Espacios. Espacios. Vol. 30 (3) 2009. Pág. 14

Transferência de Conhecimento em Multinacionais Emergentes: survey com as multinacionais brasileiras

Knowledge Transfer in Emerging Multinational Companies: Survey of Brazilian Multinationals

Transferencia de conocimientos en multinacionales emeregentes: Encuesta de multinacionales brasileñas

Felipe Mendes Borini* y Moacir De Miranda Oliveira Junior**

Recibido: 14-03-2009 - Aprobado: 20-06-2009


3. Pressupostos

A arquitetura de análise parte dos princípios do modelo tradicional apresentado por Szulanski (1999) cuja transferência de conhecimento é dependente da característica do conhecimento, dos emissores e receptores, assim como do contexto em que o conhecimento está inserido.

Conforme os estudos que focam na característica do conhecimento como um dos fatores importantes para sua transferência (Zander; Kogut, 1995; Szulansky, 1996 Simonin, 1999), o aspecto do conhecimento mais discutido é quanto ao conhecimento ser tácito ou explicito (Nonaka; Takeuchi, 1995). Quanto maior o componente tácito do conhecimento mais difícil de ser transferido dado o caráter ambíguo deste conhecimento (Zander; Kogut, 1995).

Uma segunda característica do conhecimento é sua complexidade, que conforme Winter (1987) pode ser medido pelo número de informações necessárias para compor o conhecimento. Por sua vez, a definição de Simonin (1999) é mais plausível para entender o conhecimento como uma capacidade, uma vez que a sua complexidade seria derivada da interdependência de rotinas, recursos, tecnologias e indivíduos que são necessários para a constituição do conhecimento. Quanto maior a complexidade do conhecimento, maior a dificuldade para sua transferência (Simonin, 1999).

A terceira característica do conhecimento seria sua independência, ou seja, o quanto aquele conhecimento é proveniente de determinada tecnologia, equipamento ou habilidade humana, ou num sentido funcional do conhecimento na empresa, o quanto o conhecimento está ou não integrado a sistemas empresariais (Simonin, 1999). Winter (1987) e Zander e Kogut (1995) chamam de conhecimento sistêmico aquele que se apresenta articulado às funções, tecnologias e equipamentos empresariais, assim como faz parte de um processo integrado verticalmente a outras funções organizacionais. Logo, quanto mais independente da cadeia produtiva for o conhecimento menor a possibilidade de ser transferido (Winter, 1987; Zander; Kogut, 1995).

Minbaeva (2007) adiciona mais uma característica do conhecimento, que seria a sua capacidade de ser observado em uso ou não. Pode parecer o mesmo significado de conhecimento tácito e explícito, mas Minbaeva (2007) explica que o conhecimento pode ser explicito e não observado em uso, ou seja, embora existam manuais, regras e normas, o conhecimento é difícil de ser observado por uma pessoa não participante do processo. Por outro lado, um conhecimento pode ser tácito, muito difícil de ser codificado, mas fácil de ser apreendido em uso. Quanto mais difícil de ser observado em uso mais difícil é a transferência do conhecimento (Minbaeva, 2007).

Portanto, em tese um conhecimento com um caráter tácito, complexo, independente e não observado em uso é muito mais difícil de ser transferido entre as unidades organizacionais que um conhecimento codificado, simples, sistêmico e observado em uso. Entretanto, seja o conhecimento mais fácil ou difícil de ser transferido, é necessário que a multinacional crie mecanismos de transferência de conhecimento.

A transferência de conhecimento depende dos princípios, estratégias, políticas, processos e estruturas que visam: estimular as pessoas a criar, buscar, preservar, valorizar e compartilhar novas interpretações (crenças) sobre a realidade em que trabalham (Nonaka, Takeuchi, 1997).

A empresa que deseja que este conhecimento dos indivíduos seja compartilhado necessita construir estruturas e mecanismos que facilitem a interação entre os indivíduos e troca de experiência (Gupta; Govindarajan, 2001). Destaque para os sistemas de informação tecnológico, a comunicação direta e a socialização (Carlie, 2004).

Os sistemas de tecnologia da informação permitem a operacionalização do conhecimento explícito da empresa. É adequado para os casos em que as diferenças e dependências entre os atores são conhecidas (Carlie, 2004). As ferramentas de tecnologia da informação são pouco úteis para a gestão e transferência de conhecimento tácito, assim como também não podem ser aplicadas para o compartilhamento das práticas e habilidades específicas dos empregados da empresa. Por outro lado, dada uma orientação estratégica da empresa para a codificação do conhecimento, os sistemas de tecnologia da informação não somente podem ser úteis para reunir o estoque de conhecimento da empresa, como para facilitar a disseminação eficiente entre os pares da empresa pelo acesso a base de dados (Hansen; et. al., 1999). Portanto é uma ferramenta típica para a gestão e compartilhamento do conhecimento explícito, simples, sistêmico e observável em uso. O conhecimento é codificado através do método pessoa para documento, logo não dependente de quem criou. Para usar o conhecimento basta acessar a base de dados e usar várias vezes, o que proporciona economia de tempo e escala. O foco é no volume de conhecimento, investimento em tecnologia da informação e no incentivo para os empregados usarem e abastecerem regularmente o banco de dados.

