ISSN 0798 1015

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Vol. 39 (Nº 42) Ano 2018 • Página 7

Caracterização da Agricultura Sustentada pela Comunidade (CSA) no Brasil

Characterization of Community-Sustained Agriculture (CSA) in Brazil

Joseane Thereza Bigaran ALIOTTE 1; Dag Mendonça LIMA 2; Andréa Leda Ramos de OLIVEIRA 3

Recebido: 17/04/2018 • Aprovado: 01/06/2018


Conteúdo

1. Introdução

2. Metodologia

3. Resultados

4. Concluções

Referências bibliográficas


RESUMO:

O modelo CSA é uma alternativa para atender uma demanda de parte da população que está cada vez mais preocupada em obter alimentação saudável através da produção de alimentos próximo ao local de consumo. Para a caracterização de comercialização de CSA no Brasil foram aplicados questionários, respondidos por stakeholders dessas unidades. Os resultados permitiram concluir que as CSAs no Brasil apresentam características semelhantes à de outros países, foram identificados pontos positivos como autossustentabilidade na produção e autossuficiência no âmbito comercial.
Palavras-Chiave: agricultura compartilhada, alimentação saudável, segurança alimentar.

ABSTRACT:

The CSA model is an alternative to meet a demand from the population that is increasingly concerned about obtaining healthy food through the production of food near the place of consumption. For the characterization of commercialization of CSA in Brazil, questionnaires were applied, answered by stakeholders of these units. The results allowed to conclude that the CSAs in Brazil present characteristics similar to those of other countries. Positive points were identified as self - sustainability in production and self - sufficiency in the commercial sphere.
Keywords: shared agriculture, healthy food, food security.

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1. Introdução

A Agricultura Sustentada pela Comunidade é um modelo de comercialização agrícola recente no Brasil. São poucos os estudos em nível nacional tratando sobre esse tema, principalmente quanto às relações de comercialização. Por ser uma prática que vem se destacando pela sua autossustentabilidade na produção e na autossuficiência no âmbito comercial, o modelo se mostra capaz de atender a demanda da parte da população que não está somente preocupada com a alimentação saudável, mas também, com a qualidade e a seguridade dos alimentos, além de outros atrativos, como por exemplo, a compra de frutas e hortaliças produzidas próximas ao local de consumo. Nesse sentido, é importante a geração de trabalhos que contribuam para o entendimento do sistema, permitindo posterior apoio às políticas públicas de segurança alimentar e nutricional.

A proporção de brasileiros preocupados em manter um estilo de alimentação mais saudável tem crescido nos últimos anos. Como consequência, há o aumento no consumo de frutas, de legumes e de verduras (FLV) in natura. Ainda assim, o consumo de FLV no Brasil é muito baixo, sendo a média por habitante próxima a 53 kg/ano (Santos e Silva, 2010) enquanto a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) é de 146 kg/ano (OMS, 2015). Assim, modelos que tenham como foco a cadeia produtiva desse segmento têm grande possibilidade de crescimento.

Agregada à alimentação saudável, parcela dessa população também vem se preocupando com a demanda por alimentos produzidos próximos ao local de consumo, que impacta em alimentos mais frescos e de qualidade, além de contribuir com menor perda de produto e a redução da emissão CO2 liberado durante o transporte. Esse modelo de “produção-consumo” tem sido denominado pela comunidade internacional científica como food miles. Food miles, que traduzido para o português significa “milhas de alimentos”, é um termo que tem sido pesquisado continuamente, não só por tratar da produção próxima ao local de consumo, mas também por se preocupar com a qualidade dos alimentos que serão consumidos, além de considerar implicações importantes para a sustentabilidade econômica, ambiental e sociocultural.

Segundo Weber e Matthews (2008), uma importante contribuição para mitigar os impactos ambientais vai em direção ao consumo responsável que se faz pela aquisição de alimentos que estejam associados à sustentabilidade, como por exemplo, os produtos orgânicos e mais contemporaneamente os localmente produzidos. Tais considerações demandam pesquisas por novos modelos de oferta-demanda-comercialização de alimentos, que evoluam junto às expectativas dos consumidores e sejam facilitadores do acesso aos alimentos, e, quem sabe, promotores da segurança alimentar e nutricional.

