight periódicas

Contratual

Realização de auditorias

Contrat. / Complem.

Realização de co-monitorias

Contratual

Descrição de requisitos de qualificação de profissionais

Contratual

Exigência da disponibilização de equipe exclusiva

Contratual

Reunião de kick-off

Complementar

Visitas de abertura de centros de pesquisa

Complementar

Treinamento dos profissionais da CRO

Complementar

Prévia avaliação curricular e entrevistas dos profissionais da CRO

Complementar

Seleção criteriosa dos profissionais do parceiro (dados de qualidade, reputação, certificações internacionais, experiência, feedback do mercado)

 

Complementar

Estabelecimento de parâmetros e métricas de qualidade (índice de turnover, tempo de resposta a questionamentos)

Complementar

Monitoramento via feedback de terceiros (centros de pesquisa)

Complementar

Documentação de regras de conduta para reger a relação

Complementar

Escalonamento hierárquico interno para resolução de conflitos

Complementar

Contratação frequente com a mesma CRO

Contratual

Adaptação de contratos guarda-chuva via aditivos ou verbalmente

Contrat. / Complem.

Fonte – Elaborado pelos autores.

Desse modo, os resultados verificados com relação ao construto Aliança permitiram identificar os tipos de arranjos contratuais estabelecidos pelas partes para coordenar as transações.

3.2. Discussão dos resultados

Buscando-se responder à seguinte questão: “Qual é a relação entre a instituição regulatória setorial e os arranjos contratuais em alianças para pesquisa clínica?”, a análise dos resultados evidenciou que (i) a incerteza das transações de aliança é agravada pelo formato da regulação setorial; e (ii) o formato da regulação setorial incentiva a adoção de mecanismos de coordenação pelos agentes nas transações de aliança. 

Todas as organizações entrevistadas afirmaram que o sistema regulatório brasileiro para pesquisas clínicas é moroso e burocrático (no sentido da disfunção), o que acaba resultando em sua ineficácia. Há desestímulo das empresas em realizar investimentos em pesquisa clínica no país em virtude das características da regulação. O ambiente regulatório brasileiro para pesquisas clínicas é instável e suas normas carecem de clareza, gerando muitas dúvidas, diversidade de interpretações, falta de padronização de entendimento. Com efeito, a inadequação das regras formais afeta as estruturas de governança (Williamson, 2000), pois o ambiente institucional influencia o comportamento, escolhas e ações dos agentes (North, 1990). O sistema de normas deveria objetivar a redução da incerteza sobre as atividades das organizações (Holmes et al., 2013). Ainda, considerando que as instituições formais representam estrutura de regras que devem promover a estabilidade por meio de parâmetros, padronização de práticas e conformidades, justamente no sentido de mitigar incertezas para os seus agentes (Holmeset al., 2013, Williamson, 2000), um sistema de normas não claras e instável afeta as transações, visto que dificulta o relacionamento entre os agentes pela imprevisibilidade.Conforme já se mencionou, no setor farmacêutico tempo e celeridade são fatores críticos que motivam as indústrias à adoção de estratégias de offshoring de P&D junto às CROs, justamente em busca de redução de tempo e custo no lançamento de novos medicamentos (GOMES et al., 2012; Reis, Landim & Pieroni, 2011). Um ambiente regulatório com incerteza quanto ao tempo e, consequentemente, quanto aos custos envolvidos no lançamento de novas moléculas, gera maior incerteza para os investimentos em P&D (REIS et al., 2011), revelando-se ineficaz para assegurar ganhos associados ao primeiro a se mover.

No nível dos arranjos contratuais, verificaram-se indícios de que diversos mecanismos de coordenação contratuiais e complementares são adotados entre os parceiros justamente em razão do sistema instável e inseguro de regulação setorial. Todos os gestores das empresas entrevistadas entendem que o contrato é mera formalização dos entendimentos subjacentes ao relacionamento das partes, pautada em relação de confiança e parceria. E, nesse sentido, evidenciaram que diversas ações adaptativas vão sendo tomadas no decorrer do relacionamento sem que haja formalização contratual, com base na flexibilidade existente com os parceiros.

As indústrias farmacêuticas entendem ser necessário efetuar uma coordenação mais atenta dos serviços prestados pelas CROs justamente para otimizar os processos e reduzir ao máximo transtornos no trâmite da aprovação dos projetos.

As evidências mencionadas encontram suporte teórico em Williamson (1985, 1991), segundo quem as estruturas de governança são definidas de acordo com o formato do ambiente institucional em que as organizações estão inseridas. O desenho dos arranjos contratuais é feito de acordo com as regras institucionais formais. Também vão de encontro ao suporte teórico de Ménard (2002), que reconhece a inevitável incompletude dos contratos e propõe a necessidade de mecanismos complementares para a coordenação das alianças. A dimensão relacional é evidente nessas transações, em que um framework baseia a reciprocidade e a confiança entre as partes e as lacunas dos contratos vão sendo completadas durante a sua execução (Ménard, 2006, Williamson, 1991).

Bastante interessante observar a similaridade de boa parte dos mecanismos de coordenação identificados nesse setor com os adotados por outros setores, conforme abordado anteriormente, evidenciando ser uma necessidade identificada por diversos agentes diante da fragilidade do ambiente institucional e incompletude dos contratos.