Exemplos de empresas multinacionais bem sucedidas e que focalizam nas estratégias de codificação, e por sua vez como ferramenta sistemas de informação tecnológica, pode ser as empresas de consultoria Accenture e Ernest Young (Hansen, et. al., 1999), e a empresa de computadores Dell (Hansen, et. al., 1999; Gupta; Govindarajan, 2001). Elas fazem uso de manuais e de banco de melhores práticas compartilhados por meio de intranet. Portanto, se as multinacionais dependem da transferência do conhecimento da matriz para as subsidiárias e vice e versa espera-se que:

P1a: Os mecanismos de tecnologia da informação (manuais e banco de melhores práticas via intranet) são usados em igual intensidade para a transferência de conhecimento da matriz para as subsidiárias e das subsidiárias para a matriz.

P1b: Quanto mais intenso o uso de mecanismos de tecnologia da informação (manuais e banco de melhores práticas via intranet) maior a transferência de conhecimento da matriz para as subsidiárias. P1c: Quanto mais intenso o uso de mecanismos de tecnologia da informação (manuais e banco de melhores práticas via intranet) maior a transferência de conhecimento das subsidiárias para a matriz.

A comunicação pode ser incrementada através do aumento da capacidade de processar informações por meio do investimento em sistemas de informações verticais ou através de relações laterais. Apesar dos mecanismos serem eficientes para aumentar a capacidade de processar as informações; a comunicação direta entre pessoas é ao mesmo tempo uma das formas mais simples e eficiente de troca de conhecimento (Nohria; Ghoshal, 1997). A comunicação direta é uma ferramenta adequada para quando o conhecimento precisa ser compartilhado com as demais unidades tanto em termos sintáticos, mas também em termos semânticos de significado e interpretação (Carlie, 2004). Quando trata-se de um conhecimento tácito e complexo, apesar de sistêmico e observável em uso, que precisa ser traduzido e adaptado em termos semânticos para a unidade receptora, necessita-se de maior empenho por parte da unidade emissora. Assim, as empresas multinacionais podem usar os seguintes mecanismos de comunicação para a transferência do conhecimento: reuniões internacionais entre as unidades e viagens internacionais, treinamentos internacionais e os projetos de incentivo e recompensa para atividades de benchmarking interno.

Do mesmo modo, se as multinacionais dependem da transferência do conhecimento da matriz para as subsidiárias e vice e versa espera-se que:

P2a: Os mecanismos de comunicação (reuniões internacionais, viagens internacionais, treinamentos internacionais e benchmarking interno) são usados em igual intensidade para a transferência de conhecimento da matriz para as subsidiárias e das subsidiárias para a matriz.

P2b: Quanto mais intenso o uso de mecanismos de comunicação (reuniões internacionais, viagens internacionais, treinamentos internacionais e benchmarking interno) maior a transferência de conhecimento da matriz para as subsidiárias

P2c: Quanto mais intenso o uso de mecanismos de comunicação (reuniões internacionais, viagens internacionais, treinamentos internacionais e benchmarking interno) maior a transferência de conhecimento das subsidiárias para a matriz.

A estrutura de relações informais de comunicação também é essencial para a transferência de conhecimento (Nohria; Ghoshal, 1997). Os mecanismos de trabalho lateral são meios importantes de moldar o fluxo de informação em uma organização multinacional. As atividades realizadas entre as unidades como trabalho conjunto em uma força tarefa e encontros entre membros de diferentes unidades organizacionais contribuem para a construção de relacionamentos interpessoais (Deresky, 1999). Trata-se do fenômeno da socialização nas empresas multinacionais, que reflete a formação de capital social dentro da empresa, ou seja, as formas de controle de integração organizacional por meio das redes de contatos pessoais entre membros da empresa, logo permitindo a transferência do conhecimento tácito (Nonaka; Takeuchi, 1995). Quanto maior o número de contatos da rede de relacionamento na empresa de um indivíduo, e quanto menos redundante estes contatos, maior o capital social (Nohria; Ghoshal, 1997). São especialmente necessários quando o conhecimento é difícil de ser transferido pelo seu caráter tácito, complexo, independente e não observável em uso, requerendo não só a transmissão do código e sua adaptação, mas o compartilhamento de valores e técnicas gerenciais para o seu uso (Carlie, 2004). Exemplo de relacionamentos organizacionais que auxiliam na transferência desse tipo de conhecimento são as equipes multinacionais e multidisciplinares de projetos internacionais, bem como os processos de expatriação, em que o indivíduo tem maior acesso aos valores e crenças da contraparte (Gupta; Govindarajan, 2001). Disso resulta que um maior nível de trabalho em rede entre os gerentes de diversas unidades da organização resultando numa maior abertura para a transferência do conhecimento.

Logo espera-se que:

P3a: Os mecanismos de socialização (expatriação e equipes de projetos globais) são usados em igual intensidade para a transferência de conhecimento da matriz para as subsidiárias e das subsidiárias para a matriz.

P3b: Quanto mais intenso o uso de mecanismos de socialização (expatriação e equipes de projetos globais) maior a transferência de conhecimento da matriz para as subsidiárias

P3c: Quanto mais intenso o uso de mecanismos de socialização (expatriação e equipes de projetos globais) maior a transferência de conhecimento das subsidiárias para a matriz.

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