Nesse sentido, um modelo alternativo de comercialização agrícola de alimentos – e que atende os conceitos do termo food miles, tem se destacado nas últimas décadas e, este modelo alternativo, vem,  ganhando a confiança dos consumidores. Trata-se do conceito da Agricultura Sustentada pela Comunidade (Community Supported Agriculture), denominada CSA. Esse modelo surgiu no Japão em 1965, na época chamada de “teikei”. Na Europa, agricultores adaptaram o conceito durante a década de 1970 (Wilkinson, 2001) e logo o programa espalhou-se para outros países (CSA BRASIL, 2017). Mas, foi em 1984 que Jan Vander Tuin introduziu o conceito de CSA nos EUA (Wilkinson, 2001) e, a partir de então, este tipo de comercialização se popularizou no país, e tem se tornado cada vez mais comum no mundo. Atualmente existem mais de 1.000 programas CSA em operação nos EUA (WILKINSON, 2001).

Para Fieldhouse (1996), o conceito de Agricultura Sustentada pela Comunidade está atrelado a uma agricultura comum e compartilhada, na qual produtores e consumidores de alimentos agregam valores associados à agricultura sustentável, ao desenvolvimento comunitário e à segurança alimentar e nutricional. No Brasil, o conceito surgiu em 2011 com o objetivo de ser um meio de proteção às pequenas estruturas agrícolas aproximando produtores e consumidores por meio da oferta de produtos com maiores atributos de saudabilidade com produção sustentável e socialmente responsável (CSA BRASIL, 2017).

Por ser um sistema ainda pouco difundido no país, a caracterização deste modelo de comercialização pode ser um importante instrumento de transmissão de conhecimento a produtores que queiram implantar o sistema. Assim, o objetivo deste estudo é caracterizar o modelo de comercialização agrícola de CSA no Brasil.

2. Metodologia

Para atender ao objetivo foram utilizados dois procedimentos: a pesquisa documental e a aplicação do questionário.

Para a caracterização do modelo de comercialização agrícola da Agricultura Sustentada pela Comunidade pesquisamos preliminarmente artigos científicos e sites de CSAs para compreender melhor o assunto. Depois, selecionamos os artigos que melhor explicaram o tema e amparados pelos dados obtidos nos sites de algumas das CSAs contextualizamos o cenário. A partir disso, começamos a estruturar o questionário que nos proporcionasse entender as questões de comercialização que não encontramos apresentadas nos textos, como por exemplo, como se dá a relação comercial de oferta e demanda, viabilidade econômica e também sua estrutura organizacional. Nosso interesse foi entender especificidades que nenhuma bibliografia que encontramos descreveu.

Na sequência aplicamos o questionário piloto para conhecer possíveis falhas de redação do inquérito, como por exemplo, complexidade das questões e perguntas desnecessárias. Esse questionário piloto foi conduzido presencialmente ao entrevistado, no caso um produtor responsável por uma CSA de Campinas/SP. Esse primeiro momento foi importante, porque permitiu vivenciar as experiências do produtor. Deste modo, conforme as perguntas foram sendo respondidas, fomos tirando dúvidas e entendendo melhor se a questão estava sendo perguntada de forma correta e o que mais poderia ser agregado ao questionário. Posteriormente o piloto foi ajustado para ser aplicado às demais CSAs.

Para Bogdan e Biklen (1982), a pesquisa qualitativa diz respeito à obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto do pesquisador com a situação estudada, retratando as perspectivas dos participantes. Assim, para a realização deste trabalho optamos por empregar a pesquisa descritiva qualitativa através da aplicação de questionário com perguntas abertas, as quais contribuem para que especificidades que não tenham sido encontradas nas literaturas consultadas não sejam perdidas.

A seleção amostral foi feita com base no site da CSA Brasil, no qual também foram obtidos as informações de contato. Para a obtenção da amostra, foi utilizado o cálculo da amostra para população finita (Corrêa, 1988) chegando ao tamanho final da amostra (n) = 83, sendo a população total de 118 CSAs (90% de nível de significância e 5% de erro amostral).

Os questionários foram enviados por e-mail aos principais stakeholders dessas unidades. No entanto, conforme a disponibilidade, as pessoas também responderam via whatsapp ou mesmo por telefone. O período de pesquisa ocorreu de 01/12/2017 a 31/01/2018.

A caracterização resultante das respostas obtidas por meio dos questionários é descrita e fundamentada através da literatura pesquisada.