4. Conclusões

Este trabalhou buscou investigar a relação entre a regulação setorial e os arranjos contratuais nas alianças firmadas entre indústrias farmacêuticas e CROs, focando o modo como essas empresas se comportam contratualmente nas alianças para coordenar a transação. Esse objetivo foi plenamente alcançado.

Com efeito, a análise dos dados evidenciou como o formato da instituição regulatória setorial influi nas transações e no desenho dos arranjos de governança, confirmando as bases teóricas da NEI e ECT. Nesse aspecto, apontou-se que a regulação disfuncional, burocrática, morosa, ineficaz e não clara como a brasileira para o setor de pesquisa clínica, agrava a incerteza das alianças e, como consequência, os agentes se direcionam para a adoção de mecanismos de coordenação contratualmente estipulados ou complementares aos contratos, no sentido de mitigar as incertezas e melhorar as eficiências, lastreados na flexibilidade decorrente da relação de confiança entre as partes.

Compreender o modo como os contratos podem ser arranjados e coordenados seguindo as características do ambiente institucional é importante, porque influi nas diferentes escolhas, ações e resultados para as organizações (Zylbersztajn & Sztajn, 2005), justificando-se daí a importância do assunto para o estudo estratégico.

Assim, este trabalho contribui para a literatura da NEI e da ECT permitindo refletir a respeito da ineficiência das instituições formais no sentido de prover incentivos para a interação dos agentes diminuindo incertezas e propiciando um ambiente capaz de gerar eficiências econômicas, bem como sobre a ineficiência do sistema regulatório que requer mecanismos compensatórios das deficiências institucionais no âmbito da transação entre os agentes. Nesse sentido, uma expansão da teoria se impõe, explorando com maior profundidade as formas efetivas de garantia e coordenação da transação que vão além do contrato, sobretudo considerando-se a dimensão relacional existente nas diversas estruturas de governança.

A utilização dos arranjos contratuais para suprir as deficiências institucionais pode explicar resultados empíricos similares no âmbito da NEI/ECT, permitindo estender a questão para a análise à luz, por exemplo, de distintos regimes jurídicos, tais como o sistema de common law e civil law, ou ambientes com qualidades de regulação diferentes, ou, ainda, com diferentes influências de pensamento político (Estado Social, por exemplo).

Seguindo tal esteira de pensamento, ainda, o presente trabalho viabiliza as seguintes implicações para a prática da gestão: identificar as características do ambiente institucional formal e tomar ações estratégicas que desenvolvam mecanismos alternativos eficientes de coordenação com vistas à maior eficiência das transações. Tais ações poderiam ser tomadas no âmbito contratual e extracontratual, na esfera relacional desenvolvida entre as partes. Num ambiente de competitividade acirrada como o setor farmacêutico, devem-se priorizar mecanismos de coordenação mais eficientes em termos de redução de prazos e maximização de custos, buscando-se a eficiência, sobretudo na qualificação e experiência dos parceiros, bem como na qualidade do relacionamento, mitigando-se ao máximo a potencialidade de falhas intrínsecas à relação em face das inevitáveis incertezas e falhas externas do ambiente institucional.

Do ponto de vista das políticas e gestão pública, este trabalho sugere uma maior interação entre os órgãos reguladores da pesquisa clínica (sistema CEP-CONEP e ANVISA) com os seus regulados, no sentido de rastrear as reais necessidades e insatisfações da comunidade e melhorar as eficiências, tanto das normas quanto sob o prisma da gestão dos processos. Sugere-se o desenvolvimento de mecanismos que visem à maior uniformização e padronização de avaliações, tanto na instância ética, quanto na regulatória, a fim de viabilizar um ambiente institucional mais estável e previsível para as relações entre os agentes.

Importante destacar que, segundo os relatos obtidos, a razão do crescimento de pesquisas clínicas no Brasil a despeito de possuir um ambiente regulatório desfavorável, é atribuída a fatores imanentes às próprias características do país e de mercado que são, por outro lado, bastante favoráveis, tais como a quantidade populacional, acesso deficiente a saúde, o que torna as pesquisas clínicas atrativas para os pacientes, o porte do mercado brasileiro e a alta e reconhecida qualidade dos profissionais de pesquisa clínica. Nesse cenário, portanto, uma melhoria efetiva na qualidade da regulação sanaria o que é apontada como a principal barreira para um maior desenvolvimento do setor.

O presente trabalho encontra limitação na quantidade de organizações estudadas, bem como na diversidade da natureza das organizações (empresas, entidades associativas). Mesmo entre as empresas entrevistadas, há diferenças quanto ao porte, abrangência geográfica e da atuação e tempo de existência, o que pode prejudicar eventuais generalizações.

Abre-se caminho para estudos futuros que visem a operacionalizar as premissas ora propostas, medindo, por exemplo, a incerteza criada pelo ambiente institucional regulatório do setor para as transações, sua influência nas escolhas de governança, adoção e eficácia dos tipos de mecanismos de coordenação. As evidências deste estudo podem, ainda, ser estendidas a pesquisas em outros países, com distintas regulações setoriais e particularidades institucionais, a fim de verificar os diferentes impactos nos custos transacionais e nos arranjos contratuais das alianças.

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1. Mestre em Administração de Empresas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. ji.sanches@hotmail.com

2. Professor do Programa de Doutorado em Administração da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Doutor em Administração pela Universidade de São Paulo. batagliaw@gmail.com


Revista ESPACIOS. ISSN 0798 1015
Vol. 39 (Nº 33) Ano 2018

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