3. Resultados

Ao caracterizarmos o modelo de comercialização agrícola de CSA no Brasil junto aos steakholders notamos que o sistema se estabelece como prática viável de comercialização no país devido a sua sustentabilidade e autossuficiência.

Dos 118 questionários aplicados, 83 foram respondidos, correspondendo a 70% da amostra. Além disso, verifica-se que todos os participantes, sem exceção, apresentaram as mesmas respostas para todas as questões, cada um com suas palavras e alguns com um pouco mais de detalhamento. Isso demonstra que nesse primeiro momento o questionário atendeu as expectativas.

Por meio do mapa de distribuição de CSAs existentes no Brasil via site da CSA Brasil, nota-se a existência de unidades em: São Paulo (50), Goiás (26), Paraná (9), Minas Gerais (8), Rio de Janeiro (6), Santa Catarina (6), Pernambuco (5), Rio Grande do Sul (4), Mato Grosso do Sul (3), Manaus (1), Mato Grosso (1), e Bahia (1). Nesse sentido, um primeiro ponto de destaque dos resultados é que 42% das CSAs estão concentradas no estado de São Paulo. Segundo Bigaran e Salgado (2017) pessoas com melhor instrução e maior renda são as que mais estão preocupadas com alimentação saudável. Na mesma direção de pensamento, pesquisa realizada por Derby et al. (2008) indica que nos EUA, país com alto grau de desenvolvimento e de renda, os consumidores preferem alimentos produzidos localmente, pois isso garante o frescor do produto e para isso estão dispostos a pagar quase o dobro de um produto próximo ao local de consumo. Assim, a concentração de CSAs no Estado de São Paulo, que apresenta bons índices socioeconômicos, é coerente com aspectos destacados na literatura.

Nos itens que se seguem abordaremos a caracterização dos pontos que foram foco da pesquisa.

3.1. Implantação do modelo

Na literatura, a CSA é entendida como sendo uma comunidade de indivíduos locais que se comprometem a apoiar uma operação agrícola, compartilhando riscos (colheitas ruins) e benefícios da produção (Adam, 2006), sendo também atrelada a uma distância máxima entre os produtores em torno de 160 km (HARTMAN GROUP, 2008). Considerando as respostas dos entrevistados em relação à implantação deste modelo, verificamos que essa caracterização foi confirmada, já que consideram que para a implantação é suficiente que um grupo de produtores que estejam localizados próximos (mesma cidade ou região) se comprometam a apoiar uma operação agrícola. Os entrevistados também relataram que para a implantação de uma CSA não é necessário abrir CNJP, mas o mesmo se torna importante para sairem da “informalidade” desse modelo de comercialização. Entretanto, no início do processo é comum a elaboração de contratos preliminares informais, que embora sem valor legal oferecem alguma segurança inicial. Portanto, a existência formal de CSA como empresa, dá credibilidade para o sistema e a segurança aos participantes. Além disso, os entrevistados explicaram que podem existir mais de uma CSA na mesma cidade, tudo depende da oferta e da demanda por esse modelo e da capacidade de atendimento por parte dos produtores.

3.2. Dimensionamento do Grupo

Estudo conduzido por Fieldhouse (1996) mostra que o número de coprodutores em uma CSA varia de acordo com o tamanho e a capacidade da fazenda onde os alimentos são produzidos. Em Manitoba, no Canadá, as CSAs menores comportam de 15 a 25 pessoas, enquanto as maiores têm mais de 200 coprodutores. Essa também foi a resposta dos entrevistados, que indicaram que o número mínimo de depende do potencial de produção da fazenda e da viabilidade da entrega. Assim como na literatura, nenhum dos entrevistados soube responder qual a quantidade mínima de clientes para que o modelo seja viável, tanto para produtor quanto para coprodutores, indicando que esse tipo de modelo precisa ser melhor compreendido.

Dentre as respostas houve indicação de que o produtor precisa receber um salário que ofereça a ele e sua família uma vida digna, para que se produza com qualidade e se sinta seguro para conseguir comercializar a sua produção. Em janeiro de 2018 o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) considerou o montante de R$ 3.752,65 como renda mínima para suprir um trabalhador e sua a família com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência. Esse salário, dividido pelo valor médio mensal que os coprodutores pagam pela cesta de alimentos (R$ 180,00), permitiria concluir que o número mínimo de clientes de uma CSA deveria ser 20 pessoas, sem considerar os custos de produção, que extrapolam o foco dessa pesquisa.

3.3. Tipos de Administração 

Segundo Adam (2006), ao longo do tempo, surgiu dois tipos distintos de administração de CSA: (1) o primeiro modelo é o produtor quem organiza a CSA e toma a maioria das decisões de gerenciamento e o trabalho agrícola não é exigido dos coprodutores. Este modelo constitui mais de 75% de todas as CSAs por ele pesquisadas; (2) o segundo modelo é o qual a CSA é conduzida pelos coprodutores. Geralmente, esse tipo de CSA possui um grupo central que organiza a comunidade e contrata o produtor. O grupo central pode ser uma organização sem fins lucrativos e a terra pode ser comprada ou alugada.

Entretanto, Wilkinson (2001) vai mais além e descreve quatro tipos de CSAs:

- Farmer Managed - o produtor faz toda a gestão e a comercialização da produção. É ele quem capta seus coprodutores e que determina quais produtos serão cultivados bem como a frequência das entregas.

- Shareholder/Subscriber - um grupo de vizinhos se organiza e contrata um produtor para cultivar as culturas desejadas. É esse mesmo grupo quem faz a gestão da CSA.

- Farmer Cooperative - um grupo de produtores organiza e comercializa produtos dentro de um programa CSA. Este modelo de arranjo permite que os produtores ofereçam uma maior variedade de produtos.

- Farmer Shareholder Cooperative – coprodutores e produtores que residem próximos possuem os recursos da CSA e gerenciam todos os aspectos do programa.

Assim, como na literatura, os entrevistados explicaram que o grupo se reúne para tomar a decisão de qual o tipo de administração é o mais adequado, pois esta não cabe isoladamente ao produtor ou aos coprodutores, ou seja, todos participam ativamente do planejamento (administrativo, financeiro, produção e logística), obtendo assim pagamentos e recebimentos justos e transparentes.

3.4. Prazo do Contrato, Direitos e Obrigações

O coprodutor se compromete a ficar no grupo por um ano (essa é a vigência tradicional de contrato de uma CSA). Novos integrantes podem se associar à CSA, para tanto é desejável um período de adapatação de três meses com a finalidade da adaptação ao modelo de comercialização. Caso tenha interesse o novo integrante assina o contrato. A CSA Brasil (2017) explica que um grupo fixo de consumidores se compromete por um ano, em geral, a cobrir o orçamento anual da produção agrícola. Desta forma, o produtor sem a pressão do mercado e do preço, pode se dedicar de forma livre à sua produção. Além disso, os consumidores criam confiabilidade no sistema por saberem quem o produz e o local onde são produzidos.

Quando questionados sobre a ocorrência de saída de coprodutores da comunidade ainda em período de contrato, os entrevistados disseram que isso pode acontecer e de fato acontece, mas com pouca frequência, pois quem adere ao modelo são pessoas com um objetivo maior, de desenvolvimento da irmandade.

Quanto aos direitos e obrigações das partes, o produtor se compromete a plantar, colher e entregar os produtos regularmente, conforme a variedade, a qualidade e a periodicidade acordada. Em contrapartida, os coprodutores cobrem os custos antecipados da operação e remuneração dos produtores (ADAM, 2006). Em troca, eles recebem alimentos frescos, de qualidade e com menor preço do que normalmente é praticado em mercados comuns.

Para Lamb (1994), o produtor assume a responsabilidade de fornecer alimentos em quantidade suficiente para atender às necessidades e expectativas dos coprodutores.

3.5. Periodicidade da Entrega

A periodicidade de entrega das cestas é semanal, mas há casos da entrega das cestas mensalmente.

3.6. Tipos de Cestas

As cestas são padronizadas e existem dois tipos diferentes em quantidade de itens, para atender famílias maiores ou menores. As cestas maiores possuem de 10 a 15 itens, enquanto as menores de 5 a 7 itens.

Os produtores são os responsáveis por montar as cestas fazendo a divisão igualitária de frutas e hortaliças, para que todas as cestas contenham os mesmos produtos.

Se, em algum momento, acontecer da produção de determinado alimento não atender a todos (pode acontecer da colheita ser menos rentável), então cabe ao produtor fazer a substituição por outro, mas sempre vai haver um número de itens igual para cada uma das cestas.

O produtor sempre procura produzir o suficiente para atender ao grupo. Contudo, é um desafio dimensionar a produção em função das épocas, pois no verão se consome mais hortifrúti do que no inverno. Para não haver perda é comum o produtor fazer feira para vender o excedente e lucrar um pouco mais.

3.7. Produtos

Os principais alimentos contidos na cesta são legumes e verduras (folhosas, raízes e tubérculos em geral). Há também frutas, mas em menor variedade. Entretanto, a oferta das variedades varia de acordo com as estações do ano e o clima da região onde são produzidos.

Quando a comunidade é implantada, é ela quem determinada inicialmente o que será produzido, mas com o passar do tempo, o produtor e os coprodutores vão melhor se conhecendo e então fica mais fácil definir a variedade dos alimentos.

3.8. Produção Orgânica

Toda CSA produz alimentos orgânicos. Os entrevistados enfatizaram que isso é primordial para todos da comunidade, caso contrário, não faria diferença em adquirir produtos de comércios convencionais.

Também não é necessário possuir a certificação de produtos orgânicos, pois a relação entre o produtor e seus coprodutores é baseada na confiança. Os coprodutores podem visitar a fazenda quando quiserem. Muitas vezes eles participam da plantação e colheita.

Quando há falta de produtos para completar algumas das cestas em número de itens, o produtor pode recorrer à compra, mas é obrigatório que sejam alimentos orgânicos também.

A diferença do modelo CSA para outras formas de agricultura orgânica está ligada a existência da produção e consumo próximos, e também na criação da comunidade em torno da terra, dos alimentos e do bem estar comunitário (SEBASTIAN e REGHIN, 2013).

3.9. Precificação da Cesta

O preço da cesta de alimentos que será cobrado ao coprodutor é precificada através dos custos da produção (custos fixos e variáveis) como mão-de-obra, implementos e insumo.

3.10. Forma de Pagamento

Cada coprodutor é responsável por efetuar o pagamento mensalmente e antecipadamente ao produtor através de transferência bancária ou pessoalmente. O valor da mensalidade costuma ser fixo dentro do período de vigência do contrato. Se por um lado o produtor tem garantida, do outro os coprodutores não ficam vulneráveis as instabilidades de preços do mercado convencional.

Alguns dos entrevistados explicaram que nesse modelo de comercialização, o produtor consegue lucrar até 80% a mais do que se vendesse a um atacadista. Já o coprodutor, economiza quase 20% em relação a uma compra efetuada em mercados convencionais.

O pagamento antecipado dos coprodutores fornece ao produtor capital imediato para a compra de insumos, aliviando assim a necessidade de empréstimos. A comunidade paga o custo real da produção diretamente ao produtor e dessa forma contribuem para apoiar a agricultura local e a mantê-los na terra (FIELDHOUSE, 1996).

3.11. Local de Entrega

Em relação ao local de entrega das cestas, os entrevistados informaram que são determinados pontos de coleta em comum acordo com a comunidade. É de responsabilidade do produtor levar as cestas ao local de entrega que pode ser alguma praça, alguma casa, algum comércio de um coprodutor ou até mesmo um local alugado pela comunidade para isso. Para o produtor não há custos do local.

Sempre há uma pessoa que se candidata a ficar responsável pela entrega das cestas de forma gratuita, entretanto há casos de CSAs em que essa função é remunerada.

Também há casos em que o produtor ao invés de montar cestas, faz a entrega da quantidade geral dos produtos, e então, cabe aos coprodutores dividirem os alimentos entre si. Nesse caso, o processo é baseado na confiança e na auto-organização da comunidade.

Ainda em relação à entrega das cestas, caso aconteça de um coprodutor não retirar a sua, esta será doada a alguma instituição de caridade, e ele perde o direito da cesta daquela semana. Entretanto, caso ele não tenho retirado por um motivo justo e caso aconteça de na semana seguinte houver alguma sobra de cesta (devido outra pessoa não ter retirado) e a comunidade consentir, então, poderá pegar uma a mais uma vez que  deixou de retirar a cesta da  semana anterior.

Em geral, os entrevistados disseram só terem vantagens no modelo de comercialização, e as principais vantagens relatadas são:

- São eliminados os atravessadores. Os produtores recebem uma remuneração segura e digna e os coprodutores recebem produtos de qualidade, da época e por valores acessíveis. Segundo Wilkinson (2001) entre as várias vantagens de fazer parte de uma CSA está no fato de não existir "o intermediário", pois isso aumenta os benefícios para ambas às partes.

- Para Wilkinson (2001), as CSAs ajudam a apoiar e a proteger um abastecimento regional de alimentos, bem como a economia local. Além disso, trazem vários benefícios, como por exemplo, (1) melhoram o acesso dos consumidores aos produtos agrícolas frescos; (2) ao eliminar o intermediário, aumenta os lucros dos agricultores e reduz o custo dos consumidores; (3) contribuem para a biodiversidade ao produzirem grande variedade de culturas.

- A comunidade participa dos riscos e dos benefícios que essa agricultura compartilhada apresenta em conjunto. Os participantes também compartilham o desenvolvimento da irmandade e o conhecimento de que fazem parte de um esforço para "pensar globalmente e agir localmente" onde estão associados ainda a importância para a saúde e o bem-estar a longo prazo dos indivíduos e do ecossistema (FIELDHOUSE, 1996).

O uso irracional dos recursos naturais vem sendo sentido cada vez mais pela população mundial. O uso excessivo de agrotóxicos visando alimentos visualmente mais bonitos, o aumento da produção e melhor rentabilidade, traz consigo problemas “escondidos” de cunho social. É por isso, que é preciso pensar em sistemas agroalimentares que fomentem a produção sustentável de alimentos seguros, saudáveis e acessíveis para todos.

Além disso, se torna uma nova realidade de negócio ao pequeno produtor e a agricultura familiar, proporcionado renda real para produtores e alimentos saudáveis a preços acessíveis para coprodutores.

O modelo de CSA é uma alternativa possível de enquadrar as complexidades das questões de produção-comercialização-consumo de alimentos em um sistema simples, sustentável e promissoramente duradouro.

4. Concluções

Concluímos que ao caracterizarmos o modelo de comercialização agrícola da Agricultura Sustentada pela Comunidade o sistema mostrou-se viável e sustentável em longo prazo, principalmente porque está apoiado em uma relação de confiança entre produtor e coprodutores cujos agentes geram benefícios mútuos em um ciclo que se renova.

Esse novo modelo de comercialização agrícola em que a operação de venda e compra se torna simples, descartando atravessadores, conduz a um preço de negociação mais justo e vantajoso entre as partes.

Considerando a tendência dos consumidores por alimentação saudável, de qualidade e de produção local, o modelo de CSA é uma alternativa com baixo impacto ambiental. Ao produzir alimentos frescos e saudáveis, sem o uso de agrotóxicos, por meio de uma agricultura sustentável é possível observar o respeito para com a natureza, a saúde dos indivíduos, além dos menores níveis de perdas e de desperdício. Ao gerar uma relação próxima entre quem produz e quem consome os produtos, colabora também para o desenvolvimento local da região em que se configura e favorece o produtor a se manter numa economia formal. Além disso, o modelo tem se mostrado capaz de preservar terras agrícolas próximas às grandes cidades.

Nesse sentido, a CSA tem se mostrado bastante eficiente e promissora. É um dos melhores exemplos de sucesso de um modelo alternativo de comercialização agrícola de alimentos.

Vale ressaltar que produtor e coprodutores interessados em fazer parte dessa comunidade tem uma conscientização grande em relação à natureza e ao próximo, ou seja, pensam no bem estar social e no uso consciente dos recursos naturais.

Esperamos que essa pesquisa sirva de apoio às políticas públicas de segurança alimentar e nutricional e a interessados no modelo, contribuindo para a disseminação desta nova forma de comercialização e também para a criação de novas CSAs no Brasil.

Referências bibliográficas

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1. Pesquisadora do Grupo Logicom. Faculdade de Engenharia Agrícola. Universidade Estadual de Campinas. Doutoranda em Engenharia Agrícola (Faculdade de Engenharia Agrícola – FEAGRI/UNICAMP). esalqlogbigaran@gmail.com

2. Pesquisador do NEPA. Faculdade de Engenharia de Alimentos. Universidade Estadual de Campinas. Mestrando em Engenharia Agrícola (Faculdade de Engenharia Agrícola – FEAGRI/UNICAMP). limadm@unicamp.br

3. Professora Doutora da Faculdade de Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Engenharia Agrícola. Universidade Estadual de Campinas. Doutora em Desenvolvimento Econômico (Instituto de Economia – IE/UNICAMP). andrea.oliveira@feagri.unicamp.br